Música & Design
Duas disciplinas diferentes unidas numa complexa e extensa relação amorosa.
Dificilmente conseguimos contabilizar a duração deste caso amoroso, uma relação que provavelmente remonta aos primórdios da música tal como a conhecemos. Muito possivelmente, a relação mais directa entre a Música e o Design começa no primeiro disco de música comercializado.
Esta relação bilateral foi evoluindo ao longo do tempo, onde diversos estilos musicais foram utilizando diferentes disciplinas, diversos tipos de linguagem e diversos tipos de grafismo, várias formas de comunicar foram sendo criadas para melhor reproduzir visualmente as diferentes sonoridades.
Existem dois sentidos nesta via; por um lado, podemos dizer que muitas linhas criativas foram inspiradas na sonoridade de diversos músicos. Também existem muitas correntes musicais inspiradas em estilos gráficos criados por diversos designers ao longo do tempo. Seria de prever que com o passar do tempo esta relação se tornasse cada vez mais forte, quase como uma fusão entre dois mundos.
Em 1963, o famoso ícone da Pop Art, Andy Warhol, com o seu estúdio em Nova Iorque The Factory acabou por fomentar ainda mais esta ligação, dando festas onde, não só projectava os seus filmes, como já existiam Vj’s a realizarem diversas experimentações a nível de vídeo/projecção. Artistas relacionados com arte e música eram os convidados. Salvador Dalí, Bob Dylan, Ultra Violet, Lou Reed, Frank Holliday, Billy Linich, Maureen Tucker, Mick Jagger, Ronnie Cutrone, entre outros, eram habituais nas suas festas.
Nasce em 1968 o famoso estúdio de Design Hipgnosis, constituído por Storm Thorgerson, Aubrey Powell e Peter Christopherson, responsáveis pela criação de capas icónicas para bandas como Led Zeppelin, Pink Floyd, Black Sabath, Peter Gabriel, Génesis e muitos outras. Este estúdio veio estreitar ainda mais o elo, pois cada vez mais o som necessitava de uma imagem para se exprimir no silêncio.
Se no início a Arte servia de pano de fundo a este romance, com o nascimento de estúdios de Design que estavam directamente ligados ao mundo da música e que trabalhavam todo o material das bandas foi ficando cada vez mais clara a ligação directa entre os dois.
Trevor Jackson é um dos filhos deste longo romance. Designer, músico e produtor, Trevor quebrou diversas fronteiras e abriu o seu primeiro estúdio de Design em 1990, onde desenhou capas para Stereo Mc’s, Jungle Brothers e Todd Terry. Passado um ano, o estúdio passou também a ser uma editora de Hip Hop que rapidamente se tornou num êxito. Sobre o nome de Underdog, Trevor remixou diversos trabalhos de artistas como Massive Attack, U2 e Unkle.
Em 1996, Trevor formou uma nova editora chamada Output Recordings, responsável pela introdução de artistas como Black Strobe, The Rapture, Lcd Soundsystem, entre outros, tal como o seu próprio projecto PlayGroup. O sucesso foi tal que a Output recordings foi considerada como a Factory ou a própria Warp Records desta década pela Jockey Slut Magazine.
O sucesso no mundo da música em nada invalidou o sucesso no mundo do Design. Trevor é responsável pelo Design da maior parte das bandas da sua editora, tendo também desenvolvido trabalho para a campanha dos Soulwax, extensivamente premiada nos mais altos festivais de Design. A sua lista de clientes, com nomes como Sony, Coca-Cola, Puma, Universal, Virgin ou DFA Records espelha o seu sucesso.
A profissão “Músico-ó-Designer” é hoje em dia algo cada vez mais comum. Temos diversos exemplos em Portugal, alguns resultados são felizes outros nem por isso. Pois a verdade é que, embora a Música e o Design estejam fortemente ligados, envolvem engenhos e dedicações diferentes e muitas vezes quando queremos fazer tudo, acabamos por não ser bons em nada.
Com uma história de vida tão extensa e complexa, que mais se pode equiparar à série “Dallas”, este artigo sem muito esforço se tornaria num livro, pois a verdade é que a ligação entre o Som e a Imagem são tão naturais como a capacidade humana de ver e ouvir como se tratasse apenas de um só canal.
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Grande Andy Warhol, sempre muito à frente! Não deviam ser más as festas dele, até o Salvador Dali ia lá dar um passinho de dança, lindo :)
A arte sempre se caracterizou pelo entrelaçar das suas diversas vertentes. Nesse sentido, a literatura foi um dos grandes catalizadores do rock n´roll. Basta lembrar um Jim Morrison fortemente influenciado pelos poetas Baudelaire ou Rimbaud e a eterna chama do livro “On The Road” de Jack Kerouac. É perfeitamente legítimo que o design, e a sua predisposição para criar ambientes, tenha influenciado decisivamente a forma de fazer música. Warhol foi um mestre nesse campo e a sua Factory continua a ser um modelo a seguir, mas dificilmente replicado.
Salgado, não poderia concordar mais! As tentativas de replicar estes “hypes” especiais e naturais, como as festas da Factory são extensas, mas os resultados nunca são iguais ;)