Alkantara Festival | Entrevista
Uma verdadeira colmeia das artes performativas em Portugal.
O Alkantara está de volta dia 25 de Maio até 11 de Junho. A festa de lançamento da programação ocorreu no dia 14 de Abril, tendo sido abertas as portas do nº 99 da Calçada Marquês de Abrantes ao público e à comunicação social, de modo a celebrar a 14º edição do Festival Internacional de Artes Performativas.
A RDB teve o prazer de entrevistar o cenógrafo belga, Thomas Walgrave, que ocupa desde 2009 o cargo de Diretor Artístico deste evento:
O Festival Alkantara chegou à cidade de Lisboa para mais uma edição. Que «mundos em palco» a Organização tem este ano para apresentar?
Uma mesa de ping pong em Buenos Aires; uma torre de Babel contemporânea onde um piso é habitado por Vítor Gaspar; um sonho de um Moscovo à sombra de Corcovado; uma viagem turística ao ritmo da história da dança; uma antiga cavalariça em Santos-o-Velho (onde terá sido o último lugar onde D. Sebastião foi visto vivo); a redefinação do CBGB; as margens do Rio Congo em Kisangani; um armazém de figurinos e sonhos em Quioto; uma imensidão rosa de cerejeiras em flor; nos arredores de um bairro russo do século XIX; um pequeno quarto em Hamra, bairro central de Beirute; um clube de boxe na margem sul; a escuridão de uma sala de cinema e a intimidade de um quarto de casal em qualquer cidade do mundo; uma noite de festa e ritual em Marraquexe até à madrugada; uma caverna com toupeiras gigantes; uma Europa à deriva algures entre a Semana Santa de Sevilha, uma dark-room em Berlim e a ArCo em Madrid; uma mesa de um arquiteto na Marraquexe clássica; um campo de badminton num futuro indefinido; um salão de jogos no início da Humanidade; um bar popular noturno algures entre Vigo e Corunha; um palco grandioso de uma sala histórica no centro de Lisboa.
Destacaria algum artista, ou espetáculo, mais relevante e/ou surpreendente?
Las Ideas: Federico León convida o público a volta da sua mesa de trabalho (na realidade, uma mesa de ping pong) para partilhar os processos de criação do próprio espetáculo que está a contemplar. O que deve ser real numa peça, ou melhor, que devemos gerar para que a peça pareça real? Como fabricar um real que tem ar de ser verdade?
En Alerte: Taoufiq Izeddiou parte das suas origens na medina de Marraquexe para desenvolver com dois músicos um concerto espetáculo – entre o transe e a reflexão – à volta de uma questão central: é possível conciliar a dança com a espiritualidade? Essa força extraordinária que permite a alguns aceder a uma sabedoria que atravessa os séculos e a outros mergulhar numa violência cega em nome de um ideal intangível.
La Nuit des Taupes (Welcome to Caveland): um dos encenadores e cenógrafos com mais hype na Europa que vai finalmente conseguir realizar o seu sonho de pôr uma caverna em palco onde a fantasia não se distingue do despertar das consciências e tenta encontrar as raízes profundas de um imaginário poético coletivo, impregnado de mitos filosóficos.
O nosso desporto preferido: Presente: O ator mais imprevisível da cena portuguesa confirma a sua ascensão enquanto autor e encenador com um primeiro episódio numa teatrologia de ficção científica em estreia mundial.
A importância do questionamento e da revisitação do passado, enquanto ponte que conecta a atualidade e o futuro, é um dos pensamentos centrais deste ano. Existe uma ligação entre este tipo de reflexão e o passado de cada artista que irá apresentar o seu trabalho?
O Alkantara Festival convida artistas com uma visão fortemente pessoal e inevitavelmente as imagens e os trajetos (mesmo com horizontes bastante latos) quase sempre parte das experiências individuais de cada um: Com Taoufiq Izeddiou a lembrança (a sua primeira dança, aos 5 anos, que foi também o seu primeiro contacto com a espiritualidade), a voz (que canta, que fala) e a religião (como uma resposta rápida aos nossos medos e em nítida oposição com a espiritualidade, que é uma conquista a longo prazo); A bala de um sniper que penetrou o crânio do irmão mais novo de Rabih Mroué em 1987 em Beirute; A fuga improvável do escritor e preso político Vumi (Antoine Vumilia Muhindo), condenado à morte de uma prisão em Kinshasa.
É possível a tradição e a modernidade coexistirem nas artes performativas? Em que medida?
Cada modernidade está condenada a transformar-se em tradição na História. Cultura e arte em processo dinâmico sujeito a constantes influências e intercâmbios tanto no tempo como no espaço. Uma modernidade sem relação com tradição é algo impossível.
A bienal de artes performativas contemporâneas constitui um momento de debate social e cultural. Que perguntas pretendem fazer chegar até à mente do público?
Será que alguém poderá dizer – Já sei o suficiente do passado posso dedicar-me ao futuro? Com quantos anos aprendeste a disfarçar a tua urgência? Com quantos anos aprendeste a escolher o desejo? Para ti o desejo é um elemento platónico ou uma ferramenta para construir o futuro? Estas são apenas quatro possíveis perguntas e, neste caso, fazem parte de 216 questões lançadas por Cláudia Dias.
Alkantara respira Lisboa. Como é pensado o seu envolvimento com a cidade?
O Alkantara Festival é um bom exemplo de diálogo na cidade, não só com os agentes culturais mais importantes da capital, mas também com o tecido social e cultural a nível local. Defendemos o internacionalismo onde o local ocupa um lugar referência seja na colaboração com a Junta de Freguesia (da Estrela) ou a Escola Secundária António Arroio.
Percebe-se que existe um sério empreendimento em angariar voluntários. Qual é o peso deste grupo de pessoas na estrutura, organização e produção deste evento?
A estrutura do Festival não são voluntários – são profissionais. Contudo, e ao mesmo tempo, já há várias edições anteriores que temos um modelo de inserção de voluntariado, com especial enfoque no acompanhamento dos festivais. Nas duas últimas edições há vários exemplos de voluntários que acabaram por entrar no circuito profissional: promover um blind date com o mundo das artes performativas através de uma plataforma e alguns acabaram por se apaixonar.
Tendo por base a realidade económica de Portugal, o Alkantara Festival tem enfrentado cortes relativamente aos apoios que recebe? Qual é a perspectiva futura?
Cortes? Sim, entre 2010 e agora houve um corte de 70% a nível de financiamento estatal. Porém, o Alkantara Festival não foi a única plataforma a ter esses cortes, mas a cultura no geral. E não foi só a cultura, mas também os outros setores da sociedade e o futuro próximo dirá se o atual momento de esperança em que vivemos é mais uma perceção ingénua ou se há mesmo luz ao fundo do túnel.
O que diria a quem ainda não veio ao Alkantara Festival?
Nunca é tarde demais.
O Alkantara sai à rua a partir de Maio, ocupando as salas das Instituições Culturais de maior relevo em Portugal, bem como outros espaços da cidade de Lisboa, tais como: São Luiz Teatro Municipal, Centro Cultural de Belém, Teatro Nacional D. Maria II, Maria Matos Teatro Municipal, Culturgest, Cinema São Jorge e Jardim do Torel.
Toda a programação completa e informações adicionais: aqui.
Galeria:
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