“O Baile” | Nuno Duarte e Joana Afonso
Em “O Baile” o autor volta a mergulhar no meio rural, mas desta vez para contar uma história em torno de um grupo de Zombies pescadores, onde o misticismo e a decomposição corporal imperam
Já se tornou um ritual esperar, todos os anos, por uma nova edição de BD da Kingpin Books. A editora de Mário Freitas tem-se solidificado mais com cada ano que passa, trazendo-nos sempre edições de qualidade, quer a nível artístico – conseguindo reunir autores reconhecidos e estrelas em ascensão – quer a nível técnico – desde a capa à qualidade do papel usado.
Se contra factos não há argumentos, o melhor é mesmo aconselhar a leitura das obras em questão, todas merecedoras de atenção – tais como “Fórmula da Felicidade”, “Mucha” ou “o pEQUENO dEUS cEGO”. Claro que, até ao momento, são poucos livros; alguns poderão dizer que a Kingpin ainda não teve tempo de falhar, mas fica a sensação de que a atenção, dada a cada um, seria a mesma se fossem muitos mais – e a única razão porque não estamos a falar de um número maior parece estar mais ligada a questões comerciais do que à da qualidade dos artistas.
Lançado recentemente no festival da Amadora,“O Baile”, de Nuno Duarte e Joana Afonso, era um dos lançamentos mais aguardados do ano.
O ano da história é o de 1967. Estamos em pleno estado novo, um ano antes da “queda” de António de Oliveira Salazar. Quando, a alguns meses de uma visita do Papa, estranhos e sinistros relatos surgem sobre uma horda de pescadores aparentemente mortos, cabe ao Inspector da PIDE, Rui Brás, deslocar-se até à aldeia em questão e averiguar a situação, tomando as medidas necessárias para a consertar.
O nome de Nuno Duarte pode estar mais associado às “Produções Fictícias”, fruto do seu trabalho nos suplementos “Inimigo Público” e “Kulto” – no Jornal Público – e em algumas séries de TV – “Manobras de Diversão”, “Bocage” e “Liberdade 21”. Contudo, com o tempo é um nome cada vez mais associado também à BD, contando já com algumas obras no seu currículo como “Paris Morreu” e “Mutate & Survive”, ambas editadas pela Chilli com Carne. Dois anos após ter escrito “A Fórmula da Felicidade” volta a trabalhar com a Kingpin, neste negro conto que saiu mesmo a tempo do Halloween.
Em “O Baile” o autor volta a mergulhar no meio rural, mas desta vez para contar uma história em torno de um grupo de Zombies pescadores, onde o misticismo e a decomposição corporal imperam.
O autor sabe como construir uma personagem (atente-se nos pormenores em torno de Rui Brás e da sua aversão ao silêncio) e, também, como criar o ambiente certo para cada cena. Está também dotado de um humor bastante apurado e certeiro, que até poderia ter estado em maior quantidade neste livro – até porque o horror e o humor não são estranhos um para o outro.
Joana Afonso é um daqueles nomes que temos vindo a acompanhar a partir de exposições de BD e de participações em determinados projectos, como a revista Zona. É uma desenhadora com um cunho pessoal fortíssimo, não sendo difícil ficarmos conquistados pelo seu traço. Dividindo o seu tempo entre as suas duas grandes paixões, a BD e a animação, seria uma questão de tempo até vermos um livro seu editado. Esse dia, finalmente, chegou.
“O Baile”, também colorido por ela, é a confirmação em livro daquilo que já se previa, ou seja, que além de uma excelente ilustradora, Joana Afonso sabe como contar uma história. As suas personagens, a evocarem marionetas, dão um ar caricatural a todo este “baile” surrealista e fantasmagórico, que encaixa na perfeição.
Se os homens não se medem aos palmos, muito menos as histórias. No entanto, fica o desejo de ver mais e maior desta dupla. Outro regresso a aguardar.
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