Entrevista Márcia – Fotografia de Rita Carmo

Márcia

"O "Casulo" guarda aquilo que existe de valor e que deve ser protegido. Entre muitas coisas, a felicidade"

Quisemos saber se Márcia é a “Menina” que dá título do seu single, que sem dúvida assentou “o passo sem medo ou manha”. Para nós, o seu segundo álbum – “Casulo” – é a prova disso, de que a sua música está em doce mutação para algo grande antes de ainda e, sem dúvida, se tornar gigante; o único caminho possível para quem cria discos com a sensibilidade de quem arruma “lugares onde se guarda aquilo que existe de valor e que deve ser protegido, entre muitas coisas, a felicidade”.

Esta sexta-feira, 7 de Fevereiro, o Centro Olga Cadaval é o lugar. No dia 14 de Fevereiro é a vez da Casa da Música no Porto.

A RDB entrevistou-te em finais de 2011 a tempo do relançamento do teu primeiro disco “Dá”. De “ontem” até ”já”, e num pequeno flash, o que nos podes revelar que mais tenha marcado o teu percurso nestes dois anos?

Houve muita coisa boa nestes dois anos. Acho que o mais importante para mim foi ter tido a oportunidade de trabalhar com diferentes pessoas na música. É das coisas que me traz mais gozo. Mas em relação aos dois anos que passaram, o nascimento da minha filha foi a principal mudança na vida e no tempo.

O trocadilho com o tempo foi de propósito. Sentes que está tudo a ser muito rápido, é este o teu ritmo, ou querias hoje ter algo feito que ainda esteja por fazer?

Ainda tenho muita coisa por fazer. Muita música para inventar, muitas colaborações que ainda não fiz, e muitos sítios onde ainda não toquei, e sítios onde nunca fui… O caminho ainda é longo, e ainda bem.

Ainda acerca do ritmo… transmites uma calma gigante neste último disco, e não só nas melodias; é sobretudo nas letras que tudo é calmo, pensado, dedicado, sentido. Nada parece ser ao acaso, como vasos muito direitinhos extremosamente podados e postos à varanda no ponto certo do sol…desculpa o devaneio: é assim que a Márcia é? Correcta, recta, dedicada?

Correcta e dedicada, talvez sim. Recta, não diria. Tenho muitas fases diferentes, cada uma com o seu encanto e a sua dificuldade. É daí que nasce a música e a vontade de me expressar, fico feliz se transmitir calma às pessoas, principalmente num momento tão conturbado do mundo.

Mas ainda assim entregas-te bastante e isso sente-se nas músicas, soam a muito de ti. Este Casulo é que é o teu mundo? Ou quer Casulo dizer que ainda te escondes? Ou que muita transformação está por vir?

(Risos) Pode querer dizer isso tudo. Quando escolho o título de um disco ou de uma canção não tento entender totalmente o porquê daquele nome. O Casulo tem muito de aconchego, de recolhimento. E, de facto, ainda não é uma borboleta. Mas acho que, entre a gravidez e primeiros meses com um bebé nos braços, o “Casulo” guarda aquilo que existe de valor e que deve ser protegido. Entre muitas coisas, a felicidade.

E que diferenças existem de “Dá” para “Casulo” que tenhas sentido na criação do álbum, mas também reacções externas que sintas?

Diferenças para mim houve principalmente na opção dos arranjos. Há um fio condutor neste disco que eu, por opção, não tive no “Dá”. Parece que as pessoas também sentem isso. Dizem-me que o disco é uma viagem do início ao fim, e que sentem este disco mais maduro. Eu sinto que cada um dos discos corresponde ao momento em que foram feitos.

Falando agora de concertos, que se pode esperar deste próximo em Sintra?

Em Sintra terei a minha formação integral com bateria, baixo, guitarras.. Somos cinco, o que me permite tocar o disco tal como está gravado. Para além disso terei o Jorge Cruz e o Samuel Úria como convidados. O Sami é um repetente que me dá muito gozo em palco, e o Jorge virá pela primeira vez cantar comigo uma canção dele em que participei: «Tornados».

O que significam para ti os concertos? Mais contacto, mais mostra, mais liberdade?

Os concertos são o momento mais privilegiado para comunicar com o público. A música não teria sentido para mim sem as pessoas que a ouvem.

Como descreves o processo com o Samuel? Vocês são papel e tinta, no mínimo. Como é trabalhar com ele?

Quando fiz o meu primeiro concerto a sério, em nome próprio, no Cabaret Maxime, convidei o Sami para fazer a primeira parte porque eles exigiam uma pessoa mais conhecida. Eu não o conhecia pessoalmente, mas ele aceitou e ainda me elogiou o trabalho e a voz e agradeceu o convite. Lidei logo com esse lado grandioso, humilde e generoso dele. No próprio dia eu estava uma pilha, e ele empurrava-me e motivava-me. Dava-me coragem. O Sami é uma pessoa inspiradora, mesmo se não trabalhasse com ele. É uma pessoa rara.

Os teus concertos são tão intimistas como o álbum “Casulo”? Quando se ouve é como se fosse o nosso próprio sussurro, mesmo quando estamos a ouvir o single «Menina» na rádio mais comercial. É a tua entrega e sensibilidade? São os dias de hoje a precisar de verdade assim?

Todos os concertos são diferentes. Alguns concertos são muito pausados, sussurrados ao ouvido. Às vezes faço concertos sozinha, à guitarra. Ou com um músico, ou dois músicos. Depende sempre do contexto. Tento adaptar-me ao tipo de ambiente onde vou tocar. No S. Jorge, em Maio, éramos nove pessoas em palco e foi uma enorme festa, mas parecia muito uma sala de minha casa. Houve muita cumplicidade entre o palco e a plateia. Na mesma sala, no Mexefest, tocámos só os cinco e pareceu-nos mais “rockeiro” o concerto.

A Márcia é mesmo essa menina do single? Quem é a Márcia?

Escrevi essa música para puxar pelas meninas. Escrevi inicialmente com vontade de dedicar a todas as amigas que se mexem, que lutam pelas coisas que querem fazer. Depois lembrei-me de convidar o Sami para escrever uma parte da música e cantá-la, precisamente porque ele, para mim, sempre foi uma pessoa que me inspira e encoraja.

Apesar das colaborações, este é um disco muito teu, íntimo, assim parece. Para quem não o conhece na íntegra, fala-nos do que mais dói ou mais sonha, ou mais conta de ti este “Casulo”.

Todas as canções nasceram de um momento real. Elas contam muito sobre mim, e às vezes não sei o que contam. Não seria capaz de descrever ou definir o que sentir ao ouvi-las.

Talvez a «Sussurro» seja uma canção de maior dor, e a «Brilha» uma canção de celebração de coisas boas.

Para terminar, da última entrevista ressalvámos do disco “Dá” muita ternura e magia. Deste “Casulo”, o que achas que mais sussurra, ou o querias mesmo que não deixasse de brilhar?

Um amigo meu descreveu o “Casulo” como um lugar. Gosto de pensar no disco assim: um bom lugar onde estar.

Fotografia de Rita Carmo



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