Bill Callahan @ Teatro Tivoli BBVA (14.04.2023)
É uma saborosa sensação quando, ao fim de tantos anos de eventos ao vivo, ainda existam concertos que nos deixam ansiosos e com aquele friozinho na barriga quando assistimos ao aproximar da data dos mesmos. Por vezes pode parecer uma mera rotina, mas cada espectáculo tem a sua história e o seu poder, mais ou menos interessante, mais ou menos intenso.
Valendo como um dos nomes maiores da música contemporânea que brota dos Estados Unidos da América, e com uma carreira que já não é de agora, Bill Callahan é um desses acontecimentos que nos estimula exageradamente, e que leva muita gente a apressar-se até às bilheteiras quando uma data perto de nós é anunciada.
Este evento no Teatro Tivoli BBVA foi um dos inúmeros impactados pela pandemia, mas que felizmente não acabou cancelado como muitos outros, em grande parte porque, entretanto, nasceu “YTI⅃AƎЯ”, editado no trimestre final de 2022, e que automaticamente “obrigou” Bill Callahan a renovar a digressão que tinha ficado suspensa.
O concerto na capital portuguesa, que valeu como pontapé de saída da manga europeia da tour, foi muito mais que a costela de folk e americana que constituirá a fatia de leão das composições de Bill Callahan. Coadjuvado por Dustin Laurenzi no saxofone, e pelo amigo de longa data Jim White na bateria (que curiosamente celebrava neste dia a edição de mais um disco dos seus Xylorius White), a toada geral acabou por soar mais musculada do que eventualmente anteveríamos.
Talvez esse pormenor torne menos estranho o facto de até o ar meio impenetrável do autor tenha sido posto de parte em diversos momentos, não resistindo Bill Callahan a acompanhar o ritmo em palco com ligeiros movimentos corporais, enquanto eram continuamente legíveis nos esgares da sua face as curvas e contracurvas das narrativas que vai desbobinando, com proeminência para «The Mackenzies» neste aspecto.
Para essa vertente mais musculada, em muito contribuíram os clássicos recuperados do portefólio dos seus Smog, em especial «Hit the Ground Running», que aproveitou uma embalagem que arrancou com o irrequieto «Bowevil», dando azo a uma marcha de êxodo rural imparável. Por seu turno, «Coyotes» e «Partition» foram superlativamente enriquecidas pelo saxofone de Dustin, primeiramente assinando um intro e outro escaldantes, e depois alimentando um despique entre o trio de instrumentos em palco, que culminou num perfeito empate.
Pelo meio, voltámos à terra a bordo de «Small Planes», que instalou uma atmosfera de acalmia, com a guitarra e o sopro a derreterem pelas colunas, seguida de uma «Naked Souls» que estabeleceu uma ponte muito bem gizada para um troço novamente mais sonicamente acidentado.
Não deixou de saudar os viçosos plátanos que embelezam e facilitam a respiração na Avenida da Liberdade, nem de como acabou com um stock interminável de cigarrilhas Café Creme após uma das suas passagens por Portugal. Pormenores que caberiam perfeitamente numa das histórias que narra por meio das suas músicas, e que nos continuam a entusiasmar com a mesma alegria com que revemos um filme repleto de pormenores que só vamos captando através de cíclicas visualizações.
Escusado será dizer, em especial após mencionar a excitação pré-concerto, que pernoitaríamos de bom grado em pleno Tivoli, estando perante um músico que detém um catálogo tão extenso e imaculado como Bill Callahan.
Alinhamento:
– First Bird
– Everyway
– Bowevil
– Cowboy
– Coyotes
– Keep Some Steady Friends Around (Smog cover)
– Hit the Ground Running (Smog cover)
– Partition
– Small Plane
– Naked Souls
– The Mackenzies
– Drover
– Planets
(encore)
– Too Many Birds
– Natural Information
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