Conversa com SILVA
Nem só de samba e sertanejo vive o panorama musical brasileiro
Nos últimos anos surgem novos nomes com influências alternativas vindas da Europa e do Norte da América e que acabam por se enquadrar magistralmente nas ondas da cultura musical brasileira. Os ingredientes: juntem um pouco de um disco de Marcelo Camelo, Mallu Magalhães, Washed Out ou James Blake. Misturem tudo numa liquidificadora e a junção experimental resulta num conjunto de canções que não são em nada pretensiosas de americanismos. Mais do que a identificação linguística, são as emoções positivas e o carácter legâu que as suas músicas transmitem e que os nossos ouvidos agradecem.
Lúcio Silva de Souza tem o apelido mais comum do mundo e decidiu dar-lhe ainda um maior destaque quando o escolheu para denominar o seu projecto a solo. “No início pensei em fazer uma banda, mas como não encontrei músicos na minha cidade que estivessem dispostos a gastar o seu tempo com o projecto, decidi fazê-lo sozinho e acabou por ficar só SILVA que é mesmo o meu nome do meio” confessou-nos.
O jovem músico tornou-se automaticamente um nome reconhecido através da blogosfera europeia, apenas com um EP editado no ano passado, e não o pouparam em elogios. Por e-mail, atravessámos o Atlântico, interrompemos os ensaios e chegámos à conversa com o próprio SILVA.
De que forma é que a música entra na tua vida?
Diria que de forma integral. A minha mãe colocou-me numa escola para estudar música bem cedo, então não consigo lembrar-me de algum tempo na minha vida em que eu não estivesse envolvido com música de alguma forma.
Tiveste algum projecto musical antes? Ou sempre fizeste as tuas próprias composições?
Participei de alguns projectos. Toquei numa banda de amigos da escola, numa banda de baile e em algumas orquestras. Também produzi bandas na minha cidade, mas só agora resolvi fazer um trabalho meu.
Também li que estiveste na Irlanda… O que andaste por lá a fazer? E de que modo é que essa vivência te influenciou enquanto músico?
Eu fui para Dublin estudar Inglês e para aprender alguma coisa da cultura deles. Quando lá cheguei, o país mergulhava no auge da crise económica e não havia emprego. Entretanto conheci por lá um baterista brasileiro que me convidou para participar numa banda que se apresentava nas ruas, o que me parecia um pouco assustador, mas acabei por aceitar. Foi com certeza uma das melhores épocas da minha vida. Éramos seis músicos: um irlandês, um espanhol, um checo e três brasileiros. Com esta experiência tive a possibilidade de estar em contacto com muitos ritmos novos e aprendi a improvisar bastante.
Entretanto lançaste um EP com 5 músicas apenas e que está a dar que falar (positivamente). Conta-nos como foi o processo de composição e sobre as tuas inspirações.
A primeira música que escrevi para esse EP foi «A visita», que fiz no final dessa temporada em Dublin e estava bastante influenciado pela música Irlandesa. Quando voltei para o Brasil tive que continuar o meu curso de violino na universidade e o EP foi sendo criado nesse meio tempo, por isso demorou a sair. No final do ano conheci um produtor no Rio de Janeiro que me convidou a gravar umas faixas no estúdio dele e assim foi feito. Fui descobrindo muita música e géneros que ainda não conhecia e a minha própria sonoridade foi-se alterando desde então.
E de que forma é que chegas a Matt Colton (produtor dos álbuns de James Blake)? James Blake é uma referência para ti?
Eu andava à procura de um técnico para masterizar o EP e apurei que o Matt Colton havia feito vários trabalhos que eu admirava muito. E o processo acabou por ser simples: enviei-lhe o EP e ele gostou muito do resultado. O James Blake é uma referência sim, desde os trabalhos mais antigos de dubstep aos trabalhos mais recentes.
Vi algumas fotos dos teus concertos no Facebook e o ambiente parece ser de muita animação. Como têm corrido estes espectáculos? As pessoas têm gostado? E ser convidado para tocar no festival Sónar, em São Paulo, no mesmo palco que Mogwai e o próprio James Blake é um “sonho”?
Por enquanto só toquei duas vezes no Rio de Janeiro. Esses foram os meus primeiros concertos e estava bastante ansioso. Acho que correu bem melhor do que eu esperava e ouvir as pessoas cantando as minhas músicas foi uma autêntica surpresa! Sobre o Sónar, eu também estou muito ansioso! Sou grande fã de vários artistas que vão se apresentar!
Estavas à espera de que o teu trabalho se tornasse tão falado na Europa, ou pelo menos em Portugal? O que é que conheces de Portugal (em termos culturais / projectos músicos?)
Fiquei profundamente surpreso quando soube que em Portugal estavam a ouvir minhas músicas. Não esperava que o som fosse atravessar o Atlântico e também não imaginava como iria ser recebido. Com certeza que é bom receber críticas positivas, mas isso também traz uma certa responsabilidade. Em relação ao que conheço da cultura musical portuguesa, quando mais novo ouvia (e ainda ouço) a Maria João Pires, que é uma pianista que gosto bastante. Mas também admiro muito a literatura portuguesa. Recentemente li “Caim” do José Saramago e foi um livro muito marcante para mim.
Quanto a projectos para o futuro, estás a preparar um novo disco? Pretendes seguir as influências do EP ou vais fazer algo completamente diferente?
Sim, neste momento encontro-me a escrever e a produzir músicas novas e acho que até Julho já vou ter o disco pronto. A sonoridade está um pouco diferente, mas não se nota muito. Tenho sido bastante influenciado pela música eletrónica e acho que o trabalho está tendendo para isso de alguma forma.
“SILVA” é também o nome do EP. Composto por cinco músicas, está disponível para download gratuito aqui. Trata-se de canções reinventadas a cada nota que passa, sem floreados e rodeios, dançantes e embaladoras. Composto ao longo de cinco meses, este EP é a prova do seu grande talento, como se se tratasse do primeiro capítulo de um livro de maravilhas e que certamente se continuará a revelar num próximo trabalho.
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