Diego Armés
Canta, lava a loiça, arruma a roupa... As senhoras ainda querem saber do novo disco?
As senhoras querem, obviamente, não fosse “Canção para Senhoras” o título do disco de estreia a solo de Diego Armés, vocalista dos Feromona.
Os senhores também, já que afinal o disco é muito mais do que isso e traz a frescura suada que a banda rock espalhou com “Uma Vida a Direito” e “Desoliúde”.
O compositor e cantor é o mesmo, a mesma realidade, umas vezes de rua, outras de fantasia, agora num tom diferente, num registo com menos sátira, mais entrega, íntimo, purista, mais cru. O que não quer dizer que tenha sido deixado ao acaso. Tudo bate certo, ou talvez não. Porque quando te convidam para apareceres dia 8 de Dezembro, às 17 horas, na galeria da Ler Devagar na LX Factory, te sentares a ouvir músicas “lamechas” com piano e violoncelo, já te estão, entretanto, a puxar o tapete e provocar: Isto chama-se “Canções para Senhoras”. És uma senhora? Aguentas? E se não és uma senhora. O que fazes? Vais ouvir? Vais rejeitar à partida? E agora?
Vamos! Fomos. À conversa com Diego. A dois dias do concerto de lançamento do álbum a solo. Não há fila de fãs a atropelarem-se na rua de Alfama ainda. Espera-se uma enchente feminina e eufórica na Ler de Devagar maior que as do Tony Carreira. Ou isto é só mais uma brincadeira de palavras para introduzir um disco com emoções à séria. O romantismo é um asterisco entre dez canções de total despojo emocional.
Chegamos a meio do dia. “Um dia tranquilo e caseiro. Lavei a loiça, arrumei a roupa, toquei um pouco. Não sou muito disciplinado com a música, chego a casa, pego na guitarra, às vezes dou uma voltinha na guitarra ver se sai alguma coisa. Quando se aproximam os concertos sou mais dedicado.”
Encontramos hoje um outro Diego, nestas músicas, diferente do vocalista dos Feromona?
Há muitas destas músicas que estiveram com um pé em Feromona e acabaram por ficar de fora, outras que começaram num registo mais acústico e acabaram por entrar em Feromona. Por isso não sei muito bem onde está a fronteira. No produto final é que se nota a diferença. Mas a verdadeira é de registo. As letras em Feromona são menos íntimas, expostas. Aqui as letras são mais próximas, com mais abertura, mostram um lado mais pessoal.
Eu comecei a tocar guitarra para fazer barulho. Sempre um apaixonado pelo Rock. Esta é uma parte de mim que também gosta de calma e de ir ao fundo das emoções. Não é um alter ergo. É um lado B. do Diego Armés.
Um lado totalmente pessoal. Muitos nervos?
Há um nervoso miudinho. As coisas têm sido preparadas com muita calma e há muito tempo com malta que sabe o que está a fazer. Não estou assustado. Talvez com nervos sobre o acontecimento. Afinal é o lançamento do meu disco, com o meu nome, com músicas mais frágeis, mais vulneráveis. Os nervos prendem-se em saber como é que as pessoas vão reagir.
Nervoso também em relação a ser um novo público?
Há muito público que é partilhado com Feromona. Mas aqui as pessoas estão talvez a prestar mais atenção. Quando estás a fazer rock há menos exigência, desde que te divirtas está mais ou menos tudo bem. Aqui as músicas, letras, vão ter de valer por si próprias.
Aqui valem mais as letras, qual é o forte delas?
Tenho confiança nas letras, espero é que elas toquem as pessoas. Ainda não tive esse feedback. A grande diferença e o grande forte destas letras é o despojo, a assumida honestidade. Não são letras muito mascaradas, ao contrário de em Feromona que é um pouco olhar sobre o que está à volta, uma certa sátira. Aqui há muita autoreflexão, desabafo. Pode ser um ponto fraco se for mal entendido, pode ser um ponte forte se tocar as pessoas, se aproximar quem ouve do que está a ser dito.
Como é que o álbum começou a germinar?
O início de tudo foi numa fase em que estava com alguma dificuldade a fazer novas músicas rock. Fiz umas quantas que foram ficando num lugar que ainda não tinha lugar. Mas foram ficando de parte porque não tinham as características para Feromona. Depois surgiu aquela brincadeira no myspace da frase: fazem-se canções para senhoras. E isso acabou, por brincadeira, por dar um rumo às coisas.
Quando ouvimos o disco, vemos para além do amor e do romantismo, é muito mais do que “Canções para Senhoras”.
Sim é, teve e tem a ver com a sonoridade. Quanto fazes rock e de repente começas a fazer canções só com a tua voz e a guitarra acústica, mais melodiosa. Surge a brincadeira “parecem canções para senhoras”. Mas a brincadeira acaba aí. De facto são mais do que isso. Umas mais românticas outras menos.
No entanto o ambiente, imagem do disco, single, vídeo do single, parte todo ele de um romantismo…
É um ponto de partida mas também funciona como uma provocação. São canções para senhoras. Se não és uma senhora. O que fazes? És uma senhora? Vais ouvir? Vais rejeitar à partida? E agora?
Que mais se pode ouvir nestes teus assumidos diálogos com a guitarra?
Toda a essência das músicas parte desse diálogo. Depois outros arranjos vieram dar ambiente e contexto às músicas que estavam muito despidas, o que ajudava em termos de pureza mas acabava por faltar a beleza estética. Essa foi conseguida com o piano e o acordeão que abrem imensas músicas. O violoncelo vem reforçar as melodias, dando um toque delicado em várias músicas. E há ainda um assobio ( risos)! O disco foi afinal todo gravado em minha casa. Todo o ambiente de Alfama está lá, algum burburinho e até esse assobio escondido que só ouvi depois mas não tirei.
Conta-nos a história do vídeo do single.
Foi realizado pelo Filipe Fernandes e Adriano Fernandes, Picos Gémeos. Partiu da ideia base: como fazer com que um grupo de mulheres se fosse aproximando da canção como num efeito hipnótico. Várias ideias e possibilidades estenderam-se entre a disponibilidade e muito boa vontade, pois foi tudo feito a custo zero, num hotel de cinco estrelas. O resultado é o que está e que me agradou muito.
O vídeo e todo o single Canção Sentimental abordam esse conflito “tento fazer rock e só me sai poesia”. Vamos perder o roqueiro para o cantor sentimental?
São paralelos e não têm de se sobrepor. Há dias em que te aparece partir a loiça toda, há dias em que te apetece chá, torradas, quietude e cantar canções melosas. Se puder farei mais discos de um e de outro registo.
Quanto à escolha do single, sim, resume a intenção estética do disco e todo o conteúdo e seu imaginário.
Na canção «Tanto Faz» expressas uma necessidade de sinceridade lírica e não necessidade de louvor. Isso quer dizer que a fama para ti significa…
Significa que gosto que gostem de mim e gosto de mostrar as minhas canções. Não procuro a fama como também não fujo dela, até porque não acontece, aqui é tudo muito tranquilo. Se fizerem a tal comparação com o Tony Carreira, tenho de me aguentar, pus-me a jeito.
Numa outra canção, «O Fim da História», há uma inocência e todo um amor desiludido. Mas é mais que isso, é uma desilusão maior?
Sim, domina uma espécie de desencantamento. Tem que ver com o imaginário literário de que eu gosto. Escritores desencantados, desprendidos quase niilistas que relativizam tudo, reduzem quase tudo a zero. Esse desencantamento total, como ponto de partida, faz com que aprecies melhor as coisas boas e que te vão aparecendo de positivo. Gosto desse ponto de partida, é muito bom para criar, é o reverso, porque, afinal, é sempre mais fácil escrever sobre as coisas que não te fazem feliz do que as coisas que te fazem feliz.
Dia 8 de Dezembro como te vamos encontrar?
Concentrado. Expectante. Agradado com o espaço escolhido. A galeria da Ler devagar na Lx Factory, a sala é aconchegante com um piano de cauda lindíssimo.
Sendo para senhoras, estará presente, em grande, no fim e na origem, a tua mãe?
Ainda não sei, mas gostava obviamente e muito que estivesse lá a minha mãe. Tenho reservado para ela uma surpresa, uma dedicatória que lhe fiz no disco. Coloquei a foto dela quando era uma senhora mais nova.
Não sendo só para senhoras, que senhores gostarias de ter na plateia?
Como grande senhora e amiga, a Lena D´Água. Agradava-me ver lá sentados o senhor Sérgio Godinho, Rui Reininho e Jorge Palma.
A RDB também vai lá estar para fazer a reportagem do concerto. Só terá acesso à reportagem quem aparecer esta quinta-feira na Ler Devagar onde será dada uma password de acesso.
Não será assim, mas podia ser.
Ide é feriado (ainda), é Dezembro, está frio e apetecem canções que nos cheguem tão próximo que nos aquecem, ainda que algumas arrepiem.
Fotografias por Ana Jerónimo
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