“Jesus Cristo bebia cerveja” | Afonso Cruz

“Jesus Cristo bebia cerveja” | Afonso Cruz

A revolução começa com o que se bebe

Em 1991, depois de a RTP ter exibido o filme “O Império dos Sentidos”, uma boa fatia do País saía à rua mostrando o rosto da indignação. O Expresso fez uma grande reportagem sobre o assunto e, quanto à igreja, disse de forma indignada pela boca do arcebispo de Braga: “Aprendi mais em 10 minutos que na vida inteira”.

Afonso Cruz, escritor, ilustrador, cineasta e músico, parece ter querido apalpar o pulso às mentalidades lusitanas duas décadas e um ano depois. É que “Jesus Cristo bebia cerveja”, o seu mais recente romance, mostra na capa um Cristo satisfeito de copo de imperial na mão mas, por enquanto, ainda não se ouviu falar em destruição de prateleiras ou queima de exemplares numa qualquer livraria cá do burgo. E ainda bem, pois estamos perante um livro que merece que lhe rezem pelo menos um ou dois rosários.

Com uma prosa diluída numa solução poética, Afonso Cruz tece uma história de contornos trágicos e um olhar cómico, passada no coração de uma pequena aldeia alentejana. Nesse pequeno território há uma inglesa abonada que dorme dentro de uma baleia, um génio das letras incompreendido que pinta muros, um pastor que tem como perfume o aroma do queijo de ovelha ou uma rapariga que lê westerns cor-de-rosa, acredita que a mãe foi trocada pela Virgem Maria e toma conta da avó, cujo maior sonho é visitar a Terra Santa para ficar mais perto de Deus antes da última viagem.

É também um livro que se lê como uma revolução, começando por aquilo que cada um bebe: “O que se bebia no espaço geográfico em que Cristo habitava era cerveja. O vinho era uma bebida de romanos, dos invasores. Cristo não iria beber a bebida dos ricos, dos opressores”. A literatura portuguesa está bem e recomenda-se. De preferência na boa companhia de uma cerveja gelada.

Uma edição Alfaguara



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