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Lisboa, Capital, República, Popular

O primeiro e segundo dia do Festival que invadiu o Musicbox em análise.

1º dia

Sem Vergonha

Dois meses depois do Festival Terapêutico do Ruído, o Musicbox recebeu mais um evento do género – desta vez sem bandas punk italianas ou espanholas. O objecto, desta feita, foi celebrar alguma da melhor música portuguesa. A de ontem (Vitorino e Brigada Vítor Jara) e a de hoje (B Fachada, Samuel Úria, Carminho e Oquestrada). Houve tempo para alguns momentos históricos.

No primeiro dia, calhou a Samuel Úria a função de abrir as hostilidades. O músico da FlorCaveira apresentou o disco de estreia. Com ele, em palco e em disco, estiveram Filipe Sousa (baixo) e Jónatas Pires (guitarra), eles dos Pontos Negros que se preparam para editar o segundo álbum. A descrição do myspace aponta para um folclore latino ambiental. Acrescente-se alguns blues à equação. E, sim, o futuro passa cada vez mais por aqui.

Seguiu-se um Boss AC que é cada vez mais difícil rotular. Com uma formação tipicamente rock, constituída por baixo, guitarra, teclas e bateria – um empréstimo de Samuel Úria –, o músico que dá pelo nome de Ângelo César entrou retraído e sem dinâmica com «Levante-te», mas foi-se soltando com o desenrolar do espectáculo. O convidado TC entra ao terceiro tema a emprestou alguma soul a um concerto que passou também pelo hip hop, pelos ritmos africanos e pela “rockalhada da pesada” que é «Farto». Pena que, no que diz respeito à parte lírica, Boss AC por vezes acerte, outras roce o mau gosto. Houve tempo para estrear ainda uma “brincadeira de estúdio”, uma cover de «Jura» de Rui Veloso, versão hip hop/soul.

O set dos Oquestrada é simples: dois bancos, uma bacia – que é um contra-bacia, instrumento rítmico pouco convencional – e vários microfones. Há quem lhes cole o rótulo de novo fado ou fado moderno, mas esta música caberia mais facilmente no caldeirão da world-music. A banda (orgulhosamente) da margem Sul abre quase a capella. Miranda, de mãos nos bolsos, toda ela simpatia, refere que “a grande raiz do fado é a exclusão”. Os Oquestrada são da outra margem, mas não têm vergonha de se atirar à canção de Lisboa. “Não há que ter vergonha, façam-se à estrada” ter-lhes-ão dito em 2001. Dedicaram uma canção a um muito bem composto Musicbox, à geração antes da deles (a do 25 de Abril, portanto) e a Ana Malhoa – não conseguimos perceber o porquê, ainda que Miranda o tenha explicado. Do final, em festa, sobraram duas cadeiras e um contra-bacia.

Lisboa Capital República Popular – 2º dia

A Enchente

Bfachada é sinal de enchente. Já tinha sido assim quando abriu para Kurt Vile, numa noite em que levou mais gente ao Frágil que o próprio músico norte-americano – a suposta grande atracção da noite. Desta vez esgotou o Musicbox – enquanto entrávamos no recinto vendiam-se os três últimos bilhetes. Ao contrário do concerto do Frágil, Fachada surgiu desta feita acompanhado, com aquilo que pareceu ser, visto do fundo da sala, um contrabaixo. Visivelmente mal disposto, reclamou com o ar condicionado que, segundo o próprio, “cantava” mais alto que ele, para além de lhe cortar a voz, e com o ruído de fundo, “digno de uma revolução de Abril”. O airplay de que «Estar à espera ou procurar» tem sido alvo, fez-se sentir quando a sala acompanhou o músico, mas foi com «Zé», como habitualmente, em encore, que nos convenceu. É uma certeza.

Veio Carminho e com ela o muito elogiado disco de estreia, “Fado”. Sem gozar do ambiente ideal, a jovem fadista teve ainda que fazer face a alguns problemas de som. Não fosse a simpatia e a incrível voz de Carminho e tínhamos ficado apenas com a sensação de ter visto um peixe fora de água. Na última canção fez-se silêncio. Foi o melhor momento de uma actuação que devia ter começado ali.

Pedro Abrunhosa teve menos público, mas nem por isso a casa deixou de estar bem composta. Apresentou-se sozinho, acompanhado apenas pelo teclista da sua actual banda que, como sabemos, já não é os Bandemónio. O espectáculo arrancou com uma cover, «Hallellujah» de Leonard Cohen, que já foi alvo de tantas versões que a de Abrunhosa pouco ou nada trouxe de refrescante. A partir daqui deu-se um verdadeiro desfilar de êxitos. «É preciso ter calma», «Talvez foder» e «Se eu fosse um dia ao teu olhar» foram intervaladas pelo primeiro single de “Longe”, o novo disco, «Vamos fazer o que ainda não foi feito» – que vai ser campeão de airplay no Verão, apostamos. No encore, um momento único: Abrunhosa chamou Bfachada para uma homenagem “a um dos maiores autores de música portuguesa, Fernado Lopes Graça”. Foi um bom concerto, o que nos deixa pensativos: como seria se tivesse sido com a banda?



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