O fim da trilogia
"Something STILL Uncaptured", uma performance de Maria Ramos
Num ambiente intimista, o Teatro do Bairro abriu as portas a esta performance onde a imobilidade como expressão é o conceito e o espaço é o corpo. A descoberta dos movimentos escultóricos tem como base a reflexão do corpo face aos estímulos sonoros e visuais, que conta com a participação das bailarinas Marta Cerqueira e Benedetta Maxia.
Maria Ramos trabalha desde 1995 como bailarina em Portugal, Holanda, Alemanha, Inglaterra, Escócia e EUA. Iniciou o seu trabalho de pesquisa e criação coreográfica em 2006 com “Um Certo Grau de Imobilidade”. A primeira das três performances deste projecto 7pm/rumour (loose in the air) teve a sua estreia em 2009, seguindo-se Nerves like Nylon, dando agora como terminada a trilogia com a performance Something STILL Uncaptured.
Em conversa com Maria Ramos, revela: “Este trabalho não tem uma narrativa, não foi construído tendo como base uma obra literária em que o tempo da peça ecoa o pulsar da palavra, da pontuação, do subtexto, que foi de onde os meus trabalhos anteriores partiram, embora as três peças foquem a mesma linha de investigação: a de que uma construção coreográfica pode potenciar movimento se contiver um certo grau de imobilidade, abordando a relação entre dança e escultura, procurando reflectir sobre o corpo enquanto elemento escultórico.”
“Gosto de pensar nesta peça como uma paisagem em que as acções se vão formando à medida que são accionadas, activadas e vividas pelas intérpretes, pelo público. São esses acontecimentos, essas acções, essas paisagens cénicas, que articuladas entre si, formam, se quisermos, uma narrativa.”
Duas bailarinas em palco, o espaço enquanto descoberta do corpo, o som que se desenvolve enquanto frequência e os reflexos face aos estímulos completam esta performance de imensa carga visual, onde a escultura se funde com a dança e onde as intervenientes revelam uma construção gradual no espaço vazio.
“ao longo do processo de trabalho fui-me apercebendo que esta peça era composta por elementos que tinham o seu tempo próprio. O tempo que a peça começava a tomar não dependia apenas da minha percepção exterior, mas do tempo que esses elementos demoravam a instalar-se, a formar-se e a desenvolver-se. As acções em palco seguem este princípio, a peça queria ganhar o seu tempo, o seu tempo real, natural, e isso acabou por definir a estrutura e a composição do trabalho.”
Também a plateia é parte deste espaço escultórico e sonoro através de uma intervenção involuntária e inconsciente de introdução do som. Estamos sentados em cadeiras de papel que ao mais pequeno movimento se manifestam complementando os sons e vibrações que ecoam na sala.
O trabalho de som a cargo de Francisco Salgado bem como o desenho de luz da responsabilidade de Vinny Jones são muito bem conseguidos levando-nos para um universo pouco estático onde é a imobilidade nos transporta.
“Queria fazer uma peça não para ser vista, mas para ser contemplada. Queria que a peça fosse experienciada/percepcionada/vivida pelo público como uma paisagem em acção que se vai sucedendo de um rochedo para uma planície, de uma árvore para um arvoredo, de uma arriba verde para uma falésia de xisto. No fundo a narrativa deste trabalho é potenciada pela duração natural que cada acção, cada elemento, leva a formar-se no espaço pelo adensamento da atmosfera, literal e metaforicamente falando, na medida em que, neste trabalho o espaço é explorado/percepcionado também como um corpo.”
A carga visual é densa e sentimo-nos a emergir, tal como uma nuvem num espaço negro, sugados para um universo redentor. Tal como na base da vida contemporânea, somos aqui transportados para a realidade abstracta em que vivemos, de onde ao mesmo tempo queremos sair mas ao faze-lo, é o habitual conforto que nos faz regressar.
Something STILL Uncaptured obteve apoio financeiro de Governo de Portugal / Secretário de Estado da Cultura – Direcção Geral das Artes.
O fim desta trilogia serve também para Maria Ramos como base para a sua próxima Performance/Instalação que acontecerá no dia 7 de Dezembro – Carpe Diem Arte e Pesquisa, no âmbito do Festival TEMPS D’IMAGES em Lisboa.
Para já Something STILL Uncaptured pode ser visto no Teatro TEMPO, em Portimão a 16 Novembro.
Fotografia de MRamos/JSobrinho
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