Arooj Aftab @ Teatro Maria Matos (01.11.2022)
Houve sala cheia no Teatro Maria Matos para receber Arooj Aftab, de regresso a Portugal, poucos meses depois de ter atuado no Rock In Rio e em Braga. A paquistanesa radicada nos Estados Unidos, surge em palco apenas acompanhada por Gyan Riley, virtuoso da guitarra acústica, como rapidamente percebemos. Já Arooj Aftab trás toda uma herança cultural na sua voz, mas sempre a olhar para o futuro.
“Vulture Prince” é omnipresente. Foi ele que ali nos trouxe e Arooj Aftab sabe bem disso. Tem orgulho nisso e sabe que nós somos bons ouvintes. Esta é a primeira data da última digressão do ano para o álbum. O carácter universal e agregador que a música tem está aqui personificado de forma perfeita. No palco, há uma garrafa de vinho e um copo. Nunca vazio e que vai desempenhar um papel fundamental ao longo de todo o concerto.
A viola acústica de Gyan Riley é também ela multifacetada, fruto dos múltiplos pedais, que têm a capacidade de nos transportar entre continentes e culturas, tal como as canções de Arooj Aftab. Juntamos a isto o silêncio assombroso que se vivencia em cada canção e temos reunidos os elementos todos para sabermos que estamos a assistir a algo memorável.
Arooj Aftab ao descrever as suas canções associa-lhes repetidamente a ideia da procura de um estado de embriaguez e de falhar no amor. Algo que à medida que o concerto avança, se revela como um mecanismo muito próprio para lidar com canções que têm um peso, cada vez que são cantadas, ainda para mais quando a audiência, na sua grande maioria, não tem a capacidade de compreender a letra e o significado, embora consiga sentir (e bem) as emoções. É uma voz incrível que parece carregar séculos de histórias e tradições.
Em Nova Iorque é impossível ver o céu nocturno. Já em Lisboa foi possível ver a lua. A vida por vezes oferece-nos estes pequenos prazeres, que muitas vezes nem sabíamos precisar. «Last Night» é naturalmente a canção que se segue. Aquela que todos percebem e por isso mesmo sentem de forma diferente. Aqui o ska stroke da versão do álbum é substituído pelo rendilhado – também ele magnífico – da guitarra. “Last night my beloved was like the moon”.
Arooj Aftab é sincera. Percebe-se que ainda procura processar aquilo que “Vulture Prince” lhe ofereceu. As portas que lhe abriu. Ter a possibilidade de dizer que locais como Lisboa, Porto e Sintra são românticos.
«Udhero Na», foi escrita quando Aftab tinha apenas 15 anos. Resistiu ao teste do tempo e para gáudio dela, pode gravá-la com Anoushka Shankar e editá-la na versão deluxe de “Vulture Prince”, recentemente lançada.
Em palco há uma jarra de rosas para oferecer ao público, mesmo contra a recomendação do seu manager, por não dispor de nenhum seguro que a proteja, caso acerte em alguém com uma. O humor é outro mecanismo de defesa e revela-se eficaz. Talvez seja mais importante para Arooj do que para nós. Nós sentimo-nos muitas vezes com o coração nas mãos. Como será para Arooj?
O copo continua sempre cheio, e a seu lado Gyan Ridley é incrível. «Mohabbat» não é uma canção feliz. Está apenas composta num tom maior, diz-nos. Mas é bela. E as rosas são distribuídas o melhor possível pela assistência. É uma experiência sensorial e tanto. Saímos daqui mais ricos.
A saída do palco é breve. No regresso, a viola acústica demonstra, novamente, como com vocalizações de outras latitudes, obtemos resultados surpreendentes, pela forma como o que escutamos nos soa clássico e tradicional, mas também moderno e arrojado.
Um concerto inolvidável.
Texto por Miguel Barba e fotografia por Andreia Carvalho.
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