“Romanzo di una strage”
Uma democracia morta acidentalmente
O Cinema São Jorge recebeu no dia 21 de Março o filme que deu início a oito dias dedicados, em Lisboa, de inúmeras formas, ao Cinema italiano. Dos clássicos dos anos setenta ao que de melhor se fez na última temporada, e fazendo uma homenagem ao quinquagésimo aniversário de duas obras atemporais, estas são apenas algumas das muitas e variadas razões para não perder pitada da 6ª Edição de 8 1/2 Festa do Cinema Italiano.
Passaram-se quarenta e três anos desde aquela infeliz tarde de Dezembro em Milão. Mais precisamente, quarenta e três anos em que a justiça se viu impotente e não conseguiu atribuir responsabilidades sobre o massacre da Piazza Fontana. Contudo, segundo as palavras de Pasolini, a verdade existe e é uma verdade que tem cheiro a julgamento, com o qual o sistema de justiça italiano não tem sido capaz de lidar.
O realizador Marco Tullio Giordana sabe que, por vezes, não é necessária nenhuma prova ou evidência, o que é necessário é o bom senso ser guiado pela história. “Romanzo di una strage” é exemplo disso mesmo. Um filme surpreendentemente rigoroso que minimiza os elementos espectaculares de forma a envolver o espectador num movimento contínuo por uma história que não conhece limites.
O filme é dividido em vários capítulos, cada um destacando eventos específicos que trazem alguma clareza face o enigma que se tornou a explosão na Piazza de Fontana – quarenta e três anos depois ainda não há culpados, oficialmente, e todos os acusados têm sido absolvidos. O trabalho de pesquisa por detrás do filme é incrível e toda a informação apresentada, ao longo das suas duas horas de duração, surge com um admirável sentido de equilíbrio.
A recriação da atmosfera que envolvia o País é bem conseguida. As ideias que inspiraram comunistas, fascistas e anarquistas são facilmente identificadas. Mesmo quem não detém um vasto conhecimento sobre a política italiana da década de 60 e 70 não terá qualquer dificuldade em compreender os dilemas que as variadas personagens enfrentam ao longo do filme.
A acção presta também uma atenção necessária ao envolvimento e importância histórica de algumas figuras políticas de maior destaque. Como exemplo disso temos Moro, o homem que acabaria por ser tornar o trigésimo primeiro-ministro italiano e que mais tarde seria executado pelas Brigadas Vermelhas.
Como cereja no topo do bolo, o realizador presenteia-nos um intrigante terceiro acto. Nele são apresentados inúmeros cenários possíveis que tentam explicar de onde terá vindo a ordem final. Alguns relacionam importantes personalidades que poderiam estar a manipular peões à distância. Entre os que fazem sentido e os que não passarão de mera especulação, muitas serão as sobrancelhas arqueadas.
O resultado final não poderia existir sem o trabalho exímio dos seus actores. Pierfrancesco Favino, excelente no papel de Guiseppe Pinelli, acompanhado por uma intensa e talentosa Michela Cescon. A forte interpretação de Denis Fasolo e Giorgio Marchese, enquanto Franco Freda e Giovannin Ventura, respectivamente. De frisar ainda o trabalho de Fabrizio Gifuni ao retratar o peso e sofrimento por detrás de Aldo Moro.
“Romanzo di una strage” pode não ficar para a história do Cinema italiano, mas pelo menos tem a força e a coragem de expressar, de forma elevada, uma história onde o passado ainda pesa no presente.
Outras sessões:
Coimbra | 2 abr | 21.00 | Teatro Académico Gil Vicente
Porto | 7 abr | 21.30 | Cinema Passos Manuel
Funchal | 14 abr | 21.30 | Teatro Municipal Baltazar Dias
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