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Alabaster DePlume @ ZDB (29.02.2024)

Fomos todos ludibriados. A multidão que se deslocou e esgotou o icónico aquário da ZDB para ver Alabaster DePlume mal sabia que, afinal, tudo era um plano para Angus Fairbairn (a mente por detrás desta aventura sónica) nos ver. Assim o confessou mesmo antes de ter executado qualquer nota no seu titubeante saxofone.

Apelida o seu instrumento, salvo seja, de wobbly. Instável, trémulo, titubeante. São de facto as características principais da forma como o mesmo é tratado nas suas mãos e boca, para além do modo transviado como toca, que tampouco é usual. Parece embalá-lo constantemente, ao ritmo das suas composições, e consequentemente acaba por embalar o público, que tende a replicar esse movimento ondulatório.

Os sopros são quase sempre meticulosos, sensíveis, sentidos. Alturas há em que a palheta parece imitar a agulha a derreter num vinil, sendo igualmente deliciosos os brevíssimos centésimos de pausa em que logramos descortinar o eco dos efeitos que Angus emprega no som do seu saxofone. A parte mais estridente e cacofónica no concerto, que acabou por ser uma excepção, foi mesmo «I Want a Red Car», sacado do álbum “The Corner of a Sphere” de 2018.

O saxofone teve a companhia em palco de duas mulheres, que se ocuparam de bateria e baixo (neste caso, Ruth Goller, que curiosamente editou esta semana um novo disco em nome próprio), que foram dando ritmo, força, jinga, densidade no fundo ao que o chefe de fila ia produzindo, algo que muitas vezes não é muito previsível. Destaque igualmente para os coros que ambas as executantes foram igualmente ofertando, com especial destaque para a abertura do concerto, com um ressoar absolutamente celestial, que assegurou um encantamento desde o instante inicial.

Houve ainda tempo para que Angus substituísse o saxofone pela guitarra eléctrica, através da qual interpretou, por exemplo, «Gifts of Olive», uma música embalada por um espírito natalício anémico devido às “festividades” que ocorrem noutras partes do globo.

Para nós esta presença de Alabaster DePlume serviu para vergar um pequeno preconceito, que indica que normalmente as actuações destas correntes mais eruditas prestam-se a alguma frieza emocional por parte de quem as assina. Nada mais oposto à querida e bem humorada postura que o músico britânico revelou na Galeria Zé dos Bois, mostrando-se muito focado em aproveitar aquele acontecimento, que é sempre único e irrepetível, com aquelas pessoas e aquela energia do momento.



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