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O “maestro” António Raminhos

Conversa com o humorista sobre o seu percurso e actual presença no 5 para a meia-noite.

Numa manhã de sábado estivemos com António Raminhos no LA Caffé na Avenida. Apareceu com o seu característico ar despreocupado de t-shirt e jeans pronto para responder a todas as perguntas. Ficámos a conhecer um pouco mais deste novo talento do humor português que tem vindo a marcar terreno com o seu estilo próprio, grande parte construído pela sua inteligente forma de improvisar.

O conhecido humorista com presença assídua no programa de entretenimento do canal de televisão RTP 2, “5 Para A Meia-Noite”, falou-nos do seu percurso e da sua experiência na televisão.

Fala-nos um pouco do teu percurso, eu sei que trabalhaste dois anos na extinta publicação Capital. Quando começaste a sentir que o humor era a tua vocação?

Comecei a escrever por volta dos dezoito anos, ainda nem sabia se queria ir para a Universidade, mas depois acabei por ir para jornalismo, fiz um curso tecnológico, comecei a gostar, foi muito giro e iniciei uma colaboração com a Capital, ainda não tinha nenhuma ligação ao “Humor”, fazia parvoíces no trabalho, já nessa altura ia mais trabalhar porque me divertia imenso com os meus colegas, passávamos o tempo todo na galhofa e isso era o mais divertido, o convívio com os outros jornalistas, mais do que trabalhar. Depois o que aconteceu foi que o jornal fechou. “Acho que não tive nada a ver com isso”, diz a sorrir. Fiquei no subsídio de desemprego e aí é que abri um blog e comecei a escrever piadas e foquei-me mais no humor. Contactei o Carlos Moura e ele mostrou uma grande disponibilidade ao contrário do que eu pensava. Meti-me no humor, fiz a minha primeira actuação de stand-up, tive propostas de jornalismo mas aí já não aceitei.

O que achou a tua família?

(Risos) O que a minha família acha ainda? Hoje tive para ligar para a minha mãe e dizer “ O teu filho ontem teve no salão erótico” Tivemos a gravar para o “5 Para A Meia Noite”. A minha mãe diz “Filho se é isso que gostas continua” O meu pai agora aceita melhor. É a história – eu não tenho patrão, trabalho todos os dias mas não para a mesma pessoa. Ele dizia “ Filho acho que deves fazer isso, mas algo seguro”. Mas agora já não fala tanto nisso. Diz “Andei eu a investir num jornalista, saiu-me um palhaço”

Onde buscas inspiração para a criação das tuas personagens?

Algumas personagens do “5 Para A Meia Noite”, umas foram criadas por mim. Por exemplo o maestro, foi o realizador. Há muitas coisas que se vai buscar na nossa vida, diariamente temos muitas situações de humor quase minuto a minuto, se calhar são coisas que nos rimos na altura e depois esquecemos, porque quem não está ligado ao meio não dá a importância que um humorista dá, porque não vai aplicá-la no seu trabalho. A maior parte das minhas personagens são inspiradas na realidade. Uma vez fiz um texto para um sketch sobre o filho da Pluta (planeta) baseado na história de um português que acha que é filho de um extraterrestre, é verídico está no youtube, e o que eu escrevi quase nada foi alterado ou então não subverti o que ele disse, pego na ideia e dou-lhe uma roupagem diferente. Outra coisa que fiz foi o João Bigorne, um empresário drogado, são situações que nós infelizmente vemos no nosso dia-a-dia. É ir á realidade e exagerá-la.

Ficas nervoso antes de actuares?

Depende, se for na televisão não fico, porque na televisão é tudo muito rápido e apesar de nós sabermos que é um programa visto por muita gente, as pessoas não estão lá. Agora nas actuações de stand-up fico muito nervoso, as pessoas estão lá á frente, a reacção é imediata, por acaso tenho sorte como tenho esta cara de parvo se a piada não resulta, resulta a cara.

Como foi a tua primeira actuação? O público gostou, riu-se?

A minha primeira actuação foi na sexta-feira santa de 2005, eu preparei vinte minutos de stand-up, foi giro e correu muito bem. O Carlos Moura disse-me tu vais meter-te nisto e vai ser como a “ heroína, ao primeiro chute ficas viciado”. E é exactamente isso, uma pessoa actua e fica viciada naquela sensação, na adrenalina, naquele sentimento de aprovação das pessoas, dos aplausos, apesar de estar sempre nervoso antes, mas aquele momento antes – penso porque é que eu escolhi isto, antes de entrar no palco eu já quis ser tudo na minha vida menos o que estou a fazer ali, mas depois entro no palco e esqueço e é espectacular até á próxima actuação.

Costumas observar a forma de trabalhar dos teus colegas para tirar ideias e aprender?

Quando comecei a fazer comédia, como não tinha muito dinheiro para investir encomendei vários livros sobre comédia na Amazon, tornei-me autodidacta e comecei a ver muitos comediantes portugueses, estrangeiros para perceber em termos de comédia como no stand-up, como é que funcionam os ritmos, qual é o estilo deles. Roubar comédia é sacrilégio há quem o faça. Por exemplo a partir de uma ideia de um comediante eu posso lembrar-me de algo, agora eu copiar a piada que ele fez isso é completamente errado. Os temas são recorrentes, o sexo, as relações, a política, uma mesma notícia pode ser interpretada de diferentes maneiras. Os monólogos de comédia são muito pessoais, a maior parte dos humoristas são eles próprios que escrevem o seu material. Às vezes pode ser uma coincidência duas pessoas lembrarem-se da mesma piada, porque os cérebros de quem faz comédia são formatados para uma determinada realidade.

Quais são os humoristas que admiras mais, nacionais internacionais?

O Ricardo Araújo Pereira em termos nacionais é um génio, é impressionante o modo como ele é irónico e algo sarcástico, o Herman também, não deixa de ser um marco. Gosto muito do João Quadros, que para mim é quem tem o melhor humor negro. Em termos internacionais o Conan O´Brien, é muito expressivo e capaz de fazer comédia com tudo e o Mitch Hedberg que morreu com uma overdose, tinha trinta e quatro ou trinta e seis anos e que me lembra muito o Kurt Cobain era um indivíduo que tinha um humor muito particular, eu felizmente tive a possibilidade de conhecer ainda que não pessoalmente a viúva dele através do facebook, adicionei-a e enviei-lhe uma mensagem a dizer que era fã dele e que a comédia dele tinha influenciado muito a minha vida, quando estou um bocado mais em baixo gosto de ouvi-lo e perceber que foi alguém que teve uma vida complicada e que se safava através da comédia. Escrevi-lhe isso e ela respondeu-me a agradecer e contou-me um pouco da vida dele.

A tua estreia em televisão foi no programa “Sempre Em Pé” na RTP2, como foi?

Estava ainda a trabalhar como jornalista num programa de televisão, na altura já fazia comédia á volta de um ano se tanto e contactaram-me a dizer que ia vai estrear um programa de stand-up. Então enviei para lá uns textos e um vídeo que tinha feito a actuar num bar e decidiram que iria começar na estreia do programa. Eu já conhecia o apresentador, o Luís Filipe Borges que tinha trabalhado comigo na Capital, mas ele só soube que eu ia ao programa dois dias antes. Estava muito nervoso acho que nunca tive a garganta tão seca na minha vida mas acabou por correr bem.

Como é a abordagem do público na rua em relação ao 5 Para A Meia Noite?

As pessoas quando vêm falar gostam do programa, já me falaram em vários sítios por todo o país. Eu não me importo, gosto desse contacto. Se as pessoas vêm falar comigo é porque gostam do meu trabalho e lhes devo dedicar alguma atenção. Eu até me sinto mal por achar que estou a falar pouco tempo com elas, é bom reconhecerem e acharem-nos piada.

Falando novamente na personagem do maestro António Raminhos que considero que foi a tua personagem mais emblemática até hoje. Como construíste o boneco?

O André, o realizador tinha aquela ideia da música “Atirei o pau ao gato”. Foi assim ele tinha o texto, a personagem foi quase construída de um dia para o outro e logo na primeira vez surgiram aquelas ideias “Estudei na Universidade tal…” ou seja um maestro que não é maestro nenhum mas que como muitos que há por aí como uns que dizem estudei isto, fiz aquilo, trabalhei aqui mas que na verdade não fizeram nada.
Os sketches seguintes era a tal coisa quase todas as músicas dá para utilizar “Atirei o pau ao gato” e ás tantas começava a escolher os temas e aquilo já não me saia da cabeça e a personagem em si acabou por funcionar um bocado com isso. O visual, a bengala do maestro o cabelo em pé foi um bocadinho a brincar com aquele maestro madeirense muito novo que agora não me lembro o nome, para dar um ar de louco já não me lembro se foi ideia minha ou da maquilhadora, no programa toda a gente dá ideias.

Quando trabalhas a personagem, ensaias trabalhas a parte expressiva?

Nos directos não ensaio nada, só o texto porque ás vezes não há tempo para nada. Chegar e fazer, eu não sou actor sou comediante ás vezes acho que só sou parvo e essa história do método é para quem o sabe e eu não sei, não sou actor, só faço as coisas na altura como acho que podem ser “Baixa-me o espírito e pronto” (risos)

Qual dos registos gostas mais o de stand-up ou actuar em televisão?

Eu gostava mais de poder investir no stand-up mas é por achar que faço pouco não é por gostar menos de fazer televisão, lá para Setembro planeio começar o projecto do meu espectáculo a solo.

Inspiras-te muito na actualidade, no que se passa no nosso país?

Para os sketches para televisão sim influencia bastante. No stand-up nem tanto os meus textos nesse registo têm muito haver com o ridículo com as ideias parvas com uma premissa que se utiliza muito na comédia “E se” como por exemplo noutro dia estava a pensar que para as prostitutas que trabalham á beira da estrada “sexo seguro é usar um colete reflector”. O meu tipo de humor não é uma coisa que tenha muitas vezes ligação há realidade. É a minha realidade, acaba por ser um pouco isso.

Como surgiu e foi a experiência na Brixton Comedy Club em Londres?

É uma casa de comédia, com vinte anos por onde já passaram nomes conhecidos e nós enchemos a sala. Foi muito giro em vários aspectos porque nessa altura estávamos numa tournée cá e foi de loucos nesse dia eu e o Pedro Ribeiro voamos de manhã para Londres para actuar nesse dia e vir logo no dia seguinte, fomos para lá só com uma mochila, aquilo é tudo muito underground como a maioria dos clubes de comédia em Londres, durante todo esse tempo não levou obras, tudo a cair, tudo podre mas tem aquele charme britânico, londrino. Fomos muito bem recebidos, a primeira vez actuamos em português para a comunidade portuguesa através da divulgação em blogs, no facebook. Voltamos passados seis meses houve muitos repetentes e nessa segunda vez resolvemos fazer em inglês, fomos a um clube pequeno no centro de Londres e estava cheio, claro que estava cheio de medo desta vez ensaiei, o meu sotaque á “Mourinho” mas reconheceram o nosso esforço e correu muito melhor do que nós estávamos á espera e estavam lá comediantes do país de Gales, do norte de Londres, da Austrália. Os do país de Gales gostaram muito e queriam que fossemos lá portanto já há essa possibilidade. Eu adaptei as minhas piadas com alguns termos deles e o humor acaba mesmo por ser universal. As diferenças com Portugal são abismais, os que estavam lá não eram profissionais e tinham as técnicas todas.

O que achas que é preciso para ser um bom humorista?

Eu acho que é necessário ter um grande sentido de auto crítica, sobretudo ter um ego que não impeça isso, eu contacto com alguns comediantes diariamente e aquilo que eu vejo nos melhores é que mesmo quando fazem um bom trabalho pensam que podem sempre melhorar e quando não fazem uma coisa muito umbilical é porque estão a pensar nas pessoas não apenas no seu gosto pessoal.

Qual o conselho que dás a quem quer seguir a carreira de humorista?

Quando era jornalista não me sentia como tal só comecei a sentir mais depois de ter carteira profissional há dois anos. Quando me perguntam o que é ser humorista eu ainda me sinto incomodado porque não me sinto como humorista, mas não sei definir muito bem o que é que faço e o meu conselho é este, eu acho que é um processo longo e um comediante não basta vestir um casaco igual ao do Seinfield e pegar num microfone é preciso muita coisa é preciso saber o que se está a fazer, ler muito, ter os pés assentes, ouvir muito os conselhos dos outros trabalhar muito e escrever piadas todos os dias.

Fotografia Ricardo Sá Da Costa



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