“O jogo de Ripper” | Isabel Allende
Quando a polícia anda a dormir alguém tem de se chegar à frente
No caso de Isabel Allende, pode dizer-se que o ditado popular “à terceira foi de vez” não lhe assiste. Nascida no Peru eno ano de 1942, a escritora alcançou o estrelato logo à primeira tentativa de romance com “A casa dos espíritos”, livro que se converteu num dos títulos míticos da literatura latino-americana.
Depois de décadas de romances com personagens mostradas ao detalhe, quase sempre tendo como protagonistas mulheres de grande força moral, Allende quis experimentar escrever um policial. Inicialmente, o livro até esteve para ser escrito a quatro mãos, em parceria com o marido Willie Gordon, mas cedo Allende percebeu que, a levar avante o projecto, provavelmente a coisa acabaria em divórcio, tendo decidido escrevê-lo sozinha.
Em “O jogo de Ripper” (Porto Editora, 2014) são novamente as mulheres que aparecem na linha da frente, representadas por Indiana e Amanda Jackson que, apesar de serem mãe e filha, agem como água e azeite quando atirados para dentro de um mesmo copo.
Indiana é uma terapeuta holística com umas curvas de respeito, que tem na bondade e na liberdade de espírito os seus valores mais altos. Divorciada do pai de Amanda – Bob Martiín, um polícia – há algum tempo, recusa-se a comprometer em definitivo com qualquer um dos seus muitos pretendentes, que vão de membros de famílias de elite a enigmáticos ex-navy seals.
Amanda, a filha, é apaixonada pela natureza humana, sobretudo pelo seu lado mais obscuro. Viciada em policiais, cria com outros adolescentes espalhados pelo mundo – e também com o avô – o Ripper, um jogo de mistério online em que vão tentando resolver crimes famosos que ficaram sem solução, como o mistério à volta de Jack The Ripper. Porém, quando uma série de homicídios começa a ocorrer na cidade de São Francisco, os membros de Ripper chegam-se à frente para investigar que ligação haverá entre tantas mortes, com o pensamento de que a polícia não irá conseguir levar a bom porto a investigação.
Para os fãs da escrita de Allende, este será certamente mais um festim literário: há romance a rodos, folhetins cor-de-rosa, personagens bem construídas que aparecem e se desdobram em múltiplos de si próprios, muita conversa de bastidores e um apurado sentido corte e costura. Uma telenovela de muita qualidade, se quiserem. Já para os amantes de um bom policial à moda nórdica ou a cheirar a clássico Chandleriano – ou algo do género -, “O jogo de Ripper” poderá tornar-se ligeiramente pastoso, já que as camadas relacionais se vão sobrepondo à trama criada que, apenas no último quinto do livro, começa a aparecer e a acelerar ladeira abaixo.
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