Weatherman

Entrevista com um dos anunciados fenómenos da música portuguesa.

Chama-se Weatherman. Poucos o conhecem, ainda. Aqui, na rua de baixo, apostamos que até finais do Verão não vai haver alminha que não cantarole algumas das suas canções. Vale a aposta?

O encontro estava marcado para as 15h30. O escriba atrasa-se, liga ao artista, que avisa estar num café, perto do Marquês de Pombal, à espera. Weatherman, ou Alexandre, como também o tratarei, acaba de dar uma entrevista para outro órgão e pede alguns minutos de descanso. Tudo bem. Planeia-se o local da entrevista. Que tal aquele salão de chás no Bairro Alto? Não era mal pensado, não fosse o facto de estar fechado. Alguém, horas, dias depois, alerta o escriba que tal salão mudou de poiso. Ninguém morre por isso.

A entrevista acaba por se realizar ali num espaço perto do Teatro Trindade. Um espaço com nome de filme de Hitchcock e de canção de U2, acrescente-se. Alexandre tem fome. Pede para comer qualquer coisa antes da entrevista. Pede uma torrada. Cada chá, de generosa quantidade, dá, no mínimo, para duas pessoas. O escriba divide um de menta com o artista enquanto se travam os primeiros conhecimentos. Enquanto se desanuvia um pouco o ambiente, porque Weatherman não é rapaz fácil de se entrevistar. Fala-se de um espaço no Porto (residência de Alexandre) que, por falta de memória do escriba, não se reproduz aqui o nome. Constam os rumores que esse espaço tem a maior carta de chás do Porto e arredores. Fala-se também da vinda de Weatherman a Lisboa por estes dias, aparentemente para estabelecer alguns contactos que visem o lançamento de “Cruisin´Alaska”, a editar pela mono¨cromatica, e afinal de contas o leit-motiv desta conversa.

Liga-se o gravador. Alexandre olha, assustado, para o objecto. Rapaz tímido, reservado, demora uns bons minutos até engrenar o seu discurso. «Vai ser uma coisa informal, muito ligeira», é alertado. “O problema é que ainda não estou habituado a estas coisas”, diz o músico, em jeito de começo. “Não é muito fácil para ti, calculo, entrevistares alguém que não conheces, e da mesma forma é-me para mim muito difícil justificar assim o meu trabalho, percebes?”, pergunta. “Podes sempre dizer que a música fala por si, como fazia o Sean Penn há uns anos quando promovia os seus filmes, que falavam por si mesmo, dizia ele”, riposta o escriba. Weatherman sorri, a conversa flui, dá-se verdadeiro arranque à entrevista.

“Não tenho muita coisa para contar”, começa Alexandre. [Atingido o fim da entrevista, perceber-se-á que, felizmente, até nem foi bem assim]. Fala-se, primeiramente, da forma como a música entrou na vida do músico: “Quando tinha 6 anos fui para uma escola de música, para um coro. Vestia-me de laço e camisa branca, como todas as crianças. Aí, apercebi-me de algo na música que me fascinava”. Por essa altura, entrou em cena uma das influências maiores da música de Weatherman, os Beatles. “As músicas que cantávamos andavam à volta de Beatles e Abba, por exemplo. Aí, cresceu-me o interesse por tudo isso, aquelas melodias pareciam-me muito familiares apesar de nunca as ter ouvido antes”. O poder da melodia, algo a que nos referiremos mais à frente.

Continuando a evolução musical de Alexandre: “Depois do coro, aí com uns 10 anos, ouvi pela primeira vez um disco dos Beatles, a compilação «Past Masters», que mudou-me completamente o cérebro. Passei dias inteiros fechado em casa a ouvir aquilo. Com os meus 14 anos comecei a escrever as minhas próprias canções, quando aprendi os primeiros acordes de guitarra. Virei-me, anos depois, para o punk, Clash, Sex Pistols, tudo isso. Escrevi algumas músicas na altura que espero que nunca sejam conhecidas do grande público (risos)”. Depois de algumas bandas menores veio então o alter-ego Weatherman: “Essa mudança deu-se no final de 2004, onde decidi fazer uma coisa diferente de tudo o que havia feito até então, musicalmente. Gravei uma demo de 5 músicas que, depois, enviei para uma série de editoras independentes”.

Demo gravada e enviada, chegou então a mono¨cromatica. “Mal conhecia a editora quando enviei a demo. O que é facto é que me responderam dois dias depois de a ter enviado. Mais tarde, através da mono¨cromatica, conheci o produtor do “Cruisin’ Alaska”, o Pedro Chamorra. Revelou-se uma aposta muito boa, na minha opinião”.

As referências maiores de “Cruisin’ Alaska” são óbvias a quem ouve e, descobre-se agora, a quem escreveu as canções. “Os Beatles e os Beach Boys são, de facto, as minhas referências maiores, digamos assim”. E não há o risco de um disco claramente inspirado por temáticas e sonoridades do passado acabar por soar datado e pouco fresco? Como contrariar essa tendência? “Não acho que esteja a reproduzir exactamente o que se fez na época. Uso muitos sons electrónicos, coisas que descubro na hora. As referências são mais ao estilo de composição do que à sonoridade propriamente dita. No meu disco há coisas dos anos 60, 70, 80, um pouco de tudo. Mas em termos de melodias e arranjos talvez remeta mais para aí. Mas tenho muitas outras referências, gosto muito do Elliot Smith, do Devendra Banhart, etc”.

O poder da melodia, voltemos a esse ponto. “Acredito no poder e na simplicidade de uma boa melodia em detrimento de grandes produções. Para mim é o caminho mais fácil de expressar tudo aquilo que sou”, afirma Alexandre peremptoriamente.

Na sua biografia de apresentação, Weatherman classifica a música portuguesa como “aborrecida e sem chama”. Será assim tão negro, o panorama? “Vão existindo, apesar de tudo, algumas coisas interessantes. A questão é que nunca tive nenhuma referência musical portuguesa, pura e simplesmente. Mas gosto de algumas coisas, dos Mão Morta, por exemplo”. E em que é que Alexandre pode melhorar o cenário? “Tenho apenas para oferecer a minha pessoa e as minhas canções. Não tenho intenção de revolucionar o que quer que seja, mas sinto que tenho uma palavra a dizer”.

Ao vivo, aguardam-se apresentações para breve de “Cruisin’ Alaska”. “Formei uma banda entretanto, que vai tocar comigo nos concertos. Quero mesmo fazer o máximo de datas possível, mostrar o meu trabalho ao maior número de pessoas. Tocar ao vivo é algo natural para mim, e estou ansioso para apresentar este álbum”.

“If You Only Have One Wish You Better Make it Big”, canta, Alexandre, a determinada altura do disco. Um desejo para Weatherman em 2006? “(pausa longa) Tocar com um Beatle, talvez (risos)”. Mais a sério, surge o desejo de “Mostrar a minha música ao maior número possível de pessoas, talvez seja esse meu desejo maior. E é óptimo sentir que há pessoas que respeito e admiro muito que me tenham vindo elogiar imenso o disco, é muito reconfortante”, remata.

Weatherman, já se disse, tem um belo disco de estreia em mãos. Beach Boys e Beatles à cabeça nas influências, mas muito mais que isso. “Cruisin’ Alaska” é um disco relativamente imediato, mas cheio, ainda assim, de pequenas subtilezas que garantem a sua longevidade e a constante (re)descoberta das suas pérolas maiores.

As cartas estão lançadas para 2006, e Weatherman é o primeiro Joker do ano. “Quem te avisa, teu amigo é”, já dizia o provérbio.



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