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Horse Meat Disco

Lux, 27 Novembro.

A última noite fica sempre na nossa memória. É a noite dos excessos e das loucuras, de novas experiências, de viver o momento  não olhando ao dia de amanhã. Joga-se o que se tem e o que não se tem, sem pensar nas consequências. São as últimas noites que nos fazem acordar nu numa praia em Ibiza. E são as mesmas noites que gostamos de recordar com os amigos  dez anos mais tarde!

E como nada dura para sempre, também o histórico clube nova-iorquino Paradise Garage teve a sua “última noite” – prolongada por 48 horas. São imensos os testemunhos dessa festa inesquecível, onde um misto de alegria e tristeza, disfarçada de saudosismo, existia em cada uma das 14 mil pessoas que por lá passaram. A música tocada dentro daquelas paredes e o espirito que esta gerava nos espectadores  tornou este espaço, activo de 76 a 87, tão especial e diferente dos restantes. Numa altura em que a grande maioria dos clubes se apresentava como um local de convívio social associado ao status, no Paradise Garage a música era o epicentro da diversão. Quando o Garage fechou as portas, foram muitos os que ficaram sem casa, mas o mito do local onde a música falava mais alto do que a raça ou a orientação sexual viveria para sempre .

E foi com base nesse seminal clube que, muitos anos mais tarde, os amigos Jim Stanton e James Hilliard, descontentes com a nightlife gay britânica, decidiram criar uma noite temática focada na sonoridade Disco do Paradise Garage. Sorte ou mera inspiração, o clube foi baptizado de Horse Meat Disco depois de Jim Stanton ter lido numa headline jornalistica o relato do aparecimento de carne de cavalo em produtos de charcutaria. O core central de membros foi enriquecido ainda pela presença de Luke “Filthy Luka” Howard e Severino,  dedicando-se os quatro a oferecer sets polvilhados de gemas resgatadas dos 70s e dos 80s, com uma contínua  demanda pelo mais cheesy 12” de disco que pudesse incluir um segmento aproveitável.  Como se isto não bastasse, e fruto do imediato sucesso e reconhecimento por parte dos grandes nomes da cena musical, a presença de  convidados pontuais como James Murphy, Tim Sweeney ou Daniel Wang é regular.

Todos são bem-vindos e deixados à vontade, o importante é festejar. Afinal, a música está acima de tudo, factor que se mostrou decisivo para os seis anos de sucesso daquela que é hoje a mais conhecida noite Disco do mundo. Coube ao Lux receber em Portugal este quarteto fantástico, aqui reduzido a duo (Luke Howard e Severino ficaram em solo londrino a procurar mais preciosidades para tocar nas festas), saciando todos os que por cá alguma vez sonharam em poder ter  pisado o sagrado chão do Paradise Garage!

O portuense Social Disco Club, ponta-de-lança do Clube 31 (que vai animando discretamente as noites junto à Foz do Douro) e parte integrante do catálogo de várias labels relevantes,  aqueceu o público presente com algum disco sound proveniente da actual febre dos edits. Espantosamente, e apesar de ao fim-de-semana o Lux contar com um público “more about the looks than the music”, a homogeneidade de estilos e orientações que preenchia a pista às 2h30m da manhã provava que nessa noite a música assumia o papel de principal protagonista . O jogo de luzes  que acompanhou a recta final do set de Social Disco Club permitiu, por momentos, regressar até Nova Iorque em 1979  e adivinhar como seria uma noite com Larry Levan nos comandos.

Missão cumprida, Social Disco Club. O público está agora preparado para avançar para a etapa seguinte, o Live Act do italiano Hard Ton. Esta Divine do Séc XXI manteve o seu concerto entre o  Italo de 85 ao House europeu de 91, sem esquecer uma cover de Music da Rainha Madonna, sendo impossível não  interpretar esta actuação como uma homenagens às de divas como  Grace Jones e Whitney Houston no palco do Garage.

Chega por fim a aguardada hora de entrada dos fundadores da mítica noite em questão. James Hilliard e Jim Stanton preenchem agora o Dj Booth, comandando as operções por turnos. A arrancar o set o tema “Do you like the way that it feels de “Tempest Trio” ditou a sonoridade que se iria ouvir no resto da noite.  No meio deste set declaradamente 70’s foi possível ouvir alguns edits do colectivo bem como temas presentes na colectanea HMD lançada pela Strut Records. A acompanhar o set as animações presentes no painel de leds com o cavalo rosa com a quinta perna pronunciada, complementavam a musica. O público respondeu de forma efusiva às músicas, mostrando a muitos cépticos que Portugal também consegue dançar abaixo dos 120 bmps e sem distorção.

O set com 3h de duração e muita gema resgatada das decadas de 70 e 80, termina às 7h30m, no culminar de um desacelerar suave de ritmo, com o tema “Africa” de Toto, tendo desiludido alguns presentes, que esperavam ter ouvido no lugar desta a ultima música de Changin’ de Sharon Ridley. Interprete-se tal como um sinal, uma promessa de regresso. Afinal todos os festivais têm uma ultima noite, todos as férias no Algarve têm uma ultima noite, todos os anos tem uma ultima noite! Não precisa de ser algo único, apenas algo especial. E se para alguém Horse Meat Disco no Lux não foi a última noite, com certeza esteve lá muito perto.

Fotografia por Susana Pomba



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