Bruno Ferreira
Em discurso directo.
Bruno Ferreira é um dos humoristas mais singulares e interessantes da sua geração no panorama actual.
Numa conversa descontraída pudemos saber mais acerca do seu percurso, nem sempre directamente visível, seja aos microfones da Rádio Pax – na cidade de Beja de onde é natural – seja na direcção de vozes do já saudoso Contra-Informação, onde nos divertiu com as sui generis caricaturas de Paulo Tortas ou Handicap Coelho, entre outras.
Bruno começou por descrever como tudo se passou. “O Contra surge na minha vida em 1998, quando tinha 23 anos. Antes disso, a minha experiência com microfones e auscultadores vem da Rádio Pax, em Beja, a minha terra Natal.”
A Pax foi, segundo Bruno, “uma rádio mítica no panorama do éter nacional. Foi uma das primeiras rádios piratas do país, e também uma das primeiras a deixar de o ser. Estive aos seus micofones de 1990 a 93, o ano em que vim estudar para Lisboa. Licenciei-me em Relações Públicas e Publicidade e durante o estágio, numa empresa de comunicação, comecei a fazer as minhas primeiras locuções de publicidade”.
O Contra viria pouco tempo depois, “no ano da Expo” relembrou. “Ganhei coragem e liguei para a Mandala (produtora do programa) a dizer que gostava de fazer um casting. Quando estreou o boneco do Handicap Coelho – o seleccionador nacional Humberto Coelho – fui chamado e fiquei”, recordou.
Handicap Coelho seria o primeiro boneco de Bruno Ferreira, mas a sua destreza caricatural não terminaria por aqui. “Seguiram-se, depois, mais personagens, como o Paulo Tortas, ou o Xalana Gusmão. Em 2001 fui convidado para ser director de vozes do programa. E aí permaneci até ao último mês de Dezembro. Foi um percurso longo, que me deu muito prazer, pela equipa com que trabalhei, pelos desafios que nos eram colocados diariamente pelo programa, e sobretudo pela oportunidade única de poder fazer humor diário, que julgo que não me fica mal dizer que era de qualidade, e de bastante agrado por parte do público”.
É um dado constatado o agrado de uma larga maioria de espectadores pelo Contra-Informação, que ficou ainda mais claro recentemente, aquando da recolha de assinaturas que recusavam entender o seu fim. Bruno discerniu sobre, no seu entendimento, as principais razões que ditaram este fim. “Entendo que um formato televisivo possa acumular algum desgaste ao fim de 14 anos. Mas não concordo que o formato do Contra, concretamente, estivesse gasto. Sobre os custos do programa, se os dividirmos por uma equipa de três dezenas de pessoas, e pelas duas centenas de personagens, para além do mais conhecendo as suas múltiplas e possíveis utilizações, mesmo em prol do canal, não o considero caro. Não conheço as razões reais para o fim do programa, mas o seu final foi o culminar de uma estratégia que se arrastou durante o último ano e meio: alterações constantes de horários e dias de emissão, despromoção no canal e desinvestimento ao nível dos recursos, como não haver o boneco do Pedro Passos Fedelho. Mas acho que o sentimento que deve ficar é de dever cumprido, e também de esperança em que o programa regresse, mais tempo, menos tempo. Deu que falar o fim do Contra. Na Assembleia, na imprensa, nas redes sociais, e pelo próprio Provedor da RTP. Eu acredito que vamos voltar. Se na RTP, ou noutro canal, se na TV ou na Net, não faço ideia. Os bonecos estão vivos, actualmente de férias, mas à espera de novidades” acredita.
Apesar de tudo, o final de Contra-Informação não diminui a vontade de idealizar alguns projectos e “acima de tudo, não parar de trabalhar”, reflectiu. “Estou a preparar um site sobre o meu trabalho nestas andanças – já lá vão 13 anos – e continuar com a minha actividade de locutor de publicidade, de actor/dobrador de animações para português, que agora também estou a dirigir, como foi a película do último Natal, “As Aventuras de Sammy”, de animador em eventos de empresas, no 5 Para a Meia-Noite, que regressou o mês passado, etc” balanceia.
Do Pimenta na Língua para o 5 para a Meia-Noite foram passos precisos, fruto de trabalho e reconhecimento mútuos. “O 5 surge em 2009, com um telefonema do Luís Filipe Borges a convidar-me para colaborar com o programa, às sextas-feiras, no seu dia de apresentação. Disse-me que era fã do Edição Extra – um formato que tive em 2007/08, na SIC Radical, baseado em dobragens e muita edição vídeo em cima das vozes das nossas figuras públicas – e que gostava de ter esse momento no seu programa. Fiquei muito contente. E foi assim que começou a primeira temporada no 5. Pequenos vídeos de 4 ou 5 minutos, com histórias dobradas. Na segunda temporada adoptámos uma Revista de Imprensa fictícia, com capas de jornais e revistas repletas de títulos non sense, manchetes e fotomontagens surreais. Na terceira alternámos umas entrevistas do Borges aos nossos personagens com aquele modelo em que só a boca da imagem mexe, com sketches meus ao vivo. Nesta quarta temporada vou continuar apenas em estúdio com o Boinas (Luís Filipe Borges) que me entrevistará na pele de várias personalidades”.
Pimenta na Língua não é, para Bruno, a extensão de alguma da filosofia (im)posta no Contra, isto porque “existem diferenças claras, também por força dos seus autores, que são diferentes. No caso do Contra, as P.F., no caso do Pimenta (na Língua), o Nuno Dionísio, o Nuno Vieira Faustino, e eu próprio. Claro que há um denominador comum que são as imitações, e o meu próprio trabalho, mas há diferenças básicas. O humor do Contra era mais cortante, mais baseado a uma crítica muito direccionada aos poderes, o nosso é mais non sense, mais naif, se quiseres” considerou.
Em tom de brincadeira diz-se, quando incitado na descrição de si próprio, “trabalhador, teimoso, e leal. Apesar de perceber muito pouco sobre singnos do zodíaco, parece-me que sou coerente com as características gerais do meu. Sou Touro, pois claro”(risos).
O reconhecimento público é indissociável do cariz de alguns dos projectos que lembrámos durante a conversa e Bruno, sem fórmulas previamente assentes ou estipuladas, discerniu, ao fim de algum tempo, algumas das ideias e “sabores” resultantes no (do) sucesso e aceitação de alguns deles.
“Sem dúvida que à cabeça vem o Contra, com um reconhecimento esmagador, e uma excelente opinião do público durante quase uma década e meia. Um programa de humor, com crítica política, e o conteúdo televisivo que baptizou o chamado humor inteligente. Tive uma enorme honra em fazer parte do programa. Depois, e porque se tornou num fenómeno que ultrapassou largamente as expectativas, o 5 Para a Meia-Noite, que é hoje um programa de culto. Dá-me a oportunidade de trabalhar com a imagem e não só com a voz. O Luís Filipe Borges é um excelente profissional. Admiro muito o seu trabalho e torna-se fácil fazer com ele no meu sketch, também se diverte com o momento, e porque é muito bom nas contracenas. O terceiro, talvez tenha sido o Memória de Elefante, um programa diário de humor (outra vez as imitações) que tive na RR durante 4 anos, em pleno prime-time, até 2009. Muito me diverti a fazê-lo. Mas não queria esquecer o 1,2,3, com a Teresa Guilherme, para a RTP, nem o Edição Extra, para a SIC Radical, do qual ainda hoje muita gente me fala na rua, e que foram programas e equipas que me ensinaram bastante”.
Mas a conversa não poderia terminar sem um recado para os leitores da RDB :”Encarem sempre a vida com humor. Às vezes pode até parecer desconfortável, mas se ultrapassarmos o preconceito, seguramente vivemos um dia-a-dia mais divertido. Experimentem! Entretanto, enquanto não tenho o meu site aberto na Net, e se quiserem ver algum do meu trabalho ao longo destes últimos anos, espreitem o blogue. Obrigado!”
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