Armando Teixeira aka Bulllet

Em discurso directo e exclusivo para a ruadebaixo.

Armando Teixeira desde cedo se dedica inteiramente à música. Também conhecido pelo seu trabalho como Bizarra Locomotiva ou Balla, lançou recentemente o segundo álbum de Bulllet, o alter-ego do espião Vladimir Orlov. Numa descontraída conversa com a RDB, falou-nos de “Torch Songs For Secret Agents”, como Vladimir nasceu e os seus projectos paralelos.

RDB – Dentro do actual panorama musical português és capaz de ser uma das figuras mais ecléticas e multifacetadas existentes. Como é que essa característica se foi desenvolvendo e como foi o teu percurso musical até hoje?

Armando Teixeira – Começou com um grupo de amigos de Belas que gostava de música. Na altura comecei por ouvir Joy Division, The Cure, New Order, depois de coisas mais electrónicas como a Electronic Body Music, mas foi provavelmente com a saída do CD de Franky Goes to Hollywood que tivemos a vontade de fazer uma banda.

A utilização das máquinas surge porque éramos poucos e esta era uma opção viável para substituir o baixista ou o baterista.

RDB – Partindo para o Vladimir Orlov (Bulllet), como é que ele e todo o imaginário à sua volta surgem?

A.T. – A ideia surgiu quando o Miguel Abreu estava a lançar a Looprecordings e pediu-me que criasse um disco de instrumentais para a sua editora. A ideia ao princípio pareceu-me demasiado repentina, mas ele propôs-se a inventar uma personagem para as músicas entretanto criadas. Ele foi-se inspirando e dando vida a essa personagem e a justificar o porquê da sua existência e o resto foi surgindo muito naturalmente. Primeiro foi a música que inspirou a personagem, mas muitas vezes é a personagem que inspira a música.

RDB – A personagem deixou de ser a desculpa para a criação das músicas…

A.T. – Conforme… por vezes crio músicas inspiradas no Orlov, mas outras vezes acabo de as criar e acho que se adequam perfeitamente a esta personagem. Mesmo neste último álbum, aquelas músicas que criam toda a tensão necessária a personagens do mundo da espionagem já surgem naturalmente e não vale a pena escondê-lo.

RDB – Não achas que o Bulllet veio marcar um pouco a música portuguesa, sendo um dos primeiros projectos marcadamente instrumentais, com um conceito inerente?

A.T. – Eu sou completamente obcecado pela justificação das coisas. As músicas só fazem sentido para mim se tiverem uma justificação. Fazer música “avulso” não faz sentido. Não é necessariamente um álbum conceptual, mas as coisas têm uma razão de ser. Cada vez mais, com a facilidade com que as coisas se fazem e com a quantidade de influências que existem, para de qualquer maneira conseguirmos demarcarmo-nos temos de pensar naquilo que estamos a fazer e justificá-lo, sem se ser obsessivo. Acho que isso credibiliza o projecto.

RDB – Esperavas o sucesso que Bulllet teve?

A.T. – É um sucesso relativo. Não é algo em que pense muito. Estou contente com a possibilidade de continuar a fazer música. Acho que as pessoas vão levar comigo durante muitos anos (risos). Eu penso mais no que está por fazer e não no que está feito.

RDB – Isso quer dizer que já estás a pensar no próximo álbum?

A.T. – Sim, já estou a pensar no próximo álbum.

RDB – A tua música tem a particularidade de ter um formato internacional, porque pode muito bem passar em qualquer canto do mundo. Quando estás a criar estas músicas, este pensamento ocorre-te?

A.T. – Eu penso em fazer boa música para que se justifique a existência dos Bulllet noutro país, para que possa ter alguma visibilidade. Tento melhorar-me constantemente e preocupar-me primeiro com a música e depois nessa internacionalização que nós estamos de algum modo a tentar e a conseguir. Eu tenho a consciência de que a música que faço é válida aqui e noutro país qualquer.

RDB – Como é que este segundo álbum sofre uma evolução tão grande? No primeiro as músicas funcionavam perfeitamente sem voz, mas neste já se nota um clara realização de algumas faixas em associação com vocalizações e os dois elementos não podem ser separados.

A.T. – Sim, no primeiro as músicas podiam existir perfeitamente sem voz. Isso foi procurado e as pessoas ideais para fazer esse tipo de coisas também foram surgindo. Por exemplo, tenho pena de não ter feito mais canções para a Lili, mas quando a oportunidade surgiu, o álbum já ia muito adiantado e já tinha muitos instrumentais. Estava tão ligado ao álbum que já não podia incluir outras coisas sem ser as que já tinha criado.

Talvez o próximo álbum se torne mais instrumental, ou não, mas acredito sinceramente que este é uma evolução do primeiro, apesar de algumas pessoas dizerem que o primeiro álbum é mais coerente.

RDB – Mais coerente, talvez por respeitar mais o formato instrumental.

A.T. – Sim, talvez pelas boas reacções que o primeiro teve e que levou as pessoas a esperarem talvez mais do mesmo. Mas existem muitos pontos em comum nos dois álbuns que foram procurados e respeitados. Mesmo os críticos, depois de o ouvirem com mais atenção, concordam comigo e dizem que este está muito melhor.

RDB – Achas que o Bulllet perde um pouco da sua identidade com esta evolução?

A.T. – Não acredito que seja por ser cantado ou instrumental que ele vá perder a sua identidade. Acho que ele agora não tem um tema tão central, porque tentámos fazer com que o Vladimir fosse de férias e conhecesse todas as personagens que surgem neste segundo álbum. Assim sendo, todas as influências são válidas. Este é um álbum muito mais vasto e ecléctico que o primeiro.

RDB – O objectivo era então expandir os horizontes do Vladimir?

A.T. – Era. Eu gosto de pensar que um álbum, ao abrir esses horizontes, vai deixando pistas para os próximos trabalhos. É isso que fiz aqui, abri pistas para o próximo. Não sei quais, mas isso logo se vê (risos).

RDB – A Lili e a Miss Shing são as “Bond Girls” do Vladimir?

A.T. – São. Eu senti falta do elemento feminino no primeiro álbum de Bulllet e decidi compensar neste último. Aliás, todas as histórias de espionagem precisam das “Bond Girls”.

RDB – Os nomes das tuas personagens andam sempre à volta do mesmo. Primeiro foi o Balla, agora o Bulllet. És um homem violento?

A.T. – Não, não sou violento (risos). Eu acho que às vezes sou um pouco impulsivo, mas cada vez mais controlo coisas que nunca pensei controlar, conseguindo surpreender-me a mim mesmo.

RDB – O que tens feito além dos álbuns?

A.T. – Tenho tido bastante trabalho. Fiz a banda sonora para a peça “Conspiração” e também para uma peça no teatro de Braga. Agora, fiz uma versão de um tema da Amália para a editora Difference e estou também a preparar um disco de homenagem à Amália. No dia 10 de Julho, vai haver no Teatro Maria Matos um espectáculo de homenagem ao António Variações onde participo com o Adolfo Luxúria Canibal, além de trabalhos como produtor, entre outras coisas.

RDB – Como é o trabalho de produção? Dá-te gozo ver cumprir os objectivos que uma banda te propõe?

A.T. – Dá-me gozo, mas eu não quero nunca que o meu trabalho de produção seja confundido com os Bulllet ou com os Balla. Tento mais ser eficaz do que preocupar-me com as questões com que me preocupo no meu trabalho criativo. Quero é que as pessoas fiquem contentes com o meu trabalho de produção. Claro que me farto de dar dicas e sugestões, mas a decisão é sempre de quem me procura como produtor.

RDB – Já pensaste fazer alguma banda sonora para um filme? Uma qualquer sequela do James Bond talvez.

A.T. – Eu gosto muito de bandas sonoras e dentro dos produtores de bandas sonoras gosto especialmente do David Holmes. Mas gosto de imaginar que o realizador que o vai contratar, sabe exactamente aquilo que ele vai fazer. Que o resultado de uma produção para este fim seja um processo criativo e não só aquilo que o realizador tem em mente, mas sim aproveitar o que o músico já fez. Um pouco como fiz para a “Conspiração”. Para um filme, estou à espera de um convite.

RDB – Se pudesses escolher alguém no mundo com quem colaborar, quem seria?

A.T. – Eu tenho alguns heróis, mas esses heróis não são necessariamente pessoas com quem gostasse de trabalhar. Na parte técnica preferia mais trabalhar com pessoas da produção ou isso. Gosto muito do David Holmes e a forma como ele trabalha, mas para mim é mais importante a parte humana e a forma como nos relacionamos do que propriamente a parte do trabalho. As pessoas com quem trabalho são meus amigos e são pessoas com quem me dou bem, antes de trabalhar com elas.



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