A Farsa da Rua W

A vida tornada farsa.

Um palco, duas paredes, três divisões de um apartamento habitado por uma família; um pai (Dinny/Américo Silva) e os seus dois filhos (Sean/João Meireles e Blake/António Simão).

Nada existe para aquela família para lá da porta que encerra o apartamento e que os separa de um mundo a que não pertencem, a não ser a memória. Ainda assim, a recordação dos últimos momentos passados na Irlanda natal vive também com eles em cada momento de um dia e de uma vida rotineira e organizada. Assiste-se a uma representação feita pelas próprias personagens, Dinny, Sean e Blake, que contam, interpretando pessoas do seu passado, num rodopio de adereços, perucas e bigodes postiços, casacos e caixões, a sua história daquele dia.

Na peça escrita por Enda Walsh e estreada em 2006, Sean revela-se sempre como o único dos irmãos que, apesar de temer a mudança, não deixa de pensar que o mundo para lá do apartamento que habita não é como o pai diz ser, assim como a farsa que representam segundo as indicações de Dinny também não aconteceu da forma como este a descreve.

O sentimento de Sean em relação ao mundo exterior nasce sobretudo pela ligação criada com Hayley (Laurinda Chiungue) que despoleta uma sucessão de acontecimentos inesperados na restrita e controlada vida dos três homens, tornando-se personagem de uma história que não é a dela e da qual não faz parte. Hayley é uma falha no sistema Dinny, um sistema caracterizado pela circularidade da representação diária do momento crucial da história da sua família e que alterou o rumo e a vida de todos.

Um espectáculo dos Artistas Unidos com óptimas interpretações que não surpreende quem já conhece o trabalho dos actores que fazem parte do elenco. Para assistir a partir de 7 de Dezembro no acolhedor espaço do Teatro da Politécnica. E para quem faz contas à vida, mas não quer deixar de ver o espectáculo, aconselhamos o dia do espectador, quarta-feira.

Fotografia de ©Jorge Gonçalves.