E tudo se resume ao poder. À vontade de poder.
“Queda em Branco” em cena pelo Grupo de Teatro do Instituto Superior Técnico.
O público acomoda-se em quatro pequenas filas de cadeiras ao fundo da sala. Sobre si, apenas dois holofotes pendem, numa luz intimista. Quatro painéis ladeiam o espaço escuro que permanece diante dos nossos olhos. Um espaço que parece tender para o infinito. Ouvem-se passos. Acende-se uma luz. Um actor, sentado num pequeno banco, balança freneticamente o pé.
“Os actores não vão olhar para o público a menos que lhes seja exigido. E é provável que não se lembrem quem são.”
Assim se inicia a peça “Queda em Branco”, com direcção artística de Gustavo Vicente, levada a cena no Salão Nobre do Instituto Superior Técnico até 12 de Maio.
Tendo como pilar de inspiração a obra “Homem atlântico” de Marguerite Duras, a peça transporta os espectadores a um espaço situado entre a vontade do eu-indivíduo e a vontade imposta, colocando o público numa posição de questionamento perante as questões da condição humana: a submissão, o desejo, o amor. A violência física, a melancolia, o querer fazer parte de algo, a mentira, a omissão. Pessoas que se arrastam pelo chão, a nossa dependência dos outros. A dualidade amor/ódio. Tudo é válido neste jogo psicológico onde os actores convidam o público a experimentar um papel que adquire um sentido inverso já bem perto do final.
Entre as diversas partes que compõem a peça, é chamado à boca de cena um actor. Questionado sobre o sentido Nietzchiano da vontade de poder, é convidado a partilhar experiências pessoais que o deixam desnudado perante quem está presente. O público sente, naquele exacto momento, o poder que tem sobre aquele em quem a luz se centra. A particularidade do ensinamento subtil, está sobretudo nisto: a vontade de, de alguma forma, se exercer poder sobre outrem, independentemente de haver ou não uma relação próxima, acaba por colocar essa mesma pessoa numa posição de maior exposição, estando assim na mira da vontade de outrem que queria primeiramente manipular. Complicado? Sim, um pouco. Mas, se assim não fosse, estaríamos a falar da natureza humana?
No entanto, desengane-se quem pense que o resultado é meramente negativo. Esta tão mencionada vontade de poder também se reflecte num outro aspecto: a solidariedade. “Queda em Branco” acaba por ser ainda um belíssimo exercício da demonstração de como dar a mão na dor ou ter alguém presente na solidão (da qual muitas vezes não queremos sair) é um dos instintos mais fortes do ser humano.
Com vários momentos de humor e outros de intensidade considerável, “Queda em Branco” deixará, certamente, o espectador a questionar-se sobre as suas próprias vivências: a construção e desconstrução que se apresentam naquele espaço que parece tender para o infinito impele-nos a uma identificação constante com o que ali se passa.
“Tudo o que sou é vontade de poder. Preciso de ti para reconheceres a minha superioridade. Mas, para isso, preciso eu te aproximes. Nem que tenha que te amar.”
Para ver a 10, 11 e 12 de Maio, no IST.
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