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Camomila ao vento #2

Burning Man – A utopia de uma sociedade ideal.

Todos os anos, durante uma semana, o deserto de Black Rock no Estado do Nevada enche-se de 50.000 pessoas provenientes de todo o mundo para celebrarem a vida, a música, a expressão artística, a humanidade. Este ano o tema da decoração e programação foi a metrópole.

São oito dias sem contacto nenhum com o mundo exterior, não há telecomunicações, internet, televisão, jornais ou rádio. Oito dias em que somos obrigados a viver o presente despreocupadamente, sem necessidade de justificar isto ou aquilo perante terceiros. A liberdade é o valor dominante para todos os festivaleiros.

Mas o Burning Man tem uma outra característica única que o torna altamente especial, não há dinheiro. Isto é, o sistema capitalista em que as sociedades modernas vivem é abolido durante o período do festival, abrindo espaço para o sentimento de partilha que é visível nas mais diversas situações do dia-a-dia do festival. Desde a comida, às bebidas, passando pela partilha de elementos decorativos ou luzes reflectoras, a partilha é algo a que todos se comprometem. E há alguns que levam isto ao extremo, oferecendo por exemplos banhos, massagens, cortes de cabelo ou consultas médicas.

Não fossem suficientes estas razões, as condições geográficas em que o Burning Man decorre criam uma selecção natural que o impede de ser mainstream. O calor é aterrador durante o dia, o frio estala durante a noite, e porque se trata de um deserto em que nem uma plantinha sobrevive, o pó é companhia assídua, sobretudo quando o vento está forte. A juntar a isto não existem chuveiros nem água potável para consumo, pelo que todos a água e mantimentos que possam ser necessários devem ser levados no início. Mas é esta a energia do Burning Man, é viver nestas condições e adaptarmo-nos a esta realidade utópica no mundo real.

Naturalmente, um festival que decorre nestas condições exige um esforço de planeamento, gestão e organização muito grandes. Mas a verdade é que nada é deixado ao acaso e tudo está perfeitamente em sintonia. O recinto encontra-se organizado por ruas com nomes de cidades e seguindo as horas do relógio, formando uma lua – Exemplo: Rua 4h30 Detroit. Aqui estão estacionadas as caravanas, as tendas, locais de workshops e pequenos bares feitos pelos próprios festivaleiros. No centro está a Playa, o local mais espiritual do Burning Man, onde se encontram expostas as peças de arte e por onde bicicletas adulteradas e veículos mutantes se deslocam calmamente. Na fila onde terminam as tendas e começa a Playa está a Esplanade, que durante a noite parece uma Feira Popular. É só luzes, fogo, movimento, música e pessoas por todo o lado. Aqui a festa parece durar 24 sobre 24 horas. E acreditem em mim não vêm as horas passar porque a quantidade de pessoas que todos os dias conhecem nesta área é incrível.

Quando voltei do festival muitos me perguntaram qual o género de música que se ouvia lá, e a generalidade acreditava que o estilo predominante seria o trance devido à natureza do festival. Mas  estão enganados. No Burning Man a música é o que quiserem. Há música dos anos 80, electro-minimal, rock, grunge, trip-hop, hard-house, techno, reggae, hip-hop, dubstep, drum n’bass, e naturalmente trance. Esse é um dos grandes trunfos do festival. Podem estar constantemente a trocar de tipo de música, de acordo com os vossos gostos, sem terem que andar quilómetros. Ah e tanto podem dançar com os vossos pés no chão como podem embarcar num veículo mutante à boleia e dançarem em andamento. É fenomenal.

A programação do Burning Man é vastíssima. Para além da componente musical e artística que já aqui falamos, a organização em conjunto com os festivaleiros desenvolve diversos workshops que têm lugar ao longo do recinto do evento. Sessões de shamanismo, yoga ou meditação, palestras sobre BDSM, interpretação do calendário da civilização Maya, jam sessions, orientação de sonhos ou cerimónias judaicas são algumas das propostas em cima da mesa. Contudo, o Burning Man é exploração portanto se lá forem peguem nestas dicas e investiguem por vocês mesmos.

O fundamental é levarem a menta aberta e o coração livre porque esta não é uma realidade vulgar. No Burning Man podem acontecer as coisas mais hilariantes da vossa vida e se estiverem de mente aberta a vossa reacção será alinhar na proposta e rir. Para terem uma ideia, existem bares que vos obrigam a receber uma chicotada no rabo para obterem uma bebida gratuita, existem barraquinhas chamadas de Kiss Booth onde há passagem devem beijar todos os elementos presentes, existem também bares com sessões permanentes de dominação. Mas não fiquem chocados, como disse a realidade aqui é despreocupada. Os participantes desfilam nus sem tabus, há imensos casais lésbicos e gays, naturalmente há drogas a circular, mas acima de tudo há uma vontade enorme de viver intensamente estes dias. Deixem-se levar, a vossa imaginação será o limite.

Para este ano não há mais novidades, mas fiquem atentos ao próximo ano do Burning Man.

Ilustração de Isabel Salvado



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