Noise

A galinha da vizinha já não é melhor que a minha!

O Soulseek apresentou-se ao mundo em geral por volta da altura em que no nosso país a internet também se generalizou. Todos os dias se descobria uma banda nova, com um som diferente e tudo completamente fresco! E era bom! Interessava que a banda pertencesse a um dos subgéneros do rock, sendo óbvio que, em pouco tempo, o punk rock já não era suficiente; para se ser cool tinha de ser um electropunk, um grindcore infantil, sci-fi-noise, arty, e adiante… Quanto mais complicada a nomenclatura, melhor!

Fala-se cada vez mais de uma coisa chamada noise (= ruído), o que significa que, aos poucos, as nomenclaturas passam a instalar-se e a ficar no ouvido dos mais abertos às novidades musicais vindas de todos os cantos do mundo, mesmo que não se saiba muito bem o que é o noise! Não usaremos essa palavra contra nós, por isso, vai ficar-se por este parágrafo.

Estes novos géneros de bandas dividem-se conforme a sua origem, e os EUA são um óptimo exemplo para se perceberem as duas correntes: se é feito por moçoilos de NYC (vejamos os Liars, por exemplo), provém indirectamente do electro, se vem do sol da Califórnia, descende de uma junção de pessoas ligadas ao HardCore, provenientes de um meio mais artístico, da zona entre San Diego e San Francisco (não nos esqueçamos que o psicadelismo de San Francisco fica apenas a três horas de San Diego e, além disso, o próprio HardCore de SD foi muito marcado por uma pretensão que ultrapassava os cânones do género).

O sol e o ambiente mais descontraído, que sempre caracterizaram a costa Este, permite que os formalismos sejam postos de parte, e que surjam bandas mais criativas (arty, por assim dizer), cujo som se distingue do característico e mais electrónico som de Nova Iorque: guitarras muito marcadas, bateria frenética e uma voz ao mais alto nível do scream (= gritos). Ainda assim, não podemos catalogar ninguém nem dizer que fulano é NYC e cicrano é mais voltado para o San Diego Style. No caso dos Panthers ou dos !!! (Chk Chk Chk, que cresceram na GSL), o som podia ser, mas é feito em NYC…

Alguns responsáveis pela difusão do que se costuma chamar som de San Diego são a editora GSL (Gold Standard Laboratories) – do ex At-the-drive-in e agora Mars Volta, Omar Rodriguez – e da ThreeoneG Records (com uma alusão óbvia ao refrão da música Warsaw dos Joy Division), pertença de Justin Pearson dos Locust, . No catálogo da GSL constam nomes como The Locust (os pesos pesados do catálogo), os espanhóis e já extintos Omega Cinco (oriundos de Barcelona e que agora estão entretidos com inúmeras bandas e projectos a solo), Le Shok, Arab on Radar e An Albatross, entre outros. Na ThreeoneG moram uma quantidade de bandas da zona como as que deram origem aos Locust – Unbroken, Swing Kids, Crimson Curse. Mas, percorrendo o catálogo destas duas editoras percebe-se que o San Diego Style se torna um termo inócuo em demasia, pois a sonoridade das bandas tende a ser demasiado díspar e a capitalização do catálogo generaliza-se pelo mundo todo.

Começámos a desejar freneticamente a vinda deste tipo de bandas a Portugal, mais propriamente a Lisboa, e talvez à ZDB, mas… o seu a seu tempo! Não tardou que aparecessem uns Gafanhoto, a descolar do HardCore lisboeta, armados de mascarilha preta, que duraram dois incompreendidos concertos de existência.

Pouco tempo depois, começámos a ouvir falar de uns gajos do Porto, uns tais X-Wife, que fizeram a primeira parte dos Liars no Lux, a 23 de Novembro de 2003, e que até já tocaram no CBGB’s de Nova Iorque. Um pouco antes dos X-Wife, apareceram em Lisboa os Loosers de Tiago Miranda (DJ no Lux, uma parte dos Dezperados e ainda activista na ZDB), banda que dá muito que falar pela sua crescente predilecção pelos improvisos ao estilo jam session ou à lá Liars, meio autista, em cada aparição em Palco. Nada de Califórnia, estes são NYC! Mais ao estilo californiano mas com o sol de Verão da suécia, surgem os Vicious Five, compostos por cinco filhos do HardCore, mais voltados para o som cheio de guitarras angulares, bateria viril e voz interventiva, empenhados em tornar a diversão numa revolução.

Lembremos que, na expansão do som mais alternativo, a acção da ZDB é de louvar, ao promover e aproveitar o seu espaço, outrora apenas entregue à divulgação das Artes Plásticas, ao transformar-se, após ter estado em diversos espaços de Lisboa, numa galeria sui generis no coração do Bairro Alto passando cada vez mais a promover concertos de bandas tanto nacionais como estrangeiras, cuja sonoridade é mais confusa do que o habitual. A vinda, por exemplo, dos Numbers, acompanhados da sensacional Dinasty Handbag, em 2004, foi uma das primeiras aproximações às bandas de que estamos à espera.

Posto isto, a Kid City apresentou-se ao mundo num Domingo de Outubro do ano passado e trouxe para quem os quis ver e ouvir, os espanhóis The Cheese e Zeidun (bandas nas quais militam dois dos ex-membros de Omega Cinco) para uma matinée de sons frenéticos e performances avassaladoras. Essa tarde aconteceu na ZDB, estava à pinha e convenceu muita gente. Era aquilo de que estávamos à espera a chegar definitivamente a Lisboa, pela mão de quem só está interessado em fazer os putos dançar. Repetiu-se a graça e a Kid City repetiu a dose, desta vez já em Janeiro de 2005, com a vinda dos (também espanhóis) Grabba Grabba Tape e Ginferno. Mas ainda não era desta que a Kid City trazia uma banda da GSL! Mas no Domingo, dia 27 de Fevereiro, os Vanishing animaram o Lisboa Bar com um concerto que, à partida, prometia dar que falar e que teve de ser abruptamente interrompido porque alguém se queixou do barulho e a polícia interveio.

Nestas novas bandas os espectáculos são muito importantes, são tão ou mais importantes do que a música! A fardamenta tem de ser original (os Locust tocam completamente mascarados e os Grabba Grabba Tape tocam vestidos de Abominável Homem das Lycras Rosa-Choque), se houver um instrumento inventado por alguém da banda que, por acaso, até é muito habilidoso de mãos, melhor, e ainda é melhor, se a performance for tão boa, tão boa, que haja acção do público! Aí sim, é ouro sobre azul! E há que não negligenciar os cartazes, os bilhetes e os preços das entradas, bem como o orgulho no DIY (do it yourself), motor de arranque destes acontecimentos.

Contudo, mesmo com ZDB e Kid City, os putos ainda não dançam nos concertos… mas porquê?! Porque o que já acontece desde 1995 em San Diego, só começou há três ou quatro anos por cá… É uma questão de esperar, não desistir e rever o ditado… Afinal, a Galinha da vizinha já não é melhor que a minha!



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