rdb_polaroid_header

Polaroid

Flash! Foi imediatamente considerada uma maravilha do seu tempo: a câmara fotográfica Polaroid cuspia um filme pouco prometedor, mas cujos pigmentos se revelavam nas mãos do fotógrafo de algibeira em apenas alguns minutos. Com os dias contados, o ritual Polaroid (ainda) é o mesmo.

A emoção aumenta à medida que os contornos esbatidos ganham cor e forma, perpetuando o momento, emoldurado com o icónico plástico branco 4×4. Aqui, reserva-se espaço para rabiscos dos mais diversos humores. Descrições de lugares e tempos, observações criativas e anotações intemporais, impressos a caneta azul ou a marcador de feltro colorido.

Mas, numa época em que praticamente todos os telemóveis têm uma câmara digital integrada, a fotografia “instantânea” há muito que deixou de o ser. A Polaroid tornou-se um anacronismo. E o inevitável fim da marca chegou. Após setenta anos de história, Kyle McDonald, vice-presidente da Polaroid Corporation anunciou, em Fevereiro de 2008, em Nova Iorque, o encerramento de duas fábricas de filmes nos Estados Unidos da América. O anúncio era já há muito esperado: a empresa tinha deixado de produzir câmaras fotográficas há mais de um ano. Como tal, as unidades localizadas no México e na Holanda também estão na lista para encerrar a produção até ao final do ano.

Desde então, têm-se multiplicado homenagens – polanoid.net – campanhas e petições – savepolaroid.com – para salvar a marca, e iniciou-se uma corrida para adquirir os últimos filmes e garantir reservas, muitas vezes a preços avultados. Criou-se mesmo o colectivo “Impossible Project”, que ocupou uma fábrica da Polaroid abandonada, na Holanda, e recrutou um grupo de antigos técnicos para tentar criar um novo filme. Mas entretanto, é certo que cada instantâneo representa uma preciosidade e um flash a menos na história da Polaroid.

Polaroid Magic

A magia da Polaroid foi criada em 1930 pelo inventor norte-americano Edwin Land numa empresa que fabricava, originalmente, óculos de sol high-tech. No ano de 1948, foi apresentada a primeira câmara instantânea, que ainda requeria técnicas algo primitivas, como a necessidade de levar para todo o lado um pack que a acompanhava, composto por químicos que permitiam que os utilizadores desenvolvessem as imagens fora da câmara. Mais tarde, em 1965, a Swinger fez um brilharete, ao figurar no “Top 50 Gadgets” do século XX. Mas foi a icónica Polaroid SX-70, equipada com um estojo de pele (inconfundível), que permitiu que a invenção americana reinasse em ambas as margens do Atlântico, em 1970.

A Polaroid tornou-se um must-have tanto para as famílias tradicionais como para as tribos boémias, e atravessou as camadas mais criativas das últimas décadas.

Para muitos, as actuais demonstrações de afecto para com a Polaroid podem-se aparentar desajustadas, principalmente nos dias de hoje, em que qualquer telemóvel possui uma câmara fotográfica. Mas a apreciação pela sua estética distinta foi já celebrada, durante as décadas anteriores, por alguns dos maiores criativos da nossa era, que abraçaram o desafio de fazer arte a partir das idiossincrasias da Polaroid.

A mística criativa das Polaroid

Andy Warhol foi um orgulhoso entusiasta da sua “Polaroid Big Shot” e utilizou os seus instantâneos para concretizar muitas das suas criações. O cineasta russo Andrei Torkovsky não dispensava a SX-70 nas filmagens, como forma de captar detalhes importantes e encontrar inspiração.

Sir Laurence Olivier e Vincent Price chegaram a promover a Polaroid antes da fama. Ali McGraw, a protagonista de “Love Story”, estreou-se em frente à objectiva num anúncio publicitário popular, quando “Cocas, o Sapo” e os “Marretas” eram a imagem da Polaroid, nos anos 80. São muitos os que se recordam dos dias de glória da Polaroid, imortalizados pela personagem Rollergirl, de Heather Graham, na película “Boogie Nights”. A marca admite ainda que sentiu um aumento da procura das suas máquinas quando o galante actor de Hollywood, Jack Nicholson, admitiu publicamente que usava a sua câmara para tirar fotografias instantâneas sensuais às suas muitas amantes. Ultimamente, no ano 2000, o aclamado thriller psicológico “Memento”, baseou-se na Polaroid para concretizar o seu material de promoção. No filme, que foi nomeado para dois óscares, o protagonista sofre de amnésia, e utiliza séries de imagens Polaroid para guardar informação sobre si próprio e sobre os outros, a fim de conseguir encontrar o homem que matou a sua mulher. Mais recentemente, em 2003, no single dos Outkast «Hey Ya!», Andre 3000 exclamava “Shake it like a Polaroid picture!”. Ao longo dos anos, numa reviravolta nunca prevista por Edwin Land, a Polaroid foi-se associando ao movimento criativo das últimas décadas e a um estilo de vida boémio e alternativo.

Um dos exemplos é a apetência para a fotografia Polaroid de Dash Snow, um jovem artista malogrado, sinónimo da cena artística da baixa nova-iorquina, considerado pela “New York Magazine”, em 2007, o precursor de Andy Warhol, sendo mesmo designado “Warhol’s Children”. Faleceu no dia 13 de Julho, com 27 anos, de uma overdose. O seu trabalho em Polaroid foi recentemente compilado no volume “Dash Snow Polaroids”, pela sua galeria, Peres Projects. Dash Snow levou, durante anos, a sua câmara Polaroid consigo nas noites boémias de Nova Iorque, e fotografou as suas acções e as dos seus amigos, como meio para se recordar, no dia seguinte, do que tinha acontecido. Desta forma, imortalizou a sua breve vivência, e transformou as Polaroid numa crónica em imagens quadrangulares de plástico branco. E cada imagem conta uma história.

Muitos foram os criativos que desenvolveram o seu trabalho em torno das películas 4×4.

António Barros é um fotógrafo brasileiro que vive em Paris, e, recentemente, decidiu criar um blog inovador a partir das suas Polaroids, que baptizou de “The Singular” (ver links externos). “A câmara não cabe no bolso, é desajeitada e mesmo assim não saio mais de casa sem a minha Polaroid”, garante o especialista, “todas as fotos que faço com ela ficam lindas”.

Aos sete anos, o fotógrafo morava com os seus pais numa cidade no sul da Alemanha, chamada Heilbronn. No caminho para a escola, existia uma pequena loja com material escolar e, na vitrina, estava exposta uma câmara Polaroid. “Era o meu sonho”, recorda, “mas eu nunca consegui juntar dinheiro suficiente para comprá-la”.

Quando lhe chegou às mãos um artigo sobre o fim da Polaroid, resolveu finalmente adquirir uma câmara, antes que não tivesse oportunidade para usá-la. Escolheu uma Polaroid 600 com Autofocos, usada, numa pequena loja de equipamentos fotográficos antigos, em Paris.

Foi o resultado desta experiência, as fotos, pelas quais ficou “apaixonado”, que o fizeram criar o blog. “Tive vontade de mostrar as minhas Polaroids e contar a história de cada uma delas. E o blog é o formato ideal para expor o meu trabalho”. Confrontado com a provável efemeridade da marca, garante que fez “um grande estoque de filmes”. As razões que o fizeram morrer de amores pela Polaroid são partilhadas por milhares de fãs, um pouco por todo o globo. Só no Facebook são cerca de 10 mil. “A simplicidade de uso é incrível! Basta abrir a câmara e clicar. Cada cartucho contém apenas dez Polaroids, é preciso pensar bem antes de fotografar para não desperdiçar a foto. O número reduzido de tentativas ajuda a desenvolver a visão e criatividade do fotógrafo. Adoro ver a imagem a revelar-se nas minhas mãos e o melhor de tudo é saber que aquela foto é única. Só eu tenho a original.”Quer tenha continuação ou não, a Polaroid já alcançou o lugar de lenda viva da história da fotografia. A sua tonalidade azulada e luminosidade esbatida imprimem, em cada imagem, um estatuto de memória e apelam a uma simplicidade e robustez intemporais”.

“Don’t undertake a project unless it is manifestly important and nearly impossible” – Edwin Land.



Existem 11 comentários

Add yours
  1. profanArte

    O filme instantâneo está moribundo, oficialmente, declarado morto. Pelo menos no que toca, ao ícone Polaroid (embora à espera d'aquele milagre). No entanto, como em muitas coisas da Vida, temos que ir ao encontro delas. Se o desejamos realmente, é o que fazemos. Pois foi o que fiz, depois de tantos anos com a minha Polaroid a decorar meu studio em casa. Só lhe voltei a pegar, quando percebi que o seu alimento já não era motivo de cultivo. (típico, não? talvez). Apesar de ter pegado nas novas tecnologias fotográficas, novas ferramentas, nunca larguei o analógico. Mesmo tendo passado por situações, em que ficavam a olhar-me com estranheza. Pois no momento do "deixa ver como fiquei… : )". Acho que conseguem imaginar a coisa. Felizmente tenho conseguido, a custo de ginástica orçamental, alimentar as minhas Polaroids. Sim, para ajudar, ainda comprei outra, mais clássica do que a que já tinha à mais de dez anos. O porquê desta paixão pela fotografia instantânea?! Porque é ímpar o sentimento de fazermos um parto fotográfico. Porque não existe maior felicidade que ouvir meu Filho pedir, para tirar uma fotografia mágica. Porque… até tem cheiro. Porque… sim. Obrigado pelo vosso artigo, por este vosso espaço.

  2. DiNobrega

    Joana, penso que o mais fácil é comprares através da net…no entanto, os preços estão avultados nos dias que correm…
    Será que a nossa paixão pela Polaroid é uma tentativa de agarrar o passado, a forma como o mundo está a mudar tão rapidamente?…eu acho que sim.

  3. rita

    Também tenho uma 600 comprada em 87 (a minha mae ofereceu-me quando eu fiz 6 anos!!!) na altura gastava as fotos com o meu cágado de estimação!!!literalmente!
    Consegui comprar alguns cartuchos antes que esgotassem mas agora até me dá pena usar, sem saber quando vou conseguir voltar a comprar mais.

    A Urban Outfitters em Londres em conjunto com o Impossible Project têm um movimento para "salvar " estas nossas amigas…

    http://www.urbanoutfitters.co.uk/Projects/Saved-Polaroid/page/polaroid

    http://www.the-impossible-project.com/


Post a new comment

Pin It on Pinterest

Share This