Andrew Bird @ CCB (09.11.2016)
Um serão muito sério
A noite de quinta-feira no Centro Cultural de Belém, integrada no Misty Fest, começava com uma surpresa em relação ao cartaz original, dado que teríamos direito a acto de abertura antes de Andrew Bird entrar em palco.
Foi de bom grado que o público do repleto Grande Auditório do CCB deu as boas vindas a Momo, mais um brasileiro que veio até ao nosso país para dar uma mão cheia de shows e que acabou por ir ficando, e inclusivamente conceber um disco por terras lusitanas. E, à imagem de Silva ou Cícero, apadrinhado pelos quase lisboetas Marcelo Camelo e Mallu. Momo aproveitou a ocasião para nos apresentar meia-dúzia de temas pertencentes a esse álbum que gravou por cá e que tem lançamento agendado para Março, tendo a companhia do baterista/percussionista Filipe Bastos.
Era chegada a hora da personagem principal do filme desta noite. E, principalmente para quem já assistiu a outros concertos de Andrew Bird, foi notório que a mecânica e a inspiração não estavam famosas. Inicialmente salvou-se aquele raio de sol que perfura o cinzento no refrão de «Hole In The Ocean Floor», mas as diferentes partes das músicas não estavam a colar da melhor forma.
Aao fim de duas músicas Andrew Bird confessou que o dia estava a ser mau. Como seria previsível, o desfecho das eleições dos E.U.A. pairava sobre o concerto e o multi-instrumentista não tinha a cabeça no lugar, dado estar ainda a tentar entranhar o sucedido, numa escala de sentimentos que movia-se entre a vergonha e a raiva. Num acto altamente diplomático, prosseguiu a performance com um tema composto em Lisboa, «Tenuousness», fruto dum sólido relacionamento que mantém com a nossa capital. Mas é com «Why?», e toda a encenação teatral que sempre proporciona, que Andrew Bird acaba por desprender-se mais e tornar os seus movimentos mais naturais e abstraídos da realidade actual. No entanto a temática acaba por nunca se desvanecer, e volta à baila quando introduz «Sic Of Elephants», canção que produziu na tentativa de tentar compreender os seus compatriotas aquando da reeleição de George W. Bush. Será quase certo que escreverá outra(s) acerca da mais recente escolha do seu país.
Até este momento o músico de Chicago tinha estado rodeado dos seus instrumentos habituais (violino, guitarra e xilofone), respectivos amplificadores e pedaleiras. Para a segunda etapa da actuação desloca-se para uma ponta do palco onde existia somente um solitário microfone.
Foi daí que nos contou a história de «Saints Preservus», escrita originalmente para Django Unchained e mais tarde reformulada para a série Baskets, tendo sido ignorada por ambas as produções, acabando finalmente por figurar em “Are You Serious”. Andrew Bird devolve depois o foco a Lisboa e brinda-nos com uma versão instrumental de «Estranha Forma de Vida», que teve o privilégio de gravar em pleno Aqueduto das Águas Livres numa outra passagem por cá.
Regressa ao conforto da sua panóplia de aparelhos e instrumentos, e arranca para uma recta final mais rica a nível instrumental, com as diferentes camadas de violino, voz e assobio a soarem mais harmoniosamente que no início. E assim respeitaram-se dignamente as emoções que nos trazem sempre canções como «Sifters», «Three White Horses» ou «Roma Fade» (claramente o momento mais alto do seu disco mais recente). Para não falar somente da cidade dos outros, termina com uma ode à sua Chicago pelos acordes de «Pulaski At Night».
A rendida plateia força facilmente o encore, no qual sai uma nova seta política, com o hino afro-americano «I Shall Not Be Moved», após ter confessado que abandonar os E.U.A. neste momento não seria um gesto muito nobre. O serão termina ao som do formidável «Tables and Chairs», uma canção cheia de tudo o que é Andrew Bird, valendo como um belíssimo resumo da matéria dada.
Foi um concerto em crescendo, que terá sido terapêutico na mesma medida para o público e para o artista.
Alinhamento
– Hole In The Ocean Floor
– Capsized
– Tenuousness
– Are You Serious?
– Why?
– Anonanimal
– Sic Of Elephants
– Chemical Switches
– Saints Preservus
– Left-Hand Kisses
– Estranha Forma de Vida
– Sifters
– Roma Fade
– Three White Horses
– Plasticities
– Pulaski At Night
(encore)
– I Shall Not Be Moved
– Give It Away
– Tables And Chairs
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