#AGC ANA LUA CAIANO 008

Ana Lua Caiano @ B.Leza (11.04.2024)

É música tradicional eletrónica popular.

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Texto por Miguel Barba e fotografia por Andreia Carvalho.

Ainda me recordo de ver Panda Bear, no antigo B.Leza, no Largo do Conde Barão, não muito longe de onde nos encontramos agora, à beira-rio. Os tempos podem ser outros, mas o espírito que ali se viveu, contínua bem vivo por aqui. A lotação está esgotada, mas isso não demove algumas pessoas de tentarem ainda arranjar bilhete junto à porta.

“Vou Ficar Neste Quadrado”, um álbum cujo título é uma antítese do que que estas canções representam e deixam extravasar. Eis que chega o dia de o mostrar ao vivo em Lisboa. O setup no palco é único, mas isso já se sabia. Que Ana Lua Caiano é presente e futuro da música portuguesa, sem deixar de olhar e abraçar o passado, também já sabemos. Aqui queremos “apenas” constatar ao vivo isso mesmo.

Às 22h a fila do lado de fora ainda era longa. É dia de jogo, e um em particular terminou há poucos  minutos. Espera-se mais um pouco. Não é grave. Aguardamos. As portas para o mundo estão abertas para Ana Lua Caiano, ao que não será alheio ter assinado pela Glitterbeat. Lisboa é, neste momento, mais um ponto de passagem, mas não deixa de ser casa.

“Que o sangue circule / Que a barriga se encha / Que a mão esteja ocupada / E nunca vazia”. Começamos com «Que o sangue circule», um pequeno passo atrás, a “Cheguei Tarde a Ontem”, que tão bem começou a projectar o futuro. A construção da canção em palco é fantástica. É pujante, mas não deixa de denotar alguma fragilidade. E depois há execução técnica e o à-vontade de Ana Lua.

«Cansada» já é de “Vou Ficar Neste Quadrado”, alternando entre a batida electrónica e a orgânica do tambor. A ansiedade latente, misturada com a resignação.

«Saí da Frente, Vou Passar» surge de rompante, antes de «Ando em círculos», em versão mais despida mas alavanca por todos nós naquela sala. Já «Os Meus Sapatos Não Tocam Nos Teus», com um piano que parece destoar, mas que na realidade inunda a canção de personalidade, camada após camada enche as medidas.

«De Cabeça Colada Ao Chão» é didáctica na forma como é apresentada, com Ana Lua Caiano a aproveitar para mostrar como constrói a canção, com um à vontade e uma classe, desembaraço e simpatia contagiantes. Cresceu tanto em palco em tão pouco tempo. O resultado aqui é uma versão mais densa e quiçá mais dançável. Fantástica em qualquer dos casos.

«Adormeço Sem Dizer Para Onde Vou» é como outras canções, uma pequena história, repleta de vida e de detalhe. «Vou Ficar Neste Quadrado» é interactiva. Os nossos pés são gravados e incorporados na canção. Uma canção sobre aquilo que devemos combater. Sobre não arriscar, não sair da nossa área de conforto. Uma interpretação fantástica. «Mais Alto Que o Meu Juízo» é música tradicional eletrónica popular.

«Se Dançar é só depois», ou como uma pessoa já acorda com os pés no chão para ser mais fácil levantar e depois surge «Deixem O Morto Morrer», como uma mescla incrível entre o cru da tradição e o cru da electrónica. Tudo rematado com uns versos que unem tudo numa demonstração cabal de como o todo é maior do que a soma das partes.

«Casa Abandonada» leva-nos a “Se Dançar é Só Depois”, mesmo antes de «Mão na Mão», que giza a recta final de um concerto intenso, certeiro, festivo, intimista e triunfal de Ana Lua Caiano. Mas ainda há tempo para ouvir e dançar «Cheguei Tarde a Ontem» com outras roupagens, mas igualmente incrível. A forma como géneros e sonoridades completamente distintas vão sendo combinadas ali à nossa frente, é comparável a um rendilhado delicado de uma tapeçaria de arraiolos. Terminou com o «O Bicho Anda Por Aí»; e anda mesmo, e ainda bem.



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