Experimental com Fusão
Conversámos com os Experimental com Fusão, em vésperas do concerto de encerramento do INDEX
Em entrevista à Rua de Baixo, a banda Experimental com Fusão falou-nos do seu percurso musical e da forma como estão na música. São eles: Iuri Andrade (saxofone e guitarra), João Nunes (guitarra baixo e percussão) e Leandro Pena (percussão e guitarra).
Como é que vocês se conheceram e formaram a banda?
Iuri Andrade: Acho que foi um pouco por causa do Quiosque do Refresco, na Praça das Flores, em Lisboa, espaço onde trabalho. Quando não estou a atender clientes, aproveito os momentos para tocar saxofone ou guitarra. E, durante o processo de atendimento, sem esperar, acabei por vir a conhecer o Leandro, que me disse que devíamos tocar juntos, ele que também toca percussão. Uma vez levou o cajón e, num dia em que eu tinha lá a minha guitarra, tocámos um bocado. Ele estava sempre a dizer que eu tinha que conhecer o Jota (João Nunes) afirmando que, para além de eu vir a gostar dele, tinha bom gosto a tocar guitarra. E assim foi; conheci-o em casa de um amigo nosso, que depois comecei a frequentar e onde começámos a tocar. Tens três músicos numa sala a conviver…
Leandro Pena: E um limoeiro…
IA: Ya! O Quiosque do Refresco foi o responsável pela conexão inicial. No entanto, apesar de nos primeiros tempos a ideia de projecto conjunto não estar formada, uma vez que tocávamos ocasionalmente, com o tempo, as nossas experiências na casa do nosso amigo vieram a revelar-se muito importantes.
Sei que o dono de um restaurante ali das redondezas queria que vocês fossem lá tocar…
IA: Não éramos nós, a cena era essa. Eu tinha muitos contactos nessa direcção, só para tocar saxofone, lá está o fascínio do instrumento. E então falei com o dono, porque estava um bocado farto de tocar sozinho – sim, porque tocar saxofone sem mais ninguém por trás, é um bocado… é Picasso, não é? (risos). E então perguntei-lhe se ele não se importava que eu levasse mais dois músicos, ao que ele respondeu que não e, então, nasceu! Esse concerto foi uma grande merda!
E o nome, Experimental com Fusão, como surgiu?
LP: Uns dias antes do concerto, eu e o Iuri estávamos no Quiosque do Refresco a atrofiar com o nome a dar à nossa banda e acabámos por chegar à seguinte conclusão: banda experimental com fusão. E…, Experimental com Fusão, grande nome!
IA: Por causa do trocadilho, porque nós éramos um bocado confusos a tocar. Nós ainda temos o nosso primeiro alinhamento escrito e há lá muitas coisas, “Bossa 1”, “Bossa 2”, isto, aquela, a outra…
Mas vocês tocam sobretudo originais, certo?
IA: Sim, é tudo material original. Nesse primeiro concerto, tocámos uma ou outra coisa, tipo Seu Jorge, ou uma coisa assim…
LP: Para alimentar bem o jantar. (risos)
IA: Mas é sempre tudo originais. As músicas são sempre composição de todos, na verdade. Tanto que depois dar os nomes às músicas também é um bocado aleatório. E, neste aspecto, este projecto fez-me muito pensar nisso, que a música instrumental, ou aquela que carece de letra, o título, repentinamente, ganha um peso diferente, porque é a única referência verbal.
Vocês têm alguma formação em música?
LP: Aos treze anos, a minha mãe ofereceu-me um Djembê pequenino e eu ia com aquilo às costas para o Adamastor, em Santa Catarina. (risos)
João Nunes: Quando frequentava o liceu, por volta dos meus 14 anos, tive uma guitarra, uma “Starfire”, e de repente aprendi a tocar com amigos nos intervalos e a ver como é que faziam os acordes, como colocavam os dedos nas cordas para fazer soar aquele som. A minha formação é essa.
IA: Eu também não tenho formação, ou pelo menos numa instituição. Numas férias de Verão, estava muito aborrecido e comprei uma guitarra, porque era barata e comecei a ver coisas na net para aprender a tocar. Depois entrei para a faculdade, onde conheci três cavalheiros que tocavam lá guitarra todos os dias. Comecei a levar a minha guitarra também e passei cerca de 10 meses a tocar todos os dias durante imensas horas.
LP: Abençoado sistema de ensino.
IA: Abençoado sistema de ensino! (risos). Eu só fiz uma cadeira na faculdade. Na verdade, frequentei uma esplanada que tinha um reitor e não necessariamente uma faculdade. Quando saí da faculdade perdi um bocado essa cena diária, que me fez muita falta e comecei a ler. Li cenas que estavam muito para lá daquilo que eu sabia na altura. Li o “Theory of Harmony”, do Schoenberg, e muitas outras coisas e, hoje, quando as volto a reler, já retiro outra informação que não retive da primeira vez. Na altura em que os conheci já me estava nas tintas para a cena da formação. O que eu queria mesmo era tocar com pessoas.
O saxofone, como aparece?
IA: O saxofone é a tal coisa… eu toco-o e tenho lata para o fazer ao vivo porque a maioria das pessoas só de ver um saxofone já… (risos). Como diz uma amiga nossa, já têm contracções só de olhar para um saxofone! Houve um período em que eu estava mais isolado e não tinha ninguém com quem tocar. E nessa altura era vizinho da Paula Sousa, que organizava umas sessões em sua casa, onde acabei por ir várias vezes. Entretanto, soube que o filho dela estava a vender um saxofone alto e eu estava com vontade de ter um sopro, pois sentia falta da cena de poder suster uma nota, e comprei-lhe o instrumento. Foi um bom negócio (risos).
E sobre os vossos instrumentos, o que me querem contar?
LP: Eu toco percussão. Consoante os temas, uso o cajón, djambês – uns mais apertados com som de bongós -, drambucas, pandeireta…
IA: O djambê gigante agora funciona como bombo.
LP: O passarinho.
IA: (risos) Sabes aqueles passarinhos de barro que enches de água, sopras e faz…? Muito louco!
LP: Eu toco ainda guitarra, o Iuri toca guitarra e sax, e o João também toca percussão e guitarra baixo. O baixo é um bocado o instrumento ping-pong aqui. (risos)
IA: Eu acho que o nosso formato mais producente, se é essa a palavra, são duas guitarras e é percussão. Temos muitas músicas assim. Eu faço guitarra ritmo, o Jota, lá está, faz o temazinho, e o Leandro cobre tudo com percussão. Isso funciona muito bem.
Quais são as vossas influências musicais?
JN: A minha praia é o rock. Eu cresci com o meu pai a ouvir rock sinfónico, bandas dos anos 70, muito jazz também, Pink Floyd e todo esse mundo. Mais tarde, levei com as influências do grunge. Gosto de Neil Young, Donavon Frankenreiter, Jack Johnson, John Butler Trio, Radiohead, Pearl Jam, essencialmente é por aí.
IA: Comecei a ouvir o que a minha mãe tinha lá em casa, que era Beatles e Phil Collins. O que me despertou para a música e me marcou muito foi o hip hop, que ainda hoje ouço bastante. Tenho um amigo que me deu uma cassete com o primeiro álbum do Boss AC, “O Manda Chuva”. É um álbum do caraças! Epá, eu sinto muito aquele quatrenário fodido do hip hop, sinto mesmo! Ouvi muita música brasileira, as bossas todas, o Jobim, o Gilberto, tudo o que meta Vinicius, Toquinho, Samba e Choro. Também gosto muito de Cartola e Paulinho Nogueira. Descobrimos Cicero há uns tempos, que tem um álbum muito bom, chamado “Canções de Apartamento”. Depois tenho uma alta cena pelo jazz! Ouvi muito Monk, Art Tatum, Dexter Gordon, Lester Young, Coleman Hawkins, Sonny Rollins... Gosto muito do Coltrane, porque a música dele mexe bastante comigo. Gosto do “My Favorite Things”, do “Giant Steps” e do “Blue Train”. Há um muito louco que tem aquela malha, «Equinox». Gosto daquela fase com o Miles e do “My Favorite Things” em diante, essa merda toda, é macabro! Cada vez gosto mais de Wayne Shorter, o gajo tem aquele veludo, é mesmo um abusado! E hoje em dia estou muito contente porque descobri uma editora super fixe, baseada na Bulgária, que é a Dusted Wax Kingdom, que é a mistura dessas duas coisas. É hip hop, é sample music. Mas acho que é essencialmente, isso, jazz, hip hop.
LP: As minhas influências são pessoas como o Iuri e o Jota. Passei a fase do hip hop e da brasileirada e, na altura da percussão, lembro-me, perfeitamente, dos Oloduns. Depois comecei a ouvir Tito Puente, muita salsa e fui a Cuba no tempo do Buena Vista. Gosto muito de Pearl Jam. A minha cena no jazz começou com o Iuri. O meu pai ouvia Pink Floyd, Doors, muito Zeca Afonso e música clássica. Também gosto de John Butler e de Aduk.
Sei que, há pouco tempo. adquiriram um PA e que isso permitiu-vos melhorar substancialmente um conjunto de coisas.
LP: Epá, isso foi óptimo!
IA: Nós tocávamos uma música e, antes de tocar a próxima, havia ali sempre um interregno de dois a três minutos, para conseguirmos ligar tudo conforme necessitávamos. Era um grande filme! Era muito complicado a nível técnico. Então comprámos a mesa, que nos permite termos tudo o que usamos sempre ligado, e uma coluna em que utilizamos um fender de baixo como outra coluna e, agora, é tudo muito mais fácil. O som melhorou e ainda permite gravar, embora de uma forma um pouco crua. Basicamente, a mesa veio colmatar dificuldades técnicas que nós tínhamos durante os lives. Como cada um de nós toca mais de um instrumento, a mesa torna essas trocas mais fáceis.
Como surgiu o convite para actuarem no encerramento do INDEX (Festival de Cinema e Experimentação) em Tomar?
JN: Pelo Facebook! Fomos contactados pela organização e disseram-nos que tinham visto algumas coisas nossas na net e que tinham gostado e fizeram-nos uma proposta. Foi assim mesmo.
Que podemos esperar da vossa actuação, vão ser irresponsáveis?
LP: Claro que não vamos ser irresponsáveis! Escolhemos um leque de músicas que por si só dariam um filme, uma viagem, vários sentimentos. Acima de tudo gostamos de nos divertir e de divertir os outros. Vai ser um grande concerto, estou certo disso!
E um álbum está nos vossos horizontes, têm material gravado? Quais são as vossas ambições?
JN: Estamos a trabalhar nisso.
IA: Agora que já temos a mesa e uma forma de gravar, não vou dizer com alguma qualidade, mas decência, e as músicas mais estruturadas, eu não me importava de pôr cá para fora qualquer coisa. Mas sim, porque não um álbum?
Os Experimental com Fusão tocam no próximo sábado, 13 de Abril, na sessão de encerramento da segunda edição do INDEX – Festival de Cinema e Experimentação, no Theatro Bar (Tomar).
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