John.Fante

“1933 foi um ano mau” de John Fante

O braço de Deus

Neste pequeno (mas grandíssimo) livro acompanhamos as deambulações de Dominic Molise, um adolescente norte-americano de ascendência italiana que tem um sonho: ser jogador de basebol profissional.

No seio de uma família pobre, Dom luta por manter a sanidade mental e a chama da esperança bem acesa quanto ao seu futuro, tarefa hercúlea tendo em conta uma família disfuncional composta por um pai desempregado, viciado em jogos e no limiar da infidelidade; uma mãe beata e sofredora que teima em ver aparições da Virgem Maria nos locais mais (in)suspeitos; uma avó azeda cuja costela italiana não deixa nada por dizer ou fazer; um par de irmãos chatos e ociosos. Para piorar tudo, o nosso herói está apaixonado pela inalcançável irmã do seu melhor amigo, também ele um aspirante a herói num dos desportos de eleição dos norte-americanos.

E o que junta tudo isto? O humor e energia da escrita de John Fante, algo que transforma uma centena de páginas (109, mais precisamente) num exercício assombroso sobre a amizade, o amor, o desespero, o ciúme, a raiva, a fé, a esperança e a mais crua das dores: a realidade.

Fante, melhor que ninguém, sabia, e sempre saberá nas nossas cabeças e corações, catapultar uma narrativa simples, que relata cerca de 24 horas da vida de um pequeno grupo de pessoas, para uma excelência literária apenas alcançada por génios como ele próprio ou J. D. Salinger, sendo que a pertinência da referência ao autor de À Espera no Centeio neste caso se reflete também em alguma similaridade entre os protagonistas, ávidos perseguidores do tão, por vezes cruel, “sonho americano”.

1540-1

Além de fazer o retrato de uma América ainda a lamber as feridas provocadas pela Grande Depressão, 1933 foi um ano mau (Alfaguara, 2017) funciona como uma injeção de adrenalina em forma de livro cujo epicentro é a comunidade ítalo-americana de uma pequena cidade do Colorado, mais propriamente o sonhador Dom que ao ver o sonho cada vez mais inalcançável entra numa desesperada espiral para derrotar uma inevitabilidade (in)conscientemente adiada.

É fácil apaixonar-se pela obra de John Fante e é complicado escolher um título favorito. Estrada Para Los Angeles, por exemplo, uma das grandes pérolas da literatura contemporânea americana, é um livro extraordinário mas este 1933 foi um ano mau não lhe fica nada atrás. E se por acaso passarem por uma livraria e sentirem o seu chamamento não o ignorem sob pena de perderem um dos livros das vossas vidas.



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