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“O colecionador” de Daniel Silva

Noventa segundos para a meia-noite.

No final de cada livro da série que tem como protagonista o espião israelita Gabriel Allon, Daniel Silva tem sempre o cuidado de iniciar a Nota de Autor indicando que estamos perante uma «obra de ficção e deve ser apenas lida como tal». Mas, quem habitualmente lê os livros assinados pelo ex-correspondente da CNN no Médio Oriente, sabe que a referida ficção tem como base um contexto geopolítico assertivo, e cada romance de Silva é um tratado, ainda que alguns nomes e locais sejam fruto da sua imaginação, sobre a atualidade política.

Por isso, não é surpresa que O colecionador (HarperCollins, 2024) nos transporte para os meandros de espionagem e estratagemas (pouco legais ou morais) levados a cabo pelos russos com o objetivo de conquistar a Ucrânia, e com a ameaça nuclear cada vez mais presente.

No entanto, e não estivesse atualmente Allon a viver em Veneza e tendo como ocupação principal a restauração de obras de arte, toda a trama deste livro tem início com o reaparecimento de um dos quadros mais famosos do mundo e que tinha sido roubado. Perante a dúvida sobre a sua autenticidade, Cesare Ferrarri, comandante da Brigada de Arte, e uma das presenças habituais no universo criado por Daniel Silva, convida o ex-diretor do Departamento a confirmar se se trata do quadro original e não de uma cópia. Além dessa tarefa, o italiano desafia ainda Gabriel a descobrir o paradeiro de outro precioso quadro que fora roubado de um museu norte-americano em 1990.

Ainda que pouco convencido a enfrentar tais demandas, Allon acaba por aceitar mais um exigente trabalho, no qual contará com a ajuda inesperada de Ingrid, uma ladra internacional, hacker e ativista dinamarquesa. Rapidamente, a dupla descobre que o roubo do quadro faz parte de um esquema internacional que envolve muitos milhões de dólares, cuja figura maior é um individuo cujo nome de código é… o colecionador.

Assente numa (habitual) narrativa cinematográfica, o livro evolui em vários quadrantes geográficos, através de capítulos curtos mas muito bem contextualizados e organizados – por vezes com pequenos flash-backs que ajudam os leitores menos conhecedores da obra de Daniel Silva a entender as relações entre os habituais atores das aventuras de Allon –, fazendo o leitor viajar a partir de Itália com paragens na Dinamarca, França, Bélgica, Israel, Alemanha, EUA, Rússia ou Finlândia e à boleia de algumas das personagens criadas por Silva, em especial, os membros do Departamento, como Eli, Mikhail, Natalie, Dina ou Ari. Chiara, esposa de Allon, tem uma presença muito menos ativa, comparativamente a outros livros, mas está sempre presente e no pensamento do ex-espião.

Juntos, apesar de com algumas questões por resolver (alguns dos membros do Departamento ainda não estão muito confortáveis com a nova vida de Allon…), vão tentar desmantelar um plano criado pelos temíveis líderes do Kremlin com base nos recursos nucleares da Rússia, país que detém o maior acervo do planeta das referidas armas.

Trata-se de uma luta contra o tempo para evitar o Armagedão nuclear e atrasar o Relógio do Apocalipse, metáfora criada pelos especialistas da revista Bulletin of the Atomic Scientists, que todos os anos acerta os seus ponteiros tendo em conta as ameaças globais do planeta, falemos do ponto de vista nuclear, de problemas biológicos e/ou alterações climáticas. No início de 2024, os ponteiros mantiveram-se a 90 segundos da meia-noite, entenda-se o fim da Humanidade. Que Gabriel Allon nos proteja.   



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