Art in Berlin
Passados vinte anos da reunificação de Berlim, a posição da capital alemã enquanto núcleo artístico internacional continua a expandir-se. Vagas de artistas deslocam-se até à cidade para conquistar o seu espaço.
“Onde existia um Muro sombrio abriu-se, de repente, uma porta e todos nós passámos através dela: pelas ruas, pelas igrejas, nas fronteiras. A todos foi dada a chance de construir algo de novo, de fazer a diferença, de arriscar um novo começo”. As doces palavras que Angela Merkel utilizou para recordar a noite da queda do Muro de Berlim ficariam perdidas no discurso do dia 9 de Novembro se não fosse o caso de se adequarem verdadeiramente à realidade da capital. “Berlim é um local para novos começos” afirma Ana, uma galerista espanhola do distrito de Mitte, “viver numa cidade que não está terminada tem um grande impacto em nós. Em Madrid não me iria permitir tentar uma vida completamente nova”, garante.
Ana faz parte da crescente onda de artistas que se mudaram para Berlim. Com estes, galerias e espaços relacionados com arte continuam a nascer porta sim porta não, dando cor e vida a uma urbe antes cinzenta e longe de ser solarenga. A razão deste florescimento? Nos dias que correm é praticamente impossível, para um jovem artista, sobreviver em Nova Iorque, Londres ou Paris. Berlim é o seu recurso. Os criativos mais brilhantes são atraídos pelo baixo custo de vida aliado à sua alta qualidade e a um clima criativo extremamente fértil. Este influxo está a transformar a cidade.
Nas páginas da História
Mas Berlim sempre foi única. Durante os anos da Guerra Fria a cidade era um íman para as minorias gays, punks e pacifistas que não se enquadravam nos limites impostos pela sociedade. A herança deste sangue original e idealista ainda se sente pela cidade. Entre as décadas de 50 a 80, os artistas berlinenses levaram o mundo das artes não só a enfraquecer a sua obsessão por Nova Iorque mas também a considerar a arte abstracta uma das principais correntes do século XX.
Quando, há exactamente vinte anos, o Muro de Berlim foi derrubado, a cidade tornou-se num foco da atenção internacional do dia para a noite: antes um símbolo de dois sistemas políticos opostos, passou a representar um barómetro para o processo de reunificação e um tubo de ensaio de novas ideias sociais, culturais e arquitectónicas. O profundo processo de mudança que ocorreu desde então não foi apenas acompanhado de numerosos debates públicos sobre a construção da nova capital, como atraíu artistas de diversos pontos do globo para quem as mudanças drásticas foram objecto de investigações artísticas e intervenções de raíz. Estes processos de mudança inspiram conceitos e ideias que oferecem comentários, alternativas e utopias.
Berlin Lab
E Berlim continua a afirmar-se mais como um laboratório do que como um mercado. Um local para a produção de arte, e não de consumo. A tendência global aproxima-se cada vez mais do “mercado de arte 2.0”, em Berlim e no resto do mundo. Os grandes coleccionadores compram sentados nas suas secretárias de Londres e Nova Iorque. O comprador envia o seu assistente para um showroom para tirar fotografias. Após alguns “cliques”, a obra de arte não tarda a aterrar na sua porta. O mercado de arte tornou-se tão virtual quanto global: a página Facebook de um artista é agora tão vital para este como o endereço do seu studio. O que os artistas precisam agora são showrooms e contactos. E Berlim oferece ambos. No entanto, Berlim é um local onde a rede social artística é bastante fechada. Mas uma vez que se entre no circuito de artistas-galeristas-curadores, e se façam contactos, as obras serão vendidas mesmo ao abandonar a cidade, desde que se adquira um nome no circuito. Por outras palavras, é plantar uma semente no solo fértil de Berlim e vê-la crescer.
Berlin Artscape
A “art scene” de Berlim é, actualmente, um grande showroom. Eventos internacionais como o Art Forum, o Berliner Liste, Preview Berlin, Berliner Kunstsalon, o Kunst Werke’s Biennale e festivais patrocinados pelo Estado como a Transmediale atraem interessados com grande poder de compra. Os alemães sabem exactamente quem é responsável pela cultura – o Governo. Mais nenhum outro país do mundo tem tantos impostos para a arte ou um sistema de financiamento das artes tão complexo que atravessa todos os níveis de governação. Um exemplo para Portugal.
Quem visita Berlim pela primeira vez fica sempre surpreendido por ver tantos jovens comodamente sentados nos trendy Kafees, a ver passar as horas da tarde: estes são os artistas de Berlim, pois ser um artista, nesta cidade, é sinónimo de Lebensstil. Eles trocaram as vidas ultra-competitivas da suas nativas Londres, Nova Iorque ou Paris por esta dolce vita do Norte.
Berlim é um playground para artistas, especialmente os da estirpe preguiçosa – Lebenkunstler, são chamados. Apenas aqui se podem dar ao luxo de pagar a renda enquanto passam muito tempo, basicamente, … a passear. E, de sublinhar, eles DEVEM ESTAR a passear, porque a arte necessita de elementos de tempo, espaço e imaginação para crescer. Onde, se não em Berlim, se encontra isto?
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