Fedra

Os limites da condição humana.

Tu me odiavas mais e eu não menos te amava!

O Teatro Maria Matos, em Lisboa, em co-produção com o Grupo Cassefaz, leva a cena até a 18 de Fevereiro o clássico do séc. XVII “Fedra”, de Jean Racine. Vasco Graça Moura traduziu os versos do cronista da corte do Rei-Sol, Luís XIV de França, e Ana Tamen encena-os pela primeira vez. A actriz Beatriz Batarda, que já havia encarnado o papel de Berenice, volta a transformar-se, violenta e majestosamente, nesta apaixonada personagem de Racine, Fedra.

Fedra, rainha na antiga Grécia, é casada com Teseu, o herói, que entre outras façanhas, venceu o Minotauro. Teseu tem um filho, Hipólito, por quem Fedra está visceralmente apaixonada. Esta tenta combater esse sentimento a todo o custo, chegando a expulsar Hipólito de Atenas. Mas de nada lhe vale… O ódio de Hipólito por Fedra aumenta incessantemente, mas o amor de Fedra por Hipólito não diminui.

Em desespero, e seguindo um imprudente conselho, Fedra revela ao objecto do seu desejo a inconfessável verdade. Maldição das maldições, Hipólito ama Arícia… Que estranho cativo em tão belo tormento! O sentimento é recíproco, mas Arícia não lhe pode corresponder, é uma prisioneira de Teseu, ainda que poupada à morte foi impedida de conceber. No centro de tão infatigável trama encontra-se Teseu… Por quem foi ele traído? A quem vão ser atribuídas as culpas? Quem vai ele castigar? A tragédia é o único final possível!

Os versos de Jean Racine, metricamente complexos, são visualmente perfeitos! Foram escritos por forma a não exigir qualquer apoio cénico, qualquer artificio visual, o que torna ainda mais admirável o cenário e os figurinos criados por Vera Castro. A intensificar a intensidade dos versos traduzidos por Vasco Graça Moura, o enredo cénico conta ainda com um conjunto de precursões tocadas ao vivo. Os movimentos que as personagens desferem entre si, a relação genuína e inata que têm com o palco e o cenário são opções cénica brilhantemente traçadas por Ana Tamen.

Num palco marcado pela palavra desmascara-se a contraditória condição humana que atinge limites tão distantes quanto próximos… O amor e o ódio, a esperança e a derrota, o bem e o mal! Quando Hipólito entra em cena é banhado por uma fria luz que avança da alta parede azul que cobre o lado direito do palco… No lado oposto uma quente luminosidade vermelha há-de ferir os olhos à apaixonada Fedra. Alva e pura, esconde nas suas entranhas uma ardente e fatal paixão!

Aquela que é considerada a mais humana tragédia de Racine, será também uma das mais intensas e avassaladoras. Quando Hipólito toma pela primeira vez o palco já a trama está no seu auge e assim se mantém até ao fim! Não há um momento de serenidade, de ócio ou de tranquilidade. As personagens movimentam-se em permanente tensão porque a tragédia é certa. E quanto mais se tentar fugir dela, mais se agiganta o cruel desfecho face à impotente condição humana!



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