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Bicicletar

Dar ao pedal a sério!

E se amanhã acordássemos e na cidade não houvesse um único carro? Nada de trânsito, nem fumo, zero de barulho, só um ttttttttttttzzzzzzzzzzzzzzz… um gingar de bicicleta e aquele vento nos raios. Tttttttttzzzzz. Um gingar como o da nossa bicicleta de criança, mas um gingar gigante, em grande escala, e nós crianças crescidas, crianças mais novas, pais, filhos, avós, chefes, tudo a gingar, tudo na bisga às 9 da manhã.

Eu já oiço esse gingar aqui e ali só me apetece dizer: Boa Lisboa! Mais uma, sempre a somar! Andar de bicicleta é sem dúvida divertido, socialmente cool, amigo do ambiente, low cost. Mas parece que a cidade anda a dar ao pedal a sério, um verdadeiro bicicletar; verbo transitivo que já se faz sentir nas estradas em pleno trânsito, postes cheios de cadeados, campainhas a chegar aos cinemas. Entretanto abrem cada vez mais lojas como a Velo Culture, seguem-se as Bike Lab e Ciclooficinas, e passa-se cada vez mais a estilo de vida e cultura mesmo de Lisbonize a DouroBike.

Assim nascem grupos como o Lisbon Cyclechic que gosta de pedalar calmamente pela cidade, os Matilha Crew, que pedalam com estilo e juntam por exemplo adeptos às vezes para ver filmes sobre o tema, mais a sério há o Bicycle Film Festival, a Bicicleta Voadora faz o diário fotográfico destas pedaladas, as Rodas de Mudança movem uma campanha original de incentivo a esta opção de mobilidade urbana e o movimento vai crescendo. Tttttttttttttzzzzzzzzzzzzzzz

Já se ouve por toda a parte, embora este seja um despertar já atrasado em mais de dez anos em comparação com outras cidades europeias (a mesma história de sempre mas que infelizmente é a verdade). Mas já tudo gira, hoje, em Lisboa, Porto e cada vez mais em várias cidades o uso da bicicleta como meio de transporte já se começa a fazer notar e nestes últimos dois anos teve um boom, passando já de um movimento trendy para um uso cada vez mais funcional. Ou ainda não?

Fomos perguntar a quem percebe do assunto, tanto que num misto de conhecimento, paixão e espécie de missão lançou um jornal, o Jornal Pedal, mais precisamente a João Pinheiro, editor e um dos quatro fundadores com Filipe Gil, Bráulio Amado e Luís Gregório.

Verdade seja dita. Não tivemos pedalada ou, se quiserem, pusemos pedal a fundo e mergulhámos no mundo das binas. Hoje o jornal já conta com mais duas edições online e em papel, é mensal e de distribuição gratuita em cafés, lojas de bicicletas, teatros, e cumpre a “tentativa de trazer para Portugal uma atitude que é banal noutras metrópoles europeias: o uso da bicicleta como meio de transporte”.

Da nossa parte já pudemos, primeiro, dar os parabéns ao jornal Pedal que consegue sair da comunidade e ser um jornal também para quem ainda não anda de bicicleta, sendo assim uma ponte e um pólo atractivo, com esforço de criativos, pessoas comuns que contam a sua experiência do uso da bicicleta, aliado a um design de se lhe tirar o chapéu, produções de moda de bom gosto e sempre sobre rodas, e publicidade cada vez mais heterogénea. Segundo confirmam os dados que à frente vão ser avançados: investir numa bicicleta como forma de mobilidade urbana é um investimento apropriado para os tempos de crise.

Desde a entrevista fizemos as contas e falta-nos apenas cerca de um mês para pagarmos a bina: uma Órbita, Classic Sport, tradicional portuguesa, cheia de estilo à qual acrescentámos um capacete e um indispensável cadeado. Além disso, e citando João Pinheiro, “a experiência e vivência da cidade são completamente diferentes”. O próprio fundador faz uso da bicicleta apenas há dois anos, assume que começou pelo trendy da questão, mas que logo se questionou porque não se tinha lembrado de tal antes, porque fazia todo o sentido tanto a nível de rapidez da mobilidade, como de modo saudável e económico.

Bicicletar

Ainda é só uma moda?

Para os fundadores do jornal Pedal a questão já há muito que passa da moda para uma comunidade e, se por um lado ambas se alimentam uma da outra, ainda há outro passo a dar que é dar voz a essa comunidade mas também fazer chegar tudo isso a outras pessoas. Assim, o jornal Pedal é um produto cultural com notícias e cultura, feito por pessoas que andam de bicicleta, para elas, mas também e essencialmente para quem não anda. “O jornal também faz esse papel , desmistificar e descomplicar, dá dicas para o uso da bicicleta, para se ultrapassar medos e contornar por exemplo as ruas inclinadas que ainda continuam a ser desculpa impeditiva para alguns Lisboetas”.

Low Cost

A moda das bicicletas cresceu, mas ao contrário das outras modas, pois acaba por ironicamente acompanhar as condições económicas actuais do País. É ao fim ao cabo uma solução económica, há que ceder e ver que é um meio de transporte barato, há que mudar e, fora o atraso do uso que já se faz em cidades muito mais inclinadas como Bristol, a verdade que se constata com felicidade é que muitos lisboetas e portugueses já cederam, não porque está na moda e fica bem, mas porque as pessoas vêem agora a realidade em que vivem com outros olhos. Sim, as sete colinas sempre cá estiveram, mas nem sempre foi preciso gastar tanta gasolina para as subir pois não?

O que é a massa crítica?

Entrevistámos João Pinheiro em plena massa crítica que acontece todas as sextas-feiras de cada mês, num ponto central, desta feita no Marquês de Pombal, de onde cerca de trezentas pessoas fizeram juntas um percurso que se quer hoje fazer ver, e amanhã gostava de se fazer desaparecer, ou seja, tornar banal, e em vez de uma massa ser simplesmente normal. Tão normal como o congestionamento de trânsito de fim de tarde. A massa crítica quer pôr tudo a girar e trocar as voltas ao juntar diferentes tipos de pessoas e de projectos e servindo assim como denúncia e contestação de alguns caminhos que ainda há a percorrer, como por exemplo nas regras e respeito do trânsito, mas também como celebração e divulgação do uso das bicicletas.

Para João Pinheiro uma massa crítica é o momento ideal para quem quer iniciar a condução da bicicleta na cidade, aqui e em massa perdem-se os medos, vêem-se as dificuldades, trocam-se experiências.

A massa crítica não leva cartazes, é a massa que fala por si e, tal como o jornal Pedal, não quer mudar imediatamente nada. O que se quer é dar voz a questões a nível urbanístico. Não se pretende fazer essas mudanças, mas sim ser um barómetro, pois quantas mais pessoas sentirem necessidade de andar de bicicleta, mais infraestruturas se vão criar. Portanto, andar por si só é um manifesto e protesto, até um dia se fundir na sociedade e hábitos da cidade. Ainda há muito caminho para percorrer, mas que seja feito sobre rodas e raios.

Agora é pesquisar muitas das dicas dadas nesta reportagem, correr a apanhar a terceira edição do Jornal pedal, marcar na agenda o dia 30, sexta-feira de massa crítica, e apanhar o ritmo, porque se Lisboa estava com a pedalada toda, agora ninguém a agarra.

E, aproveitando que estamos numa revista de Lifestyle e divulgação cultural, apetece até fazer uma tirada de publicidade, lembrando o que aprendemos cedo, que é fácil e bom, e que todos sabemos que é coisa que nunca se esquece. E se tudo fosse tão fácil como andar de bicicleta?

Fotografia por Ana Jerónimo



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