CA Vilar de Mouros 2023 | Dia 4 (26.08.2023)
Uma última noite de (a)deus(es)
Lotação esgotada para nos despedirmos convenientemente de Vilar de Mouros. 70 mil pessoas passaram pelo festival que, para o ano, continuará a ter quatro dias.
Dissemos adeus a Vilar de Mouros, mas não queríamos… Foi um adeus forçado, mas, sobretudo, esforçado, graças às enormes filas que se criaram, tanto para estacionar como para entrar. Lotação esgotada assim o exigia, mas o entusiasmo não esmoreceu… ou não estivéssemos perante um último dia pejado de nomes sonantes e que pareceram nascidos para tocar junto ao rio Coura, entre pó e rio, entre vila e trânsito e supermercados improvisados no meio de um campismo a saber a férias de verão.
Tudo certo, portanto. Fora o horário atribuído à primeira atuação da noite. Peaches entrou em palco ainda raiava alto o sol, uma violência para os pobres miúdos que acompanhavam os pais e, certamente, nunca viram tantos seios como nesse dia.
É que Peaches é sempre assim: choca, ocupa espaço, não pede desculpas. Chegou, magistral, ao palco vestida de seios e acompanhada de duas bailarinas vestidas de vulva. Perfeita apresentação para o que se seguiria. Nunca ninguém está preparado para Peaches, o ícone feminista que faz questão de provocar mas nunca em vão. Entre sessões alternadas de strip e outfits que deixavam pouco ou nada à imaginação, as mensagens que sempre faz ecoar qualquer que seja o palco em que se apresente: a proibição do aborto é para condenar, os direitos trans são fundamentais, as drag queens salvam vidas e o mundo é de quem não tenha medo de nele viver, em toda a sua plenitude.
E se bem o cantou, melhor o fez, saltando logo para o público, entre espargatas e ameaças de cancelamento a quem empunhava um telemóvel em vez de a auxiliar no seu stage dive.
Entre os presentes, o choque dos menos avisados rapidamente deu lugar à apoteose. O furacão Peaches converte qualquer um, mesmo que não se saibam as letras… Coisa que não se verificou, claro está, no maior êxito: «Fuck the Pain Away» parecia destinada ao culminar deste orgasmo musical, mas acabou por ser a penúltima canção do concerto: antes de nos abandonar, já em êxtase, explicou-nos o que ali andou a fazer, ao som de «Private Dancer», numa cover perfeita de outro ícone admirável, Tina Turner.
Como raio foi este o primeiro concerto do dia? Não sabemos, mas sabemos que, de seguida, entraria em palco outra mulher poderosa, pelo que até perdoamos o alinhamento.
Sandra Nasic e os Guano Apes tiveram a ingrata tarefa de “encher chouriços” depois do apogeu Peaches e antes dos esperadíssimos James e Ornatos Violeta. Se fosse outra banda a coisa iria, certamente, descambar, mas a organização escolheu bem: a banda alemã é o equilíbrio perfeito entre este dois mundos que têm muito pouco em comum e, cereja no topo do bolo, faz parte da História do festival – esteve presente na sessão de regresso, com os lucros a reverterem para uma excelente causa.
Memórias aparte, os Guano Apes não trouxeram até cá nada que já não conhecessemos. Já são quase da casa, afinal de contas. Fora os habituais êxitos de «Open Your Eyes», «You Can’t Stop Me», «Lord of the Boards» e a cover «Big in Japan», pouco mais há a salientar.
Quem também já não é desconhecido de Vilar de Mouros é Tim Booth. Aliás, os James são outros “adotados” do público português, que arrastam sempre multidões para todos os concertos. Mais melódico mas não menos efusivo, este concerto foi, para muitos, o ponto alto do festival. Mais de 40 concertos por terras lusas chegam para nos escusarmos de passar em revista a playlist ponto a ponto, mas «Sit Down» e «Sometimes» bastariam para deixar todos contentes, sejamos honestos.
O fim da noite – e do festival – estaria reservado para a prata da casa, mas não seria menos emotivo por causa disso. Os Ornatos regressaram aos palcos depois de perderem o teclista Elísio Donas e o espetáculo acabou por ser uma justa homenagem do princípio ao fim.
Os acordes intemporais da banda portuense também dispensam grandes apresentações, mas ouvir «A Dama do Sinal», «Punk Moda Funk» ou «Dia Mau» ao vivo é sempre uma oportunidade que ninguém quer perder (até porque, com eles, nunca sabemos se não será a última…). A magia, no entanto, estaria reservada para a mais icónica de todas: «Ouvi Dizer» foi cantada a plenos pulmões por 25 mil pessoas – recorde absoluto para o festival -. Palavra por palavra, 25 mil almas fizeram questão de mostrar que, passem os anos que passem, esta é, sem dúvida, uma das músicas mais icónicas do rock alternativo português. Querem melhor maneira de acabar um festival?
Se 25 mil pessoas estiveram em Vilar de Mouros no último dia, 70 mil passaram por lá no total, números que, talvez, expliquem a aposta da organização em manter o formato quatro dias. Para o ano há mais!
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Leiam aqui a reportagem do primeiro, segundo e terceiro dia de festival.
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