RQ#6 A última obra-prima de AARON SLOBODJ

A última obra-prima de AARON SLOBODJ.

José Carlos Fernandes é considerado, por muitos, um dos maiores experimentalistas da banda desenhada portuguesa e, na “última obra-prima de Aaron Slobodj”, editada pela Devir em 2004, volta a sublinhar essas palavras. Apesar de esta obra não ser considerada por muitos como banda desenhada, não foi por isso que deixou de arrecadar o prémio FIBDA para melhor argumento de autor português em 2005.

O livro começa com uma introdução e notas biográficas sobre Aaron Slobodj, um suposto artista mais apaixonado pela destruição do que pela criação e, por isso mesmo, muito poucas foram as suas obras recuperadas, tratando-se de um verdadeiro desconhecido para a população em geral.

O universo imaginário que J.C. Fernandes criou em volta desta personagem está muito bem conseguido e a vida deste artista, quer acreditemos que ele era um génio ou uma fraude, é uma estória extremamente atractiva, é como se ele tivesse realmente existido.

Mas J.C. Fernandes não se limita a criar a estória da vida de Aaron Slobodj, criando também estudiosos na vida deste artista que chegam a acusar o próprio J.C. Fernandes de uma má abordagem em relação ao modo como tratou neste livro a última obra encontrada do artista, que dá pelo nome de Big Bang. Falo do texto escrito pelo professor Zacharias Sontag em que este aborda o artista numa perspectiva maior, preenchendo alguns eventuais erros na introdução e pesquisa biográfica feitas por J.C. Fernandes, e do texto final em que nos deparamos com uma carta supostamente escrita pelo Dr. Edgar Snorkel (crítico de banda desenhada) em que avisa que “a última obra-prima de Aaron Slobodj”, não passa de uma falsificação, acusando (in)directamente J.C. Fernandes de ser o falsificador.

Mas falando da obra em si, em que consiste afinal? J.C. Fernandes apresenta-nos um conjunto de 38 imagens e 38 fragmentos de texto, que Aaron Slobodj teria enviado para vários endereços, antes de morrer. Reunidos todos os fragmentos, temos “a última obra-prima de Aaron Slobodj”. Nesta obra redescoberta fica o desafio de encontrar um sentido para as imagens e texto. O próprio livro está construído para que possamos associar qualquer imagem a qualquer texto da forma que quisermos, e aqui entra também uma grande componente da imaginação de cada um (ou não).

Refere-se na introdução feita pelo professor Zacharias Sontag, que a ideia de Slobodj não seria apenas usar combinações de texto e imagem, mas também entrar com a componente do espaço, daí ter enviado para diversos endereços uma imagem e um pedaço de texto, relembrando que diferentes imagens e textos podem ter diferentes interpretações consoantes o país onde estão. É toda esta mística criada por J.C. Fernandes à volta de Aaron Slobodj que mais me fascinou neste livro.

E agora saindo um pouco do mundo imaginário de Aaron Slobodj (como se fosse possível), e discutindo se de facto as 38 imagens fazem algum sentido com os fragmentos de texto, é uma escolha que deixo ao leitor, claro que (como é referido) uma das ideias do autor pode ser a de simplesmente não ter sentido nenhum.

Concluindo, trata-se de uma obra bastante inovadora e experimental, não aconselhada a pessoas sem sentido de humor e principalmente sem imaginação (ou vice-versa).



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