Festival Sudoeste

O que aconteceu no Alentejo? As tendas, o ambiente e o recinto. Tudo aquilo que se passou fora dos palcos.

Já está. Acabou. Depois de quatro dias de algum pó, muito calor e ainda mais música, o Festival Sudoeste fechou as portas da sua nona edição que ficou marcada pela enorme adesão de público que se fez sentir durante o certame (cerca de 120 mil pessoas), mas que teve o seu epicentro no Sábado, nas actuações de Humanos e Ben Harper. Existe muito para contar destes quatro dias de Sudoeste. Fiquem com uma visão diferente daquilo que se passou na Herdade da Casa Branca, nos dias 4,5,6 e 7 de Agosto, bem pertinho da Zambujeira do Mar.

Embora o prato principal de um festival de Verão seja a música ao vivo, é importante relatar tudo aquilo que rodeia um evento deste nível. Esperamos que quem não esteve no Sudoeste alentejano, consiga perceber o ambiente, as condições do recinto e campismo, as falhas e méritos da organização e, obviamente, as actuações ao vivo que vieram comprovar que quantidade não é sinónimo de qualidade.

Nesta primeira parte, vamos focar-nos nas condições do espaço, nas pessoas e no ambiente do festival.

CAMPISMO – Vira o disco e toca o mesmo

Já lá vão nove anos. Quase uma década de edições do Sudoeste. Tempo suficiente para criar infra-estruturas com condições para quem acampa ao lado do recinto. Se é verdade que não podemos comparar o estado do “parque de campismo” desta edição com os primeiros anos de festival, também é verdade que as melhorias nestes últimos anos têm sido muito pouco visíveis.

Para quem nunca lá esteve, passo a explicar. O espaço reservado para o campismo fica mesmo ao lado do recinto. Ao entrar, do lado esquerdo, estavam instalados vários serviços do patrocinador oficial, bem como alguns locais de venda de comida e as famosas casas-de-banho. Do lado oposto estavam as tendas. Oito mil tendas.

A luz existente no “parque”  ilumina apenas alguns trilhos principais. Todas as tendas que se encontram dos dois lados do trilho ficam completamente às escuras, transformando a lanterna num dos bens mais preciosos de sobrevivência. O ambiente é excelente. Encontramos pessoas de todo o país, que orgulhosamente indicam as suas raízes através de cartazes e panos. Pelo meio das tendas existe um mercado paralelo de venda de artesanato, de extensões para o cabelo e, claro, de droga. O haxixe já se tornou o tabaco de muitos. Não vale a pena tentar esconder e ignorar. Talvez o melhor seja mesmo legalizar.

Um dos principais problemas do campismo no Sudoeste é a falta de caixotes de lixo, bem como uma recolha mais regular. Depois de quatro dias de festa, muito álcool e pó, o parque praticamente se transforma numa grande lixeira. É claro que cabe a cada um manter o seu espaço limpo, mas a verdade é que essa não é a preocupação da grande maioria dos presentes.

Os chuveiros, casas-de-banho, lavatórios e afins, provaram mais uma vez ser insuficientes para a enchente anual de festivaleiros. Depois de tantos anos, o espaço merece uma infra-estrutura “fixa”, uns balneários a sério e um rápido acesso à água. O preço dos bilhetes pode subir, é normal que tal aconteça quando as condições oferecidas melhoram substancialmente. Penso que uma grande maioria das pessoas não se importava de pagar mais 5 ou 10 euros se soubesse que iria encontrar outras condições. Se o objectivo é tentar aproximar o Festival Sudoeste a outros da península ibérica, é melhor começar a pensar seriamente nesse aspecto.

AMBIENTE – Encontro de gerações

O Festival Sudoeste é de todos o que apresenta uma maior diversidade de público. Existem aqueles que se deslocam à Zambujeira quase só pela música, outros  querem apenas aproveitar o sol e praia e não ligam quase nada a quem está em cima dos palcos e ainda existem aqueles que nem precisam de sair do parque de campismo para curtir o festival.

Com o passar dos anos, começa a existir uma história de festivais, um passado. Estamos naquela fase de transição onde existe uma mistura entre os habituais festivaleiros, que já têm alguns anos destas andanças e o pessoal mais novo, que ansiosamente esperou os anos necessários para que os pais os deixassem sair de casa e viver esta experiência.

A primeira “espécie” de sudoestianos (os da velha guarda) pode também dividir-se em dois géneros bastante distintos. Muitos são aqueles que acham que o espírito do festival é vivido no campismo, onde o sentimento de partilha é notório. Todos os anos regressam, acompanhados pela sua tenda, garrafões de vinho e a pedra de haxixe. O outro género de habituais frequentadores do Sudoeste é aquele que já passou pelo campismo, mas que agora prefere a comodidade de uma cama e um duche quente. Não querem perder nada do que se passa no festival, gostam das bandas, interessam-se pela música e todos os anos recebem um “chamamento” quase divino que os arrasta até à Zambujeira.

Mas existe uma nova geração. A faixa entre o 17 e os 21 anos. Muitos estão nestas andanças pela primeira vez. Vestem a roupa da moda (mais elas que eles), preocupam-se com a maquilhagem e com a aparência. O parque de campismo estava repleto de óculos da Versace, roupa da Diesel ou da Pepe Jeans e todo o tipo de acessórios de quem quer estar na “moda”. Afinal, o festival é um acontecimento social e todos querem ver e ser vistos. Não me parece mal.

O ambiente esteve excelente, dentro e fora do festival. Existe uma cumplicidade intrínseca entre todos os que se deslocam ao certame. Durante quatro dias, parece que existe uma irmandade, distinguida dos demais pela pulseira (este ano amarela), que invade toda a costa alentejana e cria um enorme grupo. É esta a magia de um festival de Verão. É este o espírito do Sudoeste.

O RECINTO – Que tal um autocarro?

Grande. Muito grande. Ainda maior. Ao entrar no recinto existe uma sensação de enormidade. Lá bem longe estava o palco principal, ladeado de dois ecrãs gigantes enfiados numa enorme tela que, durante os concertos, passava diferentes imagens, colorindo o ambiente. Do lado direito, logo à entrada, ficava situada a Tenda Planeta Sudoeste, que à primeira vista parecia pequena para a quantidade e qualidade de artistas que estavam programados, mas que afinal serviu muito bem para a grande maioria dos espectáculos. Do lado esquerdo encontrávamos o Palco Positive Vibes, dedicado exclusivamente ao reggae e que foi uma das melhores apostas por parte da organização.

O espaço que separava os palcos era enorme e muitas vezes ouvia-se expressões do género: “Se houvesse uma passadeira rolante era lindo”; “Porque não metem aqui uns autocarros a fazer o trajecto?”. A excelente programação do palco “secundário” obrigava os interessados a algumas caminhadas que totalizaram largos quilómetros após quatro dias repletos de música.

Ao contrário de passadas experiências em festivais de má memória, os postos de venda de comida e cerveja chegaram para a procura e as casas-de-banho que estavam um pouco espalhadas pelo recinto deram conta do recado, sem que o tempo de espera ultrapassase o razoável.

Mesmo a meio do recinto encontravam-se os habituais locais de venda de “tralha” e do lado esquerdo estavam instaladas todas as “caravanas” dos patrocinadores com a habitual animação de um festival, entre os quais os concorridos “Sapos de Choque”.

Como sempre, o verde inicial da relva foi-se desgastando e a nuvem de pó característica foi crescendo com o passar dos dias. Afinal, o Sudoeste não é o mesmo sem o pó preto no nariz.

Anunciou-se um mar de música: mais de 60 bandas e artistas, muitas horas de concertos e dj sets, sons para todos os gostos, bem como estreias em absoluto em Portugal e alguns nomes habituais. De tudo aquilo que passou pelos três palcos do Festival Sudoeste, fiquem com os nossos destaques, as nossas desilusões e as grandes surpresas dos 4 dias de festival.

4 de Agosto – Quinta-Feira – Enchente e desilusão

Não nos levem a mal pelo título que escolhemos para este dia. A nossa desilusão nem sequer actuou. Ainda a caminho do recinto recebemos a notícia que Fisherspooner tinha cancelado a actuação prevista para a Tenda Planeta Sudoeste. Motivo: o material cénico não foi enviado a tempo. Felizmente que os Ladytron não nos deixaram…

Foi com um recinto muito bem composto que o Festival do Sudoeste arrancou com as actuações dos Júnior (vencedores da Garage Sessions da TMN) e dos Expensive Soul, estes últimos com uma prestação muito bem recebida pelos inúmeros fãs que compunham a plateia do palco principal.

Enquanto os brasileiros da Orquestra Imperial tentavam animar as hostes, o Palco Planeta Sudoeste recebeu um dos fenómenos mais extraordinários dos últimos tempos em Portugal: Os Gato Fedorento. Foi praticamente impossível assistir aos sketches devido à enorme quantidade de curiosos e fãs que enchiam e “transbordavam” a tenda onde estava instalado o palco Planeta Sudoeste. “Olha o Kunami fresquinho ….”, era gritado por todos em uníssono, numa demonstração inequívoca que o Gato Fedorento é um dos maiores hypes dos últimos tempos.

O final da noite no palco principal esteve a cargo de dois nomes que motivaram a viagem de muitos ao Festival Sudoeste: Patrice e Sean Paul. Embora um pouco melodioso demais, Patrice conseguiu captar a atenção, principalmente quando evocou Bob Marley em “No Woman, No Cry”, a fórmula certa para pegar numa audiência. Sean Paul foi muito fraquinho. Monótono, arrogante e com um bolso cheio de clichés MTVianos, não conseguiu agradar nem mesmo os seus fãs.

Como grande parte das melhores actuações do festival, o mais interessante concerto da noite teve lugar no Palco Planeta Sudoeste. Os Ladytron estrearam-se em Portugal perante uma plateia bem composta, que dançou ao som de um dos projectos mais interessantes e coesos do apelidado electro rock. Com uma base sonora bastante forte e duas vozes femininas interessantes, Mira Aroyo e Helena Marnie, o projecto de Liverpool encheu a tenda de glamour e rock, numa actuação mais bem pesada do que aquilo que se podia pensar. Com um álbum novo praticamente prestes a ser editado, “Witching hour”, os Ladytron são uma das bandas que merecem a nossa atenção nos próximos meses.

5 de Agosto – Sexta-Feira – Oh Yeah !!

O fim de tarde/princípio de noite de Sexta-Feira reservou-nos um dos momentos mais sublimes da edição deste ano do Sudoeste. Uma das coqueluches do movimento folk e songwriter por excelência, Devendra Banhart, surgiu no festival acompanhado por uma banda “à medida” e encantou todos os presentes. Com um alinhamento composto maioritariamente por canções do seu novo álbum, “Cripple Crow”, a editar em Setembro, Devendra mostrou-se bastante à-vontade em palco. “This beard is for Siobhan” do álbum “Rejoicing in the hands” foi um dos momentos mais aclamados da actuação onde ainda houve tempo para uma versão de “Do Wop (That Thing)” de Lauryn Hill, que surgiu como uma cereja em cima de um bolo. Ficamos à espera de “Cripple Crow”, que promete ser um dos excelentes discos deste ano.

Enquanto o palco principal estava a cargo das escolhas mais comerciais do festival, com o hip-hop do canadiano K-OS e o espectáculo-sempre-igual dos Da Weasel, os Maximo Park apresentavam-se pela primeira vez ao público português. O disco que trouxeram ao Sudoeste, “A Certain Trigger”, funciona bastante bem ao vivo e a banda apresenta um som e uma postura entre os The Hives e Franz Ferdinand, cheios de energia e com vontade de colocar todos a dançar. Com um alinhamento bastante inteligente e munidos de um excelente single, “Graffiti”, os Maximo Park foram uma das boas surpresas de todo o festival.

O clima estava electrizante. O público aguardava pacientemente o início da actuação enquanto o perfeccionismo de James Murphy dava os últimos retoques ao som e garantia que tudo estava preparado para o grande momento da noite de Sexta-Feira. Desde os primeiros acordes de “On Repeat”, até ao clímax de “Yeah”, os LCD Soundsystem estiveram irrepreensíveis e deixaram no ar abafado da tenda do Palco Planeta Sudoeste um clima de verdadeiro delírio a pedir um encore que não aconteceu.

Depois de dois concertos marcantes no Lux e um na Casa da Música, a passagem dos LCD pelo Sudoeste foi ainda melhor. A set list foi a mesma, “Daft Punk is playing in my house” foi de novo transformado em faixa punk rock, “Tribulations” foi recebida em total loucura e não faltou o falsete final. É incrível como James Murphy consegue manter os “berros” do princípio ao fim do espectáculo e ao mesmo tempo estar preocupado com o som dos outros instrumentos e pormenores que podem prejudicar a sua prestação. Já não estamos na presença de um hype mas sim de músicos com muita qualidade e que estão a ditar as regras da nova música electrónica mundial.

O concerto dos LCD marcou o início de uma noite completamente dedicada à DFA Records, por onde passaram alguns dos nomes mais importantes da editora nova-iorquina, intercalados por dj sets. Os ilustres convidados que se seguiram foram os Black Dice, mas o radicalismo sonoro e o experimentalismo electrónico eram difíceis demais para absorver depois de uma hora de pura energia ao som dos LCD.

Ao sair da tenda onde esteve instalado o Planeta Sudoeste ouvir os acordes dos Oasis foi o mesmo que entrar numa máquina do tempo e recuar dez anos atrás. Enfadonhos, monótonos, sem qualquer chama, a banda dos irmãos Gallagher está igual a si própria, continua a apostar num brit pop demasiado datado, sem grandes novidades e rasgões de génio. Se não fossem aquelas musiquinhas que todos cantarolaram como por exemplo “Champagne Supernova” ou “Wonderwall”, a passagem dos Oasis pelo Sudoeste quase nem se notava.

Quem também se pode queixar da actuação morna do Oasis são os Kasabian, que tiveram em mãos a difícil tarefa de encerrar o palco principal após o “enterro” de grande parte da plateia. Não estiveram brilhantes na tarefa apresentada. Uma postura bastante rígida em palco, bastante presos de movimentos e um alinhamento pouco feliz, fizeram do concerto dos Kasabian um dos momentos menos positivos do festival, pois veio contrariar as expectativas que foram criadas em torno do disco. Mesmo assim, o concerto ainda teve passagens bastante interessantes, como por exemplo o excelente “Processed Beats”, e a finalizar os dois singles da banda: “Club Foot” e “L.S.F (Lost Souls Forever)”. Valeu o profissionalismo.

Este foi também o dia em que o palco Positive Vibes iniciou a sua programação. Durante os três dias, houve um festival de Reggae dentro do festival Sudoeste e a afluência de público foi notável, demonstrando o interesse que este género musical está a suscitar nas diferentes camadas sociais. Em frente ao palco encontrávamos surfistas e t-shirts da Tommy misturadas com as rastas e as roupas coloridas dos seguidores de “Jah”. Sem dúvida que esta foi uma aposta totalmente ganha por parte da organização.

A noite terminou em festa no showcase da DFA, com os ecléticos sets de Markus Lambkin e Tim Sweeny, bem como com as actuações da dupla Delia & Gavin e a nova coqueluche da editora, The Juan Maclean.

6 de Agosto – Sábado – It’s the nightime baby …

Com a noite de Sábado chegaram milhares de pessoas. Aos festivaleiros de quatro dias juntaram-se os curiosos que foram à Zambujeira para ver os Humanos ou Ben Harper. Foi o dia mais caótico de todos e aquele que se prolongou até de manhã com as escolhas duvidosas de Fat Boy Slim. Felizmente que houve muito mais para ver e ouvir.

A programação do Palco Planeta Sudoeste começou bem cedo, às 17 horas, com a actuação dos Factor Activo que bem se esforçaram para manter ocupados os poucos que deambulavam pela tenda. Melhor sorte teve Sagas que, acompanhado por Nel Assassin, conseguiu encontrar as primeiras reacções do dia. Depois do hip-hop, a tarde dedicada aos portugueses terminou com o jazz electrónico dos Hipnótica que continuam em boa forma.

No palco principal, os The Thrills tiveram as honras de abrir a noite que se esperava longa. Com um número reduzido de pessoas em frente ao palco, a banda foi bastante profissional e certa mas não teve a atenção que merece. Fica para a próxima. Donovan Frankenreiter foi o Jack Johnson de serviço. Embrulhado no pacote “Ben Harper”, o músico cumpriu mas não deslumbrou.

Pouco passava das 22 horas, quando Josh Rouse e a sua banda deram início ao concerto da noite. Depois de uma passagem molhada e atribulada por Paredes de Coura o ano passado e um concerto a solo no Fórum Lisboa, este seria o momento ideal para mostrar ao público português que a sua música é muito mais que um cantarolar engraçado que fica no ouvido.

Com um enorme sorriso estampado na cara e com uma tenda bastante composta, Josh Rouse apresentou um alinhamento em estilo de best of. Começou com “Nashville” e os dois singles do álbum, “It’s the nightime” e “Winter in the Hamptons” para depois fazer um ping pong entre este seu último registo e o aclamado álbum anterior, “1972”.

Foram temas como “Come Back” e “Love Vibration” que levaram ao rubro todos os presentes e deixaram o músico bastante satisfeito com o feed back do público. Todas as faixas de Josh Rouse são de uma simplicidade lírica notável, que são transpostas ao vivo de uma forma praticamente perfeita. A presença da banda em palco dá uma outra dimensão à sua música e nem mesmo um ou outro erro, num ou noutro acorde, foram suficientes para beliscar a excelente actuação de Josh Rouse, que infelizmente não acedeu ao pedido do público e não regressou para o encore tão desejado.

Embora a existência de uma programação paralela, em três diferentes palcos, traga muitas vantagens a nível da diversidade necessária num festival de Verão, existe sempre o dilema da escolha, quando dois concertos se sobrepõem. Foi isso mesmo que aconteceu. Para assistir a Josh Rouse, perdeu-se grande parte da actuação dos Humanos. Mesmo assim, pudemos comprovar a grande receptividade do público ao espectáculo cénico e musical do grupo composto por Camané, Manuela Azevedo e David Fonseca, que terminou em grande com a popular “Maria Albertina” cantada em coro por todos os presentes. São grandes mas não são Variações.

Depois veio a maior “seca” do festival. Para gáudio de muitos fãs, Ben Harper apresentou-se em palco com as músicas do costume, com a postura do costume, com a banda do costume e com uma monotonia que já não há pachorra para aturar. Tendo sido este o seu único espectáculo neste Verão, mais valia ter ficado em casa a descansar ou talvez a compor novos temas, em vez de ter banalizado ainda mais aqueles que já foram temas emblemáticos de uma geração. Sem dúvida que a organização ganhou bastante com a presença de Ben Harper no Sudoeste. Quem não ganhou foi o festival.

Enquanto a maratona do palco principal teimava em não acabar, houve tempo para ouvir as novas propostas da vocalista dos Lamb, Louise Rhodes, que veio apresentar o seu projecto a solo. Acompanhada por excelentes músicos e por diversos instrumentos (violino, guitarra, percussão, violoncelo), a voz angélica dos Lamb parece querer mostrar o seu lado mais íntimo e lírico. Um concerto interessante, baseado no seu novo trabalho, mas onde não faltou “Gabriel”, uma música que a própria admitiu “ter saudades” de interpretar ao vivo.

Ainda com o Benny a tocar, não havia outro remédio senão espreitar a prestação de Mylo que é mais um caso de popularidade da MTV e que encheu por completo a tenda do palco Planeta Sudoeste. “Destroy Rock & Roll” é o disco metáfora do escocês que teve o mérito de pôr todos a dançar, embora a sua actuação se tenha tornado monótona com o decorrer do espectáculo. Nada que não estivesse nos planos dos mais precavidos.

O resto da noite ficou marcado pela música electrónica em formato mais comercial no palco principal e alternativo/depravado no palco Planeta Sudoeste. Os Underworld continuam a viver às custas de “Born Slippy” e dificilmente irão encontrar um caminho diferente (embora o esforço tenha sido meritório). Fat Boy Slim continua a apostar nos sets de dj onde a sua música não tem lugar. Não se percebe como um dos produtores mais apelativos da última década não passa o seu próprio som (tirando uma ou outra curta passagem), mesmo quando tem um “interessante” álbum novo no mercado. Deve ser mania.

Na tenda “alternativa”, Peaches mostrava o seu espectáculo pornográfico e quase grotesco. Sozinha em palco, com uma base musical, a canadiana fez da tenda onde estava o Palco Planeta Sudoeste um autêntico cabaret, recheado de um electro rock que já não “cola”. O momento mais interessante da actuação foi o dueto com Iggy Pop (que surgiu no ecrã) em “Kick it”. De resto foram só orgasmos fingidos.

Os Dezperados fecharam a programação da “tenda” com o set explosivo a que já nos habituaram durante os últimos tempos no Lux. O ambiente era mais alcoólico e possivelmente mais alucinado. Melhor ainda. Foi dançar até praticamente de manhã.

7 de Agosto – Domingo – A revolução ressacada

Todos os anos é a mesma coisa. Depois de três dias de concertos, milhares de litros de cerveja, três noites a “tentar” dormir na tenda e três dias de praia, a energia de quem ainda quer curtir mais uma noite já não é a mesma. Mesmo cansados e ressacados, foram muitos que presenciaram a mais uma noite de Sudoeste e que tiveram a oportunidade de assistir a uma das actuações do festival: The (International) Noise Conspiracy.

Os Vicious 5 e os d3ö (não se percebeu o que estiveram lá a fazer os Mata Tu, Patron!) foram excelentes “bandas de suporte” para a melhor actuação nacional do festival, os Wray Gunn. Numa fase em que estão em alta no estrangeiro, a banda de Paulo Furtado e companhia encontra-se em grande forma e o concerto do Sudoeste veio comprovar isso mesmo.

Prestes a partir em digressão por Inglaterra e França, a banda mostrou todo o seu potencial musical de fusão blues/rock e Paulo Furtado evidenciou a sua postura de entertainer e front man, tendo até escalado a estrutura de iluminação do palco (algo que só Peaches se atreveu a fazer). A actuação dos Wray Gunn deixou todos os presentes completamente electrizados e ainda houve tempo para um excelente “dueto” com Tony Fortuna, vocalista dos d3ö.

Depois dos Athlete e dos Doves terem aborrecido os presentes em frente ao palco principal (os últimos até não são maus mas não se adequam ao palco principal), surgiu o verdadeiro momento histórico do festival. Embora tenha que ser prestada uma homenagem à importância dos Dinosaur Jr. na música mundial, principalmente à vertente indie rock, a sua presença no cartaz do Sudoeste antes dos Korn estava rotulada de fracasso. Se juntarmos a este erro de programação um alinhamento “difícil”, onde não fizeram parte algumas das músicas mais melodiosas da banda, o concerto passou ao lado de muitos que não faziam a mínima ideia do que se passava em cima do palco. O melhor mesmo é comprarem os discos que acabaram de ser reeditados e esperar que os Dinosaur Jr. regressem a Portugal para um concerto “a sério”.

Onde não houve problemas de “casting” nem de público foi no concerto dos The (International) Noise Conspiracy (TINC), o melhor momento da última noite do festival. Depois de terem estado programados para uma actuação em Portugal há 3 anos atrás e terem cancelado o espectáculo devido a um erro na marcação dos voos, os “revolucionários” suecos estrearam-se em território luso da melhor forma possível.

Politicamente incorrectos, anti-capitalistas e com uma energia inesgotável, os TINC deram um espectáculo que ficará na memória de quem viu. Praticantes de um som às vezes primitivo, onde impera o rock & roll, a banda que veio do frio mostrou ser muito quente em palco e incendiou a plateia que estava repleta de fãs. Citações a Che Guevara e o incentivo ao download de músicas e filmes em prol da luta contra o sistema, marcaram um concerto “político”, onde o partido que verdadeiramente dominou foi o da música e do rock & roll e que terminou com o excelente “Armed Love”, o tema que também dá nome ao último disco da banda.

A fechar o palco Planeta Sudoeste, a dupla Alison Mosshart & Jamie Hince, aka The Kills, veio mostrar que a actuação no ano passado em Paredes de Coura foi mesmo um acidente de percurso. Com disco novo na mala o projecto electro/rock/qualquer coisa entreteve os presentes com uma actuação bastante segura, muito cénica, onde os dois contracenam bastante bem. Não foi tão explosivo como alguns podiam estar a esperar, mas foi bastante interessante e mobilizador.

Depois da actuação dos Korn, que nos passou ao lado, os Basement Jaxx fecharam a programação do palco principal, naquela que foi a melhor actuação “dançável” do festival, terminando em beleza quatro dias de festividade.



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