Mostra de Cinema da América Latina – Reportagem
Uma nova vida para o cinema latino-americano
Numa das semanas mais chuvosas do ano, Lisboa recebeu de braços abertos a 3ª edição da Mostra de Cinema da América Latina. O Cinema São Jorge foi, até ao domingo passado, um espaço de reflexão e discussão sobre a sétima arte nos Países latino-americanos. Com uma importância crescente no circuito de festivais de cinema na capital, o evento deixou de ser uma mera mostra de filmes para se elevar ao nível de pólo dinamizador de partilha da herança cultural.
“Habanastation” (2011), filme a que coube a honra da abertura na sala Manoel de Oliveira, foi aplaudido em peso e efusivamente recebido pelo público (característica que foi, aliás, uma constante em todas as sessões da Mostra), facto que resultou num Ian Padrón bastante surpreendido, confessando-se comovido pela reacção inesperada e mostrando-se totalmente disponível para discutir a película com os presentes. A odisseia da criança perdida por acidente num dos bairros mais pobres e perigosos de Cuba afigura ser no primeiro plano uma história sobre a amizade, mas ilustra, na realidade, os acentuados contrastes sociais que continuam a caracterizar e dividir Havana.
No segundo dia, “La Jubilada” (2011) foi o centro das atenções e indubitavelmente uma das maiores surpresas do festival. Provinda do Chile e premiada internacionalmente, a primeira longa-metragem de Jairo Boisier revela o estilo arguto de um cineasta promissor com convicções definidas. Partindo de uma narrativa aparentemente simples, tecem-se duras críticas a valores e comportamentos enraizados na mentalidade das populações mais conservadoras e preconceituosas do País.
A oferta da programação de sábado fez deste o dia de feição mais organizada e virado para um público mais maduro, dado o assunto comum dos filmes apresentados: a política. Entre a deriva biográfica e o género documental, “Juan Y Eva” (2011) de Paula de Luque e “Abuelos” (2010) de Carla Valencia Dávila foram os principais destaques. O primeiro, recorrendo a fontes históricas e focando-se no romance vivido por Juan Domingo Perón e Eva Duarte, apresenta uma história consistente, tendo como pano de fundo os acontecimentos históricos que levaram ao Peronismo. Já o segundo filma a procura da imortalidade, alargando os horizontes do documentário e demonstrando o poder desafiador do cinema.
O último dia apresentou aquele que era o filme mais amplamente aguardado do festival: “Alamar” (2009) de Pedro González-Rubio. Retrato poético de uma relação invulgar entre pai e filho onde a Natureza assume um papel preponderante (sendo ela própria uma personagem), constitui uma experiência cinematográfica mística e cativante, correspondendo às expectativas geradas em seu redor.
Com uma selecção de filmes bem pensada (a maior até à data), a 3ª edição da Mostra de Cinema da América Latina proporcionou a oportunidade única de conhecer trabalhos interessantes e inovadores, que de outro modo seriam praticamente inacessíveis, uma vez que não têm data de estreia comercial no nosso país. Torna-se cada vez mais urgente conhecer o cinema latino-americano, contemplativo e com um forte valor de intervenção mas que precisa, no entanto, de crescer e aprender a respirar melhor.
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