F(r)icções de Nuno Duarte e João Sequeira

F(r)icções

Uma edição de luxo com argumento de Nuno Duarte e traço de João Sequeira.

É preciso valorizar o trabalho de Nuno Duarte enquanto argumentista de BD (e não só), nem que seja pelo simples facto de conseguir manter um ritmo contínuo de publicação. No mínimo podemos contar com um livro seu por ano, o que, tendo em conta o mercado português (que mercado? Gritou alguém ao meu lado), é mesmo muito bom. Apesar da casa mais corrente do autor ser a editora “Kingpin Books” o seu mais recente projecto chega-nos pela “El Pep” que em 2014 tem mostrado um novo fôlego, sublinhando a sua presença e importância no panorama da BD nacional.

Desta vez, Duarte aliou-se a João Sequeira, um nome que chamou a atenção após o lançamento do seu primeiro livro – juntamente com Miguel Costa Ferreira – “Psicose”, também ele editado pela “El Pep”. Neste “F(r)icções”, além do duplo sentido no título, denotamos logo que o traço de Sequeira é mais regular ao longo do livro e, em alguns casos, mais sóbrio, algo que faz todo o sentido tendo em conta que “F(r)icções” não é um livro tão enlouquecido e dado à experimentação como “Psicose” o era – ainda que tenha a sua quotaparte. O traço deve ser aquilo que a história pede e Sequeira tem isso em mente em cada capítulo, não deixando, mesmo assim, de continuar a explorar as suas potencialidades enquanto desenhador e mantendo um grau de inventividade que cada vez mais lhe é característico (o nevoeiro na última história é um excelente exemplo disso).

F(r)icções de Nuno Duarte e João Sequeira

“F(r)icções” é, então, composto por quatro histórias, todas elas de géneros bem distintos entre si, onde as duas primeiras serão as de tom mais leve e humorístico. Na primeira “Sem Escape” encontramos um diálogo delicioso entre a Morte e um homem que teima, mas com calma, em não avançar para a escuridão da noite eterna. Uma sátira à nossa situação financeira actual com base num daqueles velhos e seguros ditados populares. Além disso, tem o benefício de nos mostrar uma Morte a meter o dedo no nariz, algo que dificilmente encontrarão em outro lugar.

Em “O Pistoleiro Que Gostava De Dançar” Nuno Duarte volta a “bailar” nos campos do humor nonsense, usando como pano de fundo o Western. Aqui as lições de moral passam para segundo plano (ou saem de todo), para dar lugar a um herói atípico que consegue conciliar o seu prazer pela beleza da vida com a sua apetência na arte de queimar pólvora.

F(r)icções de Nuno Duarte e João Sequeira

Na terceira história, “O Uivo”, entramos num campo mais onírico que nos remete para uma qualquer lenda nórdica do tempo dos Vikings. Aqui, mais importante que o desenrolar de um enredo, são os sentimentos enaltecidos pelo guerreiro protagonista, durante um confronto que colocará, não só a sua coragem à prova, como também a sua alma.

Por fim temos, “A Dama Vestia De Negro”, a maior de todas as histórias e aquela que entra no campo do bem conhecido policial noir. Logo no início percebemos que Nuno Duarte se encontra num ambiente muito confortável, com um tipo de personagens que o autor trabalha sem grandes dificuldades e onde os diálogos fluem com uma naturalidade invejável. Quanto ao enredo, vai-se desenrolando, como esperado, a privilegiar a típica atmosfera sombria e misteriosa. Porém, no final, o autor consegue dar uma volta interessante a um género cada vez mais difícil de surpreender.

F(r)icções de Nuno Duarte e João Sequeira

Este “Fricções” é assim um início de uma parceria que, se espera, seja para continuar no futuro. São quatro curtos devaneios, mas podiam ser bem mais que o leitor agradeceria certamente. Nuno Duarte continua a brindar-nos a uma qualidade e humor à qual já estamos habituados e João Sequeira, através das distintas formas como explora o seu traço negro, sempre em busca de diferentes caminhos, volta a reforçar o quanto é um autor a ter debaixo do olho. Quanto à edição volta a ser mais uma de luxo por parte da “El Pep”. Capa dura e legendagem inteiramente à mão, são alguns dos pormenores que a tornam ainda mais apelativa enquanto objecto artístico.



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