Festival Vilar de Mouros| Dia 3 (25.08.2018)
Os dois dias anteriores foram longos e isso mesmo se percebe no cansaço espelhado nalgumas caras e na quantidade de pessoas que esperam em fila pela oportunidade de comprarem um café de forma a recarregar baterias para o muito que ainda falta do festival.
Os mais resistentes e os que se estreiam hoje no festival “arriscam” fazer o circuito cronometrado num insuflável gigante que ocupa uma parte importante do recinto e que no dia anterior registou os recordes dos mais afoitos a completar os desafios até à saída.
Foram as letras melódicas de Luís Severo que primeiro se ouviram neste dia num recinto ainda bastante despido de público. O músico teve a forte concorrência de um derby lisboeta de futebol que por certo atrasou a chegada ao recinto de muitos dos festivaleiros facto que o próprio lembrou ao agradecer aos presentes “por terem optado pela sua música preterindo o futebol”. O franzino Luís Severo demonstrou ter musicalidade para dar e vender e cantou, entre outras, músicas como “Boa Companhia”, “Escola”, “Cara D’Anjo” e “Amor de Verdade” para gáudio dos fãs presentes. Como único representante luso neste último dia de festival, Luís não defraudou as expectativas e mostrou que não é por acaso que tem marcado presença em muitos festivais e que o seu último álbum ‘Luís Severo’ foi considerado por vários meios especializados o melhor disco de 2017.
Ainda o sol brilhava quando subiu ao palco uma lenda viva da música ou não fosse John Cale de 76 anos um dos fundadores dos Velvet Underground. Nos últimos anos o músico abrandou a quantidade de trabalhos em nome próprio e apostou mais em inúmeras colaborações com artistas como Nick Drake, Brian Eno, Happy Mondays, Patti Smith ou LCD Soundsystem, entre muitos outros. É um fã da solidão do estúdio e por isso raras vezes aparece em público. Talvez este fator explique alguma falta de energia na sua atuação que foi competente mas sem deslumbrar. O tema do álbum Fear de 1974, “Fear (is a man”s best friend)”, foi talvez o momento em que esteve mais próximo do público.
Muito se esperava dos “senhores” que vinham a seguir, os Los lobos são detentores de êxitos capazes de ocupar todo o espaço temporal que tinham para preencher e com isso satisfazer os muitos presentes que assim esperavam que fosse. Esperavam mas não foi, e tudo porque a banda americana com raízes mexicanas decidiu que não era dia para tal e mostrando em vários momentos do seu concerto que estavam ali apenas para cumprir calendário fosse pelas expressões de aborrecimento que demonstravam fosse pela notória falta de comunicação com o público que decidiram brindar com um conjunto de temas desconhecidos (da maior parte dos presentes) tocados num registo muito morno e longe da imagem de marca da banda. Salvou-se o tema final “La Bamba” que apesar de ser maioritariamente cantado num registo à capella de qualidade sofrível teve o dom de “acordar” um pouco os presentes talvez porque tudo que o antecedeu tinha sido muito mau. Sem dúvida alguma uma das (poucas) desilusões do festival.
Depois do “inferno” dos Los lobos foi preciso recorrer a dEUS para voltar a levar o público presente de volta ao “céu”. A banda belga liderada por Tom Barman que há muito se apaixonou por Portugal e acabou por comprar casa em Sesimbra sempre teve da parte do público luso o carinho especial de quem compreende o seu trabalho e mais do que isso que aprecia usufruir do mesmo. O público quer e dEUS dá…temas exuberantes com uma musicalidade crua e áspera com o fio condutor que é a voz impar e melodiosa de Barman. Excelente equilíbrio e presença em palco não deixaram os créditos por mãos alheias e deram sem dúvida alguma um dos melhores concertos que a Vila já viu e onde se ouviu temas como “Nothing Really Ends”, “Instant Street”, “Roses”, “The Architect” fechando com um memorável “Suds&Soda” que levou o público ao delírio.
Se dEUS levou o público ao “céu” os sete “rapazes” de Manchester encaminharam todos os presentes para o “paraíso”. Como dizia uma das muitas pessoas a assistir ao concerto “é impossível não gostar de James” e na realidade o público português não só gosta como gosta mesmo muito e prova disso foram os 32 concertos já realizados no nosso país e a enchente que marcou presença em Vilar de Mouros neste último dia muitos dos quais pelo apelo de verem James uma vez mais mais. Se na edição deste ano do Rock in Rio tinham tocado à hora errada em Vilar de Mouros o momento não podia ser mais perfeito. Os James foram a antítese dos Los Lobos, alegria, comunicação, energia e acima de tudo paixão…muita paixão. Maior proximidade com o público é impossível, uma vez que Tim Booth passou grande parte do tempo no meio do público. Iniciou o “crowdsurfing” em “Getting Away With It (All Messed Up)” e quando regressou ao palco apelou “Não ponham os telemóveis na minha cara senão não vou voltar”. Havia de voltar ao seio do público em “Curse Curse” mas os telemóveis não pararam e por isso a partir daí o contacto fez-se através das grades e apenas com as pessoas que ocupavam as filas da frente. Foram misturando, e bem, temas de êxitos firmados como “Sit Down”, “Tomorrow”, “Laid” misturados com temas do novo álbum como “Many Faces” que pelo coro que o acompanhava já é bem conhecido dos presentes. No final um encore onde Tim Both disse que podiam optar por divulgar duas músicas do novo álbum que apelidou de “bloody wonderfull” mas que não era necessário porque tinha a certeza que o álbum era tão bom que o público português o ia ouvir de certeza. Assim sendo arrancaram o encore com “Out to Get You” que talvez tenha sido a música menos “acarinhada” pelo público a que se seguiu “Sometime” que foi sem dúvida alguma a cereja em cima do bolo com todo o público a cantar em uníssono e alguns corpos a imitarem o estilo tão descontrolado e característico de Tim Both. James demonstram como poucos serem os verdadeiros animais do espectáculo com uma maturidade e presença exemplar em palco, onde comunicam constantemente com o público com quem nalguns momentos se fundem num só.
Já passavam das três da madrugada quando perante um recinto, como se esperava, mais vazio mas ainda assim bem vestido por um público marcadamente mais jovem e com um “sotaque” que os denunciava como tendo vindo do outro lado da fronteira que os Crystal Fighters coloriram o palco com os seus muitos adereços para terem honras de encerramento da edição deste ano do festival. A banda cujas raízes se dividem entre Espanha e Inglaterra mostraram de forma eficaz e visualmente apelativa uma anarquia visual em palco acompanhada por músicas psicadélicas de matiz eletrónica mas com muito influencia folk. O público não ficou indiferente a músicas como “LA Calling”, “Boomin’ In Your Jeep” ou “Love Natural” e dançou…dançou e dançou até não restarem energias. Aposta ganha da organização…bela maneira de fechar os três dias de festival.
O festival segundo o responsável pela organização Diogo Marques “está vivo e bem vivo” e ultrapassou a barreira dos 30 mil festivaleiros contra os 26 mil de 2017 e já tem três bandas fechadas para a próxima edição (por enquanto não divulgadas) que irá decorrer nos dias 22, 23 e 24 agosto e onde voltará a contar com o mesmo patrocinador principal e com o apoio oficial da Câmara Municipal de Caminha e da Junta Freguesia de Vilar de Mouros.
Texto por José Graça e fotografia por Maria Inês Graça.
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