JP Simões | Bloom | Entrevista
Bloom é o nome que marca a entrada de JP Simões numa nova fase da sua carreira. E esse foi o pretexto ideal para lhe colocar algumas questões, antes da apresentação do álbum, "Tremble Like a Flower", no próximo dia 9 de Fevereiro, no Lux.
Como surge Bloom?
Bloom floresce ao mesmo tempo que estas novas músicas. Essencialmente, a adopção desse nome serve para marcar um antes e um depois no meu trabalho.
O processo de composição e de produção de alguém com o background do Miguel Nicolau é, com certeza, muito diferente do teu. Como surgiu a oportunidade de colaborarem? Podes falar-nos um pouco sobre a experiência?
Conheci o Miguel há cerca de três anos, depois de um óptimo concerto de Memória de Peixe no festival Bons Sons. Fiquei desde então com vontade de fazer alguma coisa com ele e a oportunidade surgiu no início de 2015, altura em que tinha umas músicas novas e precisava de uma banda. Ensaiamos duas ou três vezes e depois parei o processo por achar que ainda tinha muito que definir na composição antes de apresentar aos músicos. Continuei a compor e, no início de 2016 tinha um álbum feito, de guitarra e voz, pronto para ser arranjado e pré-produzido. O Miguel embarcou na aventura e durante 6 meses trabalhamos juntos nos arranjos e na produção: foi um tempo surpreendente e mágico e a música cresceu e expandiu-se por paisagens inesperadas graças essencialmente à mestria do Miguel Nicolau em ler as minhas intenções e traduzi-las com enorme talento e imaginação. Até agora foi a melhor parceria da minha vida em todos os aspectos e espero poder continuar a contar com ele para o que aí vem.
A inspiração surge muitas vezes dos sítios ou das pessoas (aparentemente) mais improváveis. Por exemplo, os arranjos dos sopros foram influenciados pelo som do saxofone de Donny McCaslin. Como é que isso aconteceu?
Blackstar é um disco assombroso e absolutamente contemporâneo, que é algo difícil de dizer de caras quando falamos em álbuns de canções. Entre muitas coisas, a harmonia e espacialidade dos sopros do Donny McCaslin nesse disco foi um ponto de referência imediato para o nosso trabalho. Depois, cada um de nós foi propondo esta ou aquela referência para determinado tema ou parte de tema, basicamente como pontos de partida para expandirmos cada uma das canções para o espaço certo. Foi um processo muito claro e honesto e bem referenciado, tanto que partilhámos sempre um imenso entusiasmo quando percebíamos que determinado tema já não se parecia com as referências que lhe serviram de ponto de partida: que o resultado era uma síntese nossa e que aquela começava a ser verdadeiramente a nossa nova música!
No press release é dito que as composições do disco se basearam num blues mais primordial e na folk dos anos 60, com uma referência explícita aos nomes de Dylan, Cohen e Nick Drake. Dylan foi um inesperado prémio Nobel da Literatura e Cohen deixou-nos sem qualquer aviso. O que é que as canções destes senhores têm, para ti, que as torna únicas? E de que forma é que sentes que elas te influenciam o teu trabalho?
A música que influenciou mais directamente a composição dos temas em guitarra tem alguns nomes bem precisos: Robert Johnson, Nick Drake, Norberto Lobo, Jim O’Rourke e Tinariwen. Dylan e Cohen são referências pela mestria da escrita e o prémio Nobel para o Bob Dylan não me parece nada desajustado do âmbito da literatura, muito pelo contrário creio que uma canção bem escrita pode sintetizar um romance de 800 páginas e ser menos aborrecida, havendo imaginação da parte dos leitores/ouvintes claro. Creio que o trabalho de qualquer músico ou escritor é naturalmente nutrido por tudo o que este admira: todos esses senhores ensinam-nos a pensar, falar e cantar, ao mesmo tempo que nos sugerem que devemos procurar a nossa própria voz.
A bossa nova faz parte de ti, das tuas canções. É algo que te torna imediatamente reconhecível e que arranca facilmente um sorriso de quem escuta as tuas canções. Esse toque também está presente nestas canções. Foi algo deliberado ou aconteceu naturalmente?
A Bossa Nova, o Samba, a MPB, foram referencias fortes numa fase do meu trabalho autoral. O que ficou mais vincado desse tempo foi um certo modo de abordar a guitarra e a voz que, mesmo neste disco que está fora desses géneros musicais, se mantém residualmente presente. Daí que creio que aconteceu naturalmente.
E para terminar… Porquê “Tremble Like a Flower”?
O último tema que fiz para este disco foi já depois do anúncio da morte de David Bowie e ocorreu-me escrever sobre os dois personagens da canção Starman: o que seriam agora, 40 anos depois, esses dois pré adolescentes que testemunharam a presença do homem das estrelas e partilharam a sua sabedoria e liberdade? Entretanto, essa frase imortalizada no tema Let’s Dance, “tremble like a flower”, saltou de repente como um refrão para história que eu estava a tentar contar: mesmo com o espírito jovem e com a mesma excitação pelo misterioso lugar onde a vida acontece, o tempo passa e a nossa frágil condição faz-nos estremecer. Por fim percebi, pelos motivos atrás descritos, que esse seria o título do disco.
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