“The Dying Draughtsman / O Desenhador Defunto” | Francisco Sousa Lobo

“The Dying Draughtsman / O Desenhador Defunto” | Francisco Sousa Lobo

Uma viagem intimista sobre a queda e o significado

O ano de 2013 encerra com aquela que promete ser uma das suas propostas mais interessantes de BD: “The Dying Draughtsman / O Desenhador Defunto”, de Francisco Sousa Lobo.

Em “The Dying Draughtsman” seguimos Francisco Koppens, um imigrante português em Londres, numa viagem intimista onde a personagem vai mergulhando cada vez mais num estado que tem tanto de depressivo como de paranóico. Viagem essa que parece conter elementos auto-biográficos que se misturam com outros ficcionais, deixando-nos na dúvida em relação aonde começam uns e terminam os outros.

Apesar de, ao longo da narrativa, seguirmos Koppens na sua idade adulta, encontram-se bem explícitas algumas das razões que o encaminharam a tornar-se no homem que é hoje. Houve determinados elementos na sua infância, como a religião e a maternidade, que o marcaram de forma crucial, levando-o a desenvolver uma personalidade frágil, que hoje não consegue escapar a uma auto censura cada vez mais claustrofóbica. Estes sentimentos enclausurares afundam-no cada vez mais numa existência sombria e apática, que começam não só a colocar a sua vida profissional (arquitectura) em perigo, como também a sua própria sanidade. Nem na sua vida familiar encontra refúgio e segurança, uma vez que a mulher há muito que não lhe dirige palavra. Koppens está, para todos os efeitos, sozinho e isso reflecte-se em toda a sua identidade.

“The Dying Draughtsman / O Desenhador Defunto” | Francisco Sousa Lobo

Algo que se mantém constante na sua vida, tornando-se até numa obsessão, são as suas constantes visitas às galerias de arte de Londres. Uma vez que se trata de um estranho no mundo da arte contemporânea, acaba por tecer considerações grosseiras, contudo, nunca deixando de se questionar sobre aquilo que observa, partindo numa busca incessante por respostas que acaba por nunca encontrar.

Em relação a estas obras de arte usadas nesta BD, são baseadas, na sua maioria, em trabalhos expostos pelo próprio autor, o qual afirma que procurou tornar-se num marionetista do seu próprio passado, à semelhança das caixas de Marcel Duchamp. Se Duchamp havia descontextualizado e recontextualizado os seus trabalhos através da fotografia, Sousa Lobo fá-lo agora através da BD. Esta mistura entre as linguagens da BD e das artes plásticas é também um espelho que reflecte os interesses e trabalhos do autor, que aqui as trabalha como duas artes que podem funcionar em perfeita simbiose, apesar de, ainda hoje, serem muitas vezes separadas à força e injustamente.

Quanto ao desenho de Sousa Lobo é muito simples, servindo-se apenas de traços negros e de um tom rosa para nos transmitir toda a carga emotiva inerente à obra, algo que o autor consegue de uma forma tanto prática como eficaz. Se não contarmos com os traços a negro, a opção pela coloração com rosa, além de adicionar uma carga emotiva, acaba por conter alguma ironia, uma vez que o protagonista sofre de uma fobia em relação a artigos monocromáticos.

O livro está escrito em inglês, mas contém em cada prancha as respectivas falas em português (daí os dois títulos). Como o responsável pela escrita nas duas línguas foi o próprio autor, sente-se uma grande liberdade na escolha em determinadas “traduções”, razão pela qual vale a pena espreitá-lo nas duas línguas. No final, como extra, o livro contém uma conversa entre o autor e Hugo Canoilas, que ajuda a desbravar algum do caminho traçado por esta obra enigmática.

“The Dying Draughtsman” é assim um trabalho relativamente experimental e de procura, onde se denota, por parte do autor, uma vontade em explorar linguagens para contar esta história sobre queda e significado. Neste caso, mais importante talvez do que as respostas que se possam encontrar, seja o próprio caminho percorrido pelo autor, que parece ter uma imensa vontade de retirar algo do seu peito para colocar cá fora.



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