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Vodafone Mexefest

A Vodafone mexe e a Avenida encolhe!

Num cartaz repleto de hipóteses de itinerários, difícil seria não mexer – muito. Avenida da Liberdade fora, com alguns desvios periféricos incluídos, o passado fim-de-semana foi um reboliço esgotado de boas e menos boas surpresas, confirmações e desilusões, faltas e tropeções – Vodafone Mexefest.

Para trás e para a frente, para cima e para baixo, os dias 2 e 3 de Dezembro serviram bem para esquecer as conversas económicas que ocorrem toda a santa-luz-do-dia. “Futebóis” e crises à parte, à noite a malta é festivaleira, os passes esgotaram, e as bandas esfregaram-se de regozijo, contra algumas previsões (coerentes) desta quadra de “sacrifício”.

Está então mais que visto que o que faz falta é “Mexe”, e esquecer as agonias. E foi assim, energia e moral contra-marés, que se deram início às festividades, em 2 dias, 15 espaços e 47 concertos. (De antecipar que a omnipresença da imprensa não é diferente da de ninguém, e que quatro membros e dois ouvidos não fazem milagres, nem praticam teletransporte).

Dia 2

Começámos por querer apanhar o mesmo autocarro que os Salto, no Vodafone Bus I. Má escolha. Mesmo que estes nos tenham suscitado alguma pré-curiosidade, não adivinhavam o mau início que iríamos ter, nós e eles. “Avaria técnica”, justificou um colaborador do festival, já posicionado no Bus II, e assim perdemos a boleia e ficámos na mesma.

Sem desmoralizar, fomos elevar as primeiras impressões ao Restaurante Terraço do Hotel Tivoli e, já agora, conhecer Julie & The Carjackers, numa vista privilegiada que, abençoado festival, só por si e sem desmérito à banda, valeu uma subida demorada de 11 andares e uma descida (quase) impossível de multidões.

A música é indie, pop, bossa e fresca. Os seus criadores são João Correia e Bruno Pernadas e “Parasol” é o álbum de estreia que bem representaram, com ponto alto em «Mr Williams» e na varanda-sala-de-fumos que serviu uma banda sonora grata pelo cenário à altura.

Ainda agora tudo começava e os Farra Fanfarra já faziam aquecer o alcatrão com toda aquela energia contagiante de saltimbanco, de bombos e pratos em punho, música do mundo todo e festa que penetra nas veias dos que se lhes atravessam. Foi no Vodafone Bus II, e foi na rua, e foi por todo o lado.

Já se começava a entranhar a correria quando fomos espreitar Bebe à sala 1 do São Jorge. Confirma-se: a artista espanhola do pop condimentado tem genica e irreverência (e pernas) q.b. para continuar a fazer mais e melhor (ou parecido), desde que se apresentou, em 2005, com “Pa Fuera Telerañas”. Para isso não precisa de ninguém, mas a participação do seu pai no tema «Ska de la Tierra» ficou-lhe, no mínimo, bem.

Não querendo arriscar (calejo de outras edições, as mesmas portas fechadas), seguimos para o Tivoli, em busca de Handsome Furs. Cortámos passadeiras pela ponte vermelho-Vodafone, erguida sob a avenida em exclusivo para o festival, e aterrámos num concerto (ainda) menos assediado do que esperado.

Pelo menos nas entradas que, afinal, foram-se atestando pelo meio, até tomar contornos dignos do casal canadiano – a teclista Alex Perrey e o guitarrista Dan Boeckner, este também encarregue das vocalidades mais “arrocalhadas”. Muito a jeito do fervorismo electrónico dos anos 80, o par não releva nada de essencialmente novo, mas conduz uma atitude heroin-chic que fica sempre bem (pelo menos para os fãs de toda uma história de música genial composta sob efeitos genialmente exacerbados).

O electro-pop-rock de “Sound Kapital”, o seu mais recente álbum lançado este ano, foi todo ele concebido com teclas e evoca sonoridades explosivas da Europa industrial do século passado, afastando agora o casal do seu indie rock de estreia. Os Handsome Furs não são maus.

Mas a expectativa, perdoe-nos o casalinho, ansiava o próximo concerto. Junior Boys, na mesma sala, valeria a espera entre concertos. Ou não.

Ouviu-se “Mas afinal o Junior Boy é este senhor gordinho de camisa aos quadrados?”. Pois era. O “senhor gordinho”, Jeremy Grenspan, é dono de uma senhora voz, permeável e “premiável”, e toca guitarra, e manuseia teclas (falará francês?), tudo bem, de camisa aos quadrados.

Com isto dizer que a estética dos Junior Boys não influenciou o sucesso de “Last Exit”, o primeiro do duo Grenspan e Matt Didemus – engenheiro das máquinas e teclados de serviço, que anda a encantar desde 2004, sem ver a formas ou medidas. Mas certo é que ouvir sem ver pode desiludir alguns fãs, daqueles que concebem os ídolos à sua imagem.

Depeche Mode surgiram no imaginário (a saber: porquê?), mas surgiram – por breves acordes, mais sentidos durante «So This Is Goodbye» (2006), e sempre com retorno à pop cansada, porém inconfundivelmente cantada, dos juniores.

Nota: Nunca esperar demais.

Antes de mais comentários indutivos, não poderíamos deixar passar Spank Rock sem se fazer assistir (por nós). E fomos, em direcção ao Maxime, para um início de fim de noite que prometia um desfecho feliz.

A começar pelo fim, que já chegámos a meio, Naeem Juwan, o MC desvairado, rematou com uma das nossas favoritas, «Car Song». Sem a voz presencial de Santigold, mas cheio de vontade de se entrosar público adentro, foi o que fez, de adeus em pirueta, com aterragem na muito contente plateia do Maxime.

Vão no segundo álbum, “Everything Is Boring And Everyone Is A Fucking Liar”, uma hipérbole quase realista dos dias que correm, e dos que já correram, e apresentam-se envoltos de um Rap electrónico que os leva ainda mais longe em rótulos – o rock também lhes corre, mas não se ficam por aí.

Foi uma dinâmica Spank/público bonita de se ver, eufórica de se dançar, inspirada também por acertadas parcerias (Boys Noize, N.A.S.A e Pharrell Williams são só algumas), e até se acabava por ali, não fosse o apelo vindo da Estação de Metro dos Restauradores que gritava a última chamada: “PAUS”.

Os portugueses fecharam de vez o primeiro dia de concertos, demonstrando porque têm sido tão activamente referenciados nas linhas da imprensa crítica. São quatro, encheram a “sala” e as medidas do público, numa actuação profunda sacada ao álbum de estreia homónimo (2011).

“É Uma Água”, o EP de 2010, fazia antever o que, mesmo assim, ainda não estava sabido, mas agora é certo. PAUS oferecem muito e «Deixa-me Ser» mexe com todos. Mexe tal que, a exemplo do outro, o quarteto não resistiu a acabar tamanho reboliço entre sintetizadores provocatórios e percussões instigadoras dentro da audiência, com ela, em dança grata, electrizante e contagiante.

Dia 3

Ora o segundo dia não é nunca tão fácil como o primeiro. As pernas já não mexem igual, os corpos não respondem com a mesma rapidez, as cabeças não respeitam horários precoces e, talvez por isso, a Avenida custasse a encher. Aos poucos lá tinha que ser, e os motores conformaram-se, na expectativa de guiar os festivaleiros para algo nunca antes visto.

Os Dead Combo já teriam sido vistos. Mas tem piada que é um daqueles projectos que fazem valer as ressacas, vezes e vezes sem conta. Plateia lotada, sentada e tranquila, mas visivelmente satisfeita, num Tivoli acolhedor que abriu o dia aos mais demorados, Tó Trips e Pedro Gonçalves foram, como sempre, luminosamente sombrios, do cenário à figura, da música à sensação.

“Lisboa Mulata” é o último destes dois, que de novo trazem sugestões de bandas-sonoras na cartola, ou temas ambiente para viajar na “maionaise”. Se bem que, desta feita, alguns até fossem dançáveis. A plateia pensou nisso, mas não chegou a dançar (até porque a espera ao James Blake ditava a indiferença de muitos dos presentes).

A correr que se faz tarde, ainda quisemos, mesmo antes da esperada enchente para o cabeça-de-cartaz, conhecer de perto When Saints Go Machine, na pista intimista (e mais “istas” houvesse) do Maxime.

Foi tarefa fácil, poucos arredavam do Tivoli e poucos partilhavam desta curiosidade em conhecer os dinamarqueses de “Fail Forever”, o EP pérola que fez suscitar a dita bisbilhotice no início deste ano.

Espera-se agora mais do seu novo lançamento, “Konkylie”, depois de terem prestado provas que são capazes, e que podem chegar além disso, se continuarem a aproveitar a nostalgia dos primeiros sons de maquinaria sintetizada, e a fundi-los com melodias pegajosas pela voz distinta de Nicholas Manuel Vonsild, o vocalista de empenhada performance e estilo parado-no-tempo (ou seria intemporal?).

“This stage almost feels like being Frank Sinatra”, dizia o cantor, com sentimento e sem exageros (lá para ele), quando achamos que seria inadmissível não subir ao Tivoli, para penetrar no concerto da mais jovem, recente e badaladíssima estrela: James Blake.

O menino querido britânico tem, de facto, graça. E provou bem o que cresceu, desde a sua primeira actuação cá na casa (Optimus Alive, 2011), numa sala esgotada e ansiosa. Uns com conhecimento de causa, outros por causa dos conhecimentos, muitos aplaudiram a energia plácida e crescente de Blake, que se foi dilacerando pelo público à mesma medida que ia destapando a voz – de manipulada a pura.

«Tep And The Logic» foi um dos temas que fez o Teatro oscilar, enquanto «CMYK» levantou as palmas dos sentados e «Limit To Your Love» foi um sem-limite de respeito e dopamina. Muito mais trouxe o reservado compositor no compêndio e, já a terminar, «The Wilhelm Scream» fez abençoar a recentíssima (primeira audição, com “Air & Lack Thereof”, data de 2009) e promissora carreira da nova coqueluche da música electrónica.

Toro Y Moi já ia avançado na sala 1 do São Jorge, mas veio mesmo a calhar. A banda de Chazwick Bundick, o norte-americano, designer de formação, surpreendeu a maioria. Com os já conhecidos sintetizadores, mas a puxar por aquilo que se pode tirar deles, Toro Y Moi foi uma agradável surpresa que ia distribuindo notas com bem-amados temas como «Still Sound» e «A La Prince».

“Underneath The Pine” é a segunda produção, lançada no início de 2011, e já recebeu o mérito das melhores publicações do cenário electrónico, convites para actuar com consagradas figuras do sector (Caribou já os “agarrou”), e fez agora as delícias do público nacional que arriscou abandonar as poltronas dos concertos mais mediáticos. Arriscou muito bem.

«I Can Get Love», «New Beat», e todas as (nunca) demais, foram ficando agarradas ao tímpano, que misturou o Groove jovem a um funk-pop imaginário, numa linhagem de ambientes de sonho, de onde não apetece acordar.

Mas, ali e naquele momento, o caminho tinha de seguir. O Mexefest já cheirava a fim, mas ainda estava longe de estar acabado.

Fomos acordar ao Maxime, de novo, dando uma hipótese a Lindstrom (que sempre as mereceu, noutro registo – menos sonhador), de ser o desfecho porque esperávamos: um pezinho de dança quando tudo “acaba-na-boa”.

A correria estava quase terminada, então é favor gastar todas as forças restantes, e as extra também, que o corpo ainda consiga estoirar, mesmo antes de desistir. E vai disso ao som do DJ e produtor norueguês. Já o vimos melhor (o homem mal deixa ver a pele facial, coberta pelo cabelo e puxada pelo monitor), mas o som disco universal que vai atirando à pista é suficiente para engraçar e dançar com ele.

Outro festival, o mesmo festival, mudam-se os nomes, alteram-se as vontades. É muita fruta para um festival só, mas, bem feitos os guiões, sabe sempre bem “matar” tantos coelhos numa avenida só.

Reportagem fotográfica por Graziela Costa. Dia 2 e dia 3.



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