Júlio de Matos
Mais loucura, menos prozac - a história de um homem que é Júlio da parte do tio e Matos da parte do pai.
“A gente fala com a televisão, mas ela não responde” – diz-nos Júlio, num dos momentos em que somos convidados a entrar na vida de um homem louco. Mas também podemos dizer que somos nós quem sai da nossa loucura diária para entrar noutro nível de (in)sanidade. “Júlio de Matos” é um texto de Pedro Cardoso, denominado originalmente de “Auto Falante”. Joaquim Monchique teve oportunidade de ver a peça no Rio de Janeiro e apaixonou-se pela mesma. Este seu segundo monólogo (quem se lembra de Paranormal, que esteve três anos em cena?) apresenta-se como uma reflexão sobre os dias de hoje e a forma como comunicamos. E também sobre a forma como ficamos sós, no mundo das multidões (“reais” ou “virtuais”). E de como ficamos loucos, sem nos darmos conta…
“A loucura tem o seu «quê» de fascínio e de assustador”, partilhou connosco Monchique, que confessou também que, enquanto actor, também se enquadra numa certa escala de loucura. Estar em palco, sozinho, com um longo texto na cabeça é um acto de coragem. Ainda por cima quando se trata de um texto com um discurso pouco lógico. A seu lado, Monchique contou com Carlos Paulo que, enquanto director, lhe permitiu um olhar “de fora” que enriqueceu a construção do Júlio de Matos. “Fazer um monólogo é como ir para a rua completamente nu”, confessa Monchique. Carlos Paulo salienta a necessidade de conter muita energia interior para “dar à luz” um personagem que é todo ele a peça. Faz-nos lembrar a célebre frase de Nietzsche que refere que é necessário muito caos interior para dar à luz uma estrela que dança. Para Carlos Paulo este monólogo não é de riso fácil, pois “o texto contém muita coisa dentro”. Trata-se de uma comédia negra, com um fundo de loucura e de verdade. Uma peça politicamente incorrecta, esta, que nos fala de gente que fala consigo mesmo e responde. E até se zanga consigo mesmo, e corta relações (com quem? consigo mesmo).
Num mundo em que se promove a comunicação imediata, o “gosto”, a partilha de vídeos, de redes imensas, esta peça surge como um alerta para a ausência de afectos e de conversas daquelas que já são raras: olhos nos olhos.
“Júlio de Matos” partilha connosco um desabafo que faz muito sentido nos dias de hoje: o dia-a-dia de um homem desempregado, sozinho, que aguarda ansiosamente que o telefone toque para ter alguém com quem falar. Até lá, vai falando sozinho. E que atire a primeira pedra quem nunca fez o mesmo.
Júlio de Matos está em cena no Teatro Armando Cortez (Casa do Artista), de quarta a domingo. E em breve entrará em digressão. Não fique a falar sozinho, vá ao teatro!
Galeria AQUI!
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