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Daniel Cardoso – Quorum Ballet

Entrevista ao Director Artístico e coreógrafo residente do Quorum Ballet,companhia que recentemente foi galardoada na primeira edição do "Portugal Dance Awards".

Criado em 2005, o Quorum Ballet é uma Companhia de Dança Contemporânea de repertório, que tem vindo a afirmar-se dentro e fora de Portugal. A sua equipa, sólida e permanente, conta com bailarinos provenientes do extinto Ballet Gulbenkian, Peter Schaufuss Ballet, Companhia Nacional de Bailado e Martha Graham Dance Company.

Através da AQK – Associação Quórum Ballet, a Dança é levada ao público em geral, através das formações que promove. O Quórum Ballet é, por esta razão, um projecto muito abrangente, que veio colmatar uma lacuna há muito existente na Dança Contemporânea em Portugal.

A RDB foi falar com Daniel Cardoso, Director Artístico e Coreógrafo residente do Quórum Ballet, para saber um pouco mais acerca desta Companhia.

Como é que surgiu o sonho de ser bailarino?

Quando eu tinha entre 9 a 10 anos, a minha mãe, que queria ter sido bailarina, perguntou-me se eu queria ir para o Conservatório. Fiz a audição, fiquei na escola mas naquela altura não tinha a noção se aquilo seria o que eu queria fazer para o resto da minha vida.

Nós tínhamos espectáculos de final de ano e a primeira vez que fiz um espectáculo no teatro, foi no Teatro S. Luís, devia ter para aí uns 13 ou 14 anos, já não me lembro. Desde o momento que passei essa experiência, decidi que aquilo era o que eu queria fazer com a minha vida. Desde o momento que fiz a minha primeira actuação no palco, com o público, com as luzes, com tudo, com a situação ideal, senti que era aquilo o que eu queria fazer. Logo. Imediatamente. A partir daí, decidi que era aquilo. E depois…até hoje! (Risos). Foi assim.

Foi difícil? Contou logo com o apoio da sua família?

Com os meus avós, as pessoas de mais idade, de uma geração anterior à dos meus pais é que foi mais complicado. Quer dizer, se calhar o que eles queriam era que eu jogasse futebol. Hoje em dia, sou o orgulho dos olhos deles. Cresceram muito, seguem Dança, vão aos espectáculos de dança e não vão só aos meus! Vão a espectáculos de Dança porque agora gostam de ver.

Não existiria também algum receio pelo seu futuro profissional?

Sim, também. Essa era outra razão, exactamente. Isso foi… (pausa). Até os meus próprios pais sempre acharam… (nova pausa) e continua a ser uma vida difícil, apesar de ter tido muito sucesso como bailarino. Se eu tivesse ficado onde estava, nos países onde vivi, se calhar já tinha chegado a uma situação estável. O problema é que, quando chego a uma situação estável, quero sempre uma alteração e quero sempre andar para a frente, então mudo de sítio, mudo de ares.

E depois quando voltei para Portugal, ainda foi pior. Fiz uma coisa ainda mais…um desafio ainda maior. Mas gosto de viver dessa maneira. Não gosto de estar assim muito seguro. A verdade é essa.

… Isso funciona como um trampolim para a próxima etapa?

Claro! Exactamente! Se não se tem uma meta lá ao fundo, nunca se chega longe. É verdade, seja cá ou fora do país, a vida de um bailarino ou de coreógrafo, a vida de artista não é fácil. Em termos pessoais, onde já cheguei como bailarino, só, se tivesse ficado onde estive ou onde trabalhei, tinha uma vida bastante confortável. Mas depois decidi fazer outra coisa. Decidi ir por outro caminho, tentar criar algo cá em Portugal, porque queria viver cá em Portugal também, não queria viver só fora, gosto de Portugal, gosto de viver em Lisboa e gosto de cá trabalhar também.

Partindo do patamar onde estava, que já era muito bom, a decisão de vir para Portugal deve ter levantado muitas questões. Os seus amigos, os seus familiares devem tê-lo questionado. Como é que foi responder a essas questões que, na verdade, actuam como a nossa própria consciência?

Uma das razões pelas quais voltei para Portugal foi pela minha família. Sempre fui ligado à minha família e queria estar mais perto. É engraçado que agora sou um “parentezinho”. Agora que cá estou ainda os vejo menos, é incrível! (Risos). Não é verdade!.. Não é menos, mas gostava de os ver mais, pronto. Que correria que a vida é!..

Mas ao voltar para cá, recebi algumas críticas de amigos meus, ou ex-amigos, ou colegas de escola, que me perguntaram “Porquê? Porque é que vieste?” e eu: “Porque sim, porque eu quero fazer isto”. Primeiro, queria viver cá em Portugal, queria trabalhar cá em Portugal. Achei que havia espaço para criar algo novo e decidi ir em frente. Acho que tudo é possível, desde que se tenha o conhecimento e os meios para lá chegar. Tem que se ter os pés assentes na Terra. E eu acho que tenho. Mas mesmo tendo os pés assentes na Terra, ter sempre uma meta e trabalhar para lá chegar.

Houve algumas críticas. Hoje em dia já não me dizem tanto, mas diziam “Epa, largaste tudo, vieste para aqui porquê? Para quê?” (Risos). A minha família não. A minha família ficou muito contente e tem-me apoiado tremendamente. Então no princípio, quando a Companhia começou, tudo o que pudessem fazer (embora não pudessem fazer muito) faziam.

O que é que o motiva todos os dias? Uma coisa é ter um sonho, ter metas, ultrapassar barreiras. Mas no dia-a-dia, tem de haver sempre aquela coisa que serve de inspiração, de motivação. Tem alguma que o inspire?

Tenho, tenho. As principais coisas que tenho como referência na minha cabeça (e sempre tive) são duas ou três pessoas do mundo da Dança, que criaram companhias e que conseguiram desenvolver um trabalho que é único e que conseguiram ser referências. Qualquer dessas pessoas tem que ter um trabalho contínuo, tem que ser todos os dias, não pode haver um dia mau (Pausa). Tem que se ter essa consistência e essa força de vontade. Nas alturas mortas, tentar descansar um pouco para conseguir ganhar forças para continuar. É isso que eu faço: todos os dias de manhã tenho em mente o tal objectivo e as tais pessoas com quem trabalhei, com quem me cruzei ou com quem não me cruzei (porque já tinham morrido mas fiz o trabalho delas) e que me servem de exemplo.

Quem são essas pessoas?

Uma das pessoas que me marcou mais, não pelo trabalho artístico, mas pelo que ela fez foi uma coreógrafa norte-americana, a Martha Graham. Eu trabalhei na companhia dela, ela já tinha morrido, mas realmente foi uma pessoa que, desde que decidiu criar algo novo, fundou não só uma companhia, mas uma linguagem, que hoje em dia é uma técnica. Ela sozinha, criou aquilo. Muitas coisas técnicas, são criadas a partir de vários pontos, durante séculos. Ela não. Ela sozinha criou! É um trabalho contínuo, diário, eu sei que é. É a única maneira.

E depois, outras pessoas com quem trabalhei, coreógrafos que tentaram e que até hoje tentam abrir e manter companhias em sítios como Nova Iorque, que é uma cidade dificílima, porque há muita competição, há muito pouco dinheiro, há poucas ajudas. É complicado, mas continuam a tentar todos os dias. As companhias estão abertas e continuam, continuam, continuam…

Por isso, é possível e a minha ideia é essa. A Arte é um produto (eu não devia dizer isto, mas de vez em quando tem de se pensar na Arte como um produto. A Arte não é um produto, mas percebe o que eu estou a dizer, não é?) que tem de ter sempre qualidade. Se tiver isso, tem sempre pernas para andar. Se não, é complicado.

Mas tem algum “mantra” para as situações mais complicadas, em que se sinta com menos motivação?

Tenho bastantes situações em que sinto não só a responsabilidade que tenho, o peso dessa responsabilidade, mas também o stress e eu ponho isso tudo para trás das costas e as coisas funcionam. Não tenho assim nenhuma frase para dizer a mim próprio, mas tenho dentro de mim algo que me diz “É para ir em frente e ponto final. Não há nada a fazer. Já entrou no barco, agora é até chegar ao fim”.

Em relação à estrutura da Companhia Quorum Ballet. Tendo uma estrutura permanente, deve ser complicadíssimo fazer com que o seu sonho se mantenha real. Inspirou-se nalgum modelo de Companhia?

Eu sempre soube mais ou menos qual seria a estrutura que eu tinha de ter, qual era a imagem que eu queria dar e qual a forma da Companhia ter sucesso e conseguir gerir tudo: ser director artístico, coreografar, conseguir estar nos ensaios, conseguir dançar, etc. Mas o que eu comecei a aprender mais com o passar do tempo foi como lidar com as pessoas que estão à minha frente. Porque a dificuldade que eu tenho encontrado tem sido encontrar esse equilíbrio. Em relação à fórmula da gestão e ao tipo de estrutura da Companhia, eu sabia exactamente o que queria fazer e como fazê-lo. Eu pensei e foi daí que surgiu a ideia…“Porque não começar?” Eu sempre tive a ideia de começar isto. Sempre. Mas não pensei começar quando voltasse a Portugal. Logo. Comecei porque a realidade onde nós estávamos era esta: havia companhias cuja estrutura era… (nem vale a pena dizer nada) e outras que, em termos artísticos, não eram nada do que eu queria fazer. Então eu pensei “Porque não? Eu quero continuar a viver em Portugal” Podia ter voltado para fora, mas queria viver em Portugal. Então decidi: “Vamos em frente. É agora que vai começar!”

Procurou realizar algum tipo de formação para lidar com a parte da gestão propriamente dita? Em termos práticos é preciso lidar com números, com o Marketing, etc.

Exactamente, exactamente (risos) … Hoje em dia já consigo estar mais envolvido, mas tenho alguém nessa área e sempre tive, desde o dia 1. Cada pessoa faz o que sabe fazer, “cada macaco no seu galho”. Eu não vou fazer aquilo que não sei. Então, tenho uma pessoa na venda de espectáculos, que é muito boa, tenho uma pessoa na parte administrativa e financeira, que é excelente. Arranjei pessoas logo no dia 1, o que representou um grande investimento da minha parte, para conseguir fundar a Companhia, senão não seria possível. Acho que a grande diferença é esta, porque há grandes Companhias cá em Portugal, que têm começado, têm tentado começar, mas não conseguem porque não seguem o lema “cada macaco no seu galho”. Essa expressão, ter um profissional em cada área é a única maneira de ter sucesso.

O trabalho apresentado enquanto “produto” é bom, mas se não for bem apresentado ao público e aos meios de comunicação em geral…

É nulo! É verdade, é verdade. Por isso, desde o princípio tive essa sorte, realmente tive. Porque encontrei pessoas que são muito boas nessa área. E depois também encontrei um grupo de bailarinos também muito bom. No princípio, quando a Companhia começou, o Ballet Gulbenkian tinha acabado de fechar, mais de metade dos bailarinos eram ex-bailarinos do Ballet Gulbenkian, eram pessoas com muita experiencia. Éramos um grupo muito bom, foi excelente! O grupo foi-se alterando, porque nós tivemos alturas (na Companhia) em que as condições de trabalho que podíamos oferecer não eram as melhores…Hoje em dia são muito melhores do que há três anos atrás, o grupo foi evoluindo mantendo sempre essa qualidade, sempre.

Que dificuldades encontra no dia-a-dia da gestão da Companhia, em termos de financiamento (subsídios e apoios)? Como é que é possível manter a Companhia?

Nós até há um mês atrás (são três anos e meio, desde que a Companhia foi formada) não tínhamos qualquer tipo de subsídio, nem de apoio financeiro. Tivemos apoios pontuais por parte de algumas entidades para alguns projectos em particular, mas nunca tivemos apoios financeiros. Desde há um mês para cá, tivemos a confirmação que devemos começar a ter apoio da Direcção Geral das Artes. Por isso (vou falar sobre o “antes” e o “depois”) até aos 3 anos e meio, enquanto não tivemos apoio, muita gente faz essa pergunta e eu volto àquela conversa do “produto”. Eu digo isto, mas eu não gosto de lhe chamar produto. O que eu faço, a minha Arte, não é nenhum produto, mas em termos de Marketing e em termos de números, é um produto. Para o mercado é um produto. Nós à partida temos de ter um produto que tenha qualidade e que seja vendível. Essa é logo a primeira. Depois, a partir daí é muito simples. As pessoas julgam que é muito complicado, mas na verdade é muito simples: eu tinha um número de bailarinos cujas despesas tinham de ser cobertas por um determinado número de espectáculos vendidos. Tinha de arranjar alguém da área que vendesse os espectáculos todos os meses. Houve muitos meses em que foi muito complicado, mas mesmo muito complicado. Os bailarinos não tinham que se preocupar, com o que foi acordado com eles desde o princípio. Tinham os contratos assinados e tudo nos conformes. Mas realmente, houve alturas muito difíceis.

Hoje em dia já somos reconhecidos dentro e fora de Portugal e os espectáculos têm aumentado. Então agora fazemos as contas. O nosso crescimento é assim, a pique.

Exponencial?

Completamente! Mas…É incrível, eu nunca tinha olhado para aquilo. Eu nem tinha a noção… quando fizemos os gráficos e eu olhei para aquilo eu até fiquei assustado. Trabalhámos durante três anos e meio e finalmente conseguimos a atenção do Ministério da Cultura. Concorremos pela terceira vez aos apoios, desta vez eram sustentados e conseguimos finalmente. Agora temos um apoio, mas que dura um ano, só. O que estou a tentar fazer com esse apoio é crescer ainda mais… (pausa) Porque eu não acredito em subsídio-dependência, de maneira nenhuma. Eu acho que o apoio tem que lá estar, é importante ter um apoio se realmente entenderem que o nosso trabalho é válido e que estamos a prestar algum serviço a Portugal e aos contribuintes, porque estamos. Aí, acho que merecemos ter algum apoio. Mas não temos de ser dependentes desse apoio, de maneira nenhuma. Eu nisso não acredito mesmo nada. Agora: é importante termos um fundo de maneio, porque estamos num meio difícil. Não é fácil vender, apesar de ser um “produto” com qualidade.

As pessoas hoje em dia querem coisas mais comerciais. Nós não fazemos isso. Eu não faço. Por isso, agora que temos o tal apoio, é conseguirmos continuar a crescer para, se o apoio desaparecer ou diminuir, nós termos a capacidade de manter as condições que temos agora. Porque os bailarinos que trabalham connosco têm condições de trabalho muito melhores do que tinham até há dois meses atrás, que foi quando o apoio veio.

Eu sinto um respeito enorme por eles, por isso a primeira coisa que fizemos quando recebemos o apoio foi melhorar as condições de trabalho, porque eles também apostaram muito no projecto e trabalharam muito na Companhia. Hoje em dia é tentar manter. É claro que estamos todos melhor, porque eu sinto-me bem por oferecer melhores condições de trabalho, mas o resto está tudo igual, não muda absolutamente nada. A luta é a mesma, não mudou nada. A única diferença é que eu próprio posso oferecer melhores condições de trabalho às pessoas da Companhia.

Voltando um pouco atrás, em relação a contribuir no crescimento de Portugal enquanto público de espectáculos de Dança Contemporânea, gostava que falasse um pouco da Academia de Dança, porque também promove a desmistificação desta área artística.

Exactamente. Nós estamos a ocupar um espaço, nos Recreios da Amadora, um espaço cultural com estúdios de dança. Passados dois anos desde nós lá estarmos, eu propus à Câmara rentabilizar o espaço ainda mais, dinamizando mais aquele espaço e tentar criar mais público, porque na realidade o que aconteceu foi isso mesmo: criar mais público e mais interesse pela Dança. Criámos uma escola que tem Dança acessível para todos, desde pessoas que já tiveram algum treino, pessoas que nunca tiveram treino nenhum e que querem só experimentar, ao final do dia querem descomprimir, fazer outra coisa, uma actividade diferente, com preços muito acessíveis porque contamos com o apoio da Câmara em termos de espaço. A Academia cresceu muito, o problema que estamos a ter é que está a crescer tanto que o espaço torna-se apertado (risos). Essa é uma questão que eu vou ter de colocar à Câmara e ver se eles equacionam termos outro espaço. Não sei. É uma situação que teremos de ver. Mas tem sido muito bom, porque nós temos tido um envolvimento em todos os aspectos, não só na área de espectáculos, mas na área da educação. Abrimos o leque todo e tem funcionado muito bem.

E acha que isso também se reflecte em termos de adesão aos espectáculos? Porque depois os alunos assistem e também passam palavra.

Isso é com toda a certeza! Eu vou dar-lhe um exemplo: nós temos lá na Amadora diversos espectáculos de Dança, da nossa Companhia mas não só. Eu vou a esses espectáculos, sempre que posso vou ver e quando olho à volta, vejo que a grande maioria das pessoas é da Academia. Isso é que é engraçado. Estamos a criar público para a Dança em geral e isso é que me interessa. O importante é isso, nós não estamos a trabalhar para nós. Quer dizer, para nós também, mas é para todos. É para a Dança em geral, é para a Dança Contemporânea, para não haver espectáculos com 20 pessoas, como eu vejo por aí.

E voltando um pouco atrás à pergunta que me fez há pouco, um dos cuidados que eu sempre tive e continuo a ter é ter alguém que, em termos artísticos, compre um bilhete para ver. Não é egoísta. Sem querer criticar ninguém, porque cada pessoa faz aquilo que entender e eu gosto de ver coisas diversas e respeito o trabalho dos outros.

Onde eu estou, pelo menos neste momento, tento criar algo que as pessoas tenham interesse em vir ver. Que venham e queiram voltar. A minha ideia é isso mesmo… sem ir para uma área comercial, sem deixar de ser honesto comigo próprio, mas tendo esse cuidado, sempre. Mesmo tendo uma ideia para uma peça, tenho sempre o cuidado (mesmo em relação a coreógrafos que venham de fora) de chamar a atenção para o facto de uma das razões pelas quais termos crescido é termos conseguido criar público a nível prático. É tentar pensar que as pessoas compraram um bilhete para nos ver, para ver a Companhia. Acho que é importantíssimo ter esse cuidado. Não só nesta área, mas na Arte em geral, que é muito intimista, “é para mim”; “eu crio para mim”. É um ponto de vista. Se fosse um projecto pontual, eu poderia fazer isso. Mas uma Companhia de dança, que chegue a um certo patamar, que tenha um nome e que tenha público, que seja reconhecida… Tem que criar um nome, uma marca, que seja reconhecível. E para lá chegarmos, temos que a ir construindo.

Porque dançar também é comunicar.

Exactamente!

Cria para si próprio, mas no fundo, ao emitir a mensagem, esta tem de chegar ao receptor.

Claro, é uma arte performativa. Isto é feito para alguém vir ver. O princípio é esse. Essa é uma das minhas grandes preocupações desde sempre.

Como se sente em relação às constantes manifestações de reconhecimento? Foi reconhecido primeiro lá fora e só depois em Portugal. Acha que o reconhecimento cá foi tardio? O Prémio dos Dance Awards apareceu na altura certa?

Portugal é um país um bocadinho difícil, porque o meio da Dança é muito fechado e quando nós começámos, fomos um pouco criticados, porque as pessoas não conheciam aquilo que estávamos a fazer, não conheciam o nosso trabalho, não sabiam quem éramos, então houve um certo distanciamento. Eu sinceramente, julgo que o reconhecimento veio um bocadinho tarde, na minha opinião. Pondo de parte todas as opiniões artísticas, o facto de ter conseguido criar uma companhia de dança de repertório, de raiz, ter sucesso, ter continuidade a nível nacional como internacional, devia ter sido reconhecido mais cedo. Se fosse noutro país qualquer…Outro qualquer, não. Se Portugal fosse um país nórdico, por exemplo, nós já estávamos 10 anos à frente. Garantidamente.

Porque o reconhecimento acaba por ser, na maior parte das vezes, simbólico. Não se reflecte em termos práticos.

É isso mesmo. As pessoas conhecem um pouco melhor o nosso trabalho, já sabem quem somos, no mundo da Dança já somos respeitados (como uma nova Companhia que está a ter muito sucesso) mas a nível prático (e apesar de termos actualmente um apoio considerável por parte do Ministério da Cultura) as coisas continuam exactamente na mesma (gargalhadas). Exactamente na mesma, a verdade é essa. A luta é sempre a mesma. Mas depois, há aqui um detalhe importante: por mais que continuemos a crescer, como crescemos sempre mais, a luta é sempre a mesma, o nível é sempre ali, no vermelho. A verdade é essa, acaba por acontecer isso. Eu e nós todos (Quórum Ballet) estamos a ter alguma dificuldade em, por exemplo, tomar decisões em termos de programação e em termos de calendarização da companhia, porque estamos a ter muitas solicitações, o que na verdade é muito bom. Agora temos o tal apoio, mas também temos encargos maiores, mas com condições que já deveriam existir há muito tempo. Eu vou usar este incentivo a nível financeiro para conseguir estruturar melhor a Companhia, para trabalharmos com condições mais próximas das ideais e crescermos para o próximo nível.

Em termos de futuro, o que é que sonha para a sua companhia?

O que eu queria e o que vai acontecer no futuro (porque eu vou continuar a trabalhar para isso) é ter uma Companhia que tenha a possibilidade, em termos financeiros, que tenha a liberdade de ter um elenco de 12 a 15 bailarinos (é o número mais ou menos ideal), com uma média de 15 a 20 espectáculos todos os anos, que tenha uma rede internacional, que é aquilo que eu estou a tentar criar. Nós já vamos muito para fora, já fomos a Singapura, à Dinamarca, Polónia, Nova Iorque, Macau, vamos agora ao Chipre. Fartamo-nos de viajar, mas eu quero mais ainda, porque para mim, uma Companhia e o trabalho que eu faço aqui em Portugal é contínuo. Gostava que o Quórum Ballet tivesse uma projecção internacional reconhecida, que só aconteceu com o Ballet Gulbenkian.

Então, é isso. A meta é essa. Por agora. Depois vai haver outra a seguir (gargalhadas).



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