ROMEU E  JULIETA_Mário Tavares_HEADER_03102011

Romeu e Julieta

“Is everybody in?”, pergunta-nos Jim Morrison. “Romeu e Julieta” tem direito a narrador sob o efeito de ácido.

Não estamos todos já fartos (ou desacreditados) do cliché de Romeu e Julieta? Já não se acredita nessa personificação, nos dias que correm. Talvez o amor esteja em crise, ou simplesmente em desuso, ou erroneamente, por vezes, seja demasiado metafórico. Chegamos ao ponto da inqualificável qualificação do amor. “O amor é isto e nada mais”. É essa a trip que nos propõe esta encenação de João Garcia Miguel, readaptando “Romeu e Julieta”.

“Eu quero uma mulher”, diz Romeu. E essa mulher acaba por ser Julieta, como já todos sabemos. Pois, ao que parece Romeu e Julieta diziam palavrões e ironizavam. E ali, naquele cenário minimalista, pareciam vultos de si mesmos, de um homem e de uma mulher. E são estes os dois focos que a encenação marca: o homem e a mulher. Ele é Romeu, assim como representa toda a sua família; e Ela, é Julieta, sua família, e também encarna Jim Morrison em tom de narrador. Na realidade estes podiam ser qualquer homem e qualquer mulher, apenas escolheram manter o nome de Romeu e de Julieta. Mero acaso.

Ao longo da história, que apesar das trivialidades vai sendo a mesma, vamos levando algumas chapadas na cara. Vamos sendo levados entre o balanço e os empurrões que o clássico e o contemporâneo vão dando um ao outro. Assistimos a um baile de máscaras e ao frenesim que aqueles humanos vivem. Tocam-nos, beijam-nos, andam no meio de nós. Eles, que estão loucos, perdidos de amor, querem contaminar-nos. A luz, os sons e o movimento dos actores, criam uma ambiência muito cúmplice e forte. A música vai-se assumindo como uma componente narrativa. Gemem, estão ofegantes. Ousam em beijar-se. É ensurdecedor o amor de ambos! Transmitem-nos sexualidade através do corpo, da voz, por todos os poros, por todas as extensões dos seus corpos. A sua linguagem é lasciva e desejosa. Os escassos diálogos fazem-nos sentir, em carne crua, a pulsação daqueles corações. A performance do amor. Julieta e Sara Ribeiro, é intensa. Apaixonámo-nos por ela, porque nos olha nos olhos. Romeu e David Pereira, é o seu espelho.

Surgem-nos Jim Morrion e Jimi Hendrix, como fantasmas. Os químicos do mundo, os heróis do ácido e do sexo. Afinal a universalidade é isto mesmo, a identificação. Quem mete ácidos não pode amar? Bem. Já não estamos todos intoxicados? Ao menos que o amor nos salve, ou nos afogue. Mas que nos faça sentir que ainda respiramos. E eis que Romeu diz: “é por amor que bebo isto” (há partes que se mantêm as mesmas) e faz-se silêncio, pela primeira vez ao longo da peça. Heis que surge o momento em que os dois focos se misturam. E morrem. Como qualquer amor morre um dia.

Afinal o amor é cegueira, é feitiço, loucura, castração, morte, vómito, sangue. São facadas, e não importa se é com uma faca da cozinha. Amar é regurgitar e voltar.

O amor devia castigar os maus e recompensar os bons. Mas afinal o amor é para todos. Fucking Love.

Companhia de João Garcia Miguel
Texto adaptado de William Shakespeare
Encenação| João Garcia Miguel
Actores| Sara Ribeiro e David Pereira Bastos
Música e Vídeo| Rui Gato
Figurinos| Steve Denton
Direcção Produção| Filipa Hora
Produção| JGM Unip. LDA,
Co-produção| Teatro Cine Torres Vedras

Espaço do Urso e dos Anjos, de 5 a 30 de Outubro às 21H de 4ª feira a Domingo



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