Yo La Tengo @ Aula Magna (01.03.2013)
Esquizofrenia electro-acústica em noite de dualidades
O palco da Aula Magna, decorado com um conjunto de três árvores de contraplacado no background de um aglomerado de instrumentos, ajustou as luzes pouco depois das 21 horas, para abrir as hostes ao novo regresso dos Yo La Tengo a palcos portugueses. Com o mais recente registo, “Fade”, como pretexto, a banda inicia-se em formato acústico: Georgia Hubley atrás de um pequeno set de percussão no centro de um enquadramento executado por Ira Kaplan e James McNew, que percorreram vários instrumentos.
Não será de estranhar a investida acústica da banda de Hoboken, que desde há muito faz questão de debitar as suas faixas com novos arranjos – até mesmo em estúdio não será difícil encontrar as versões alternativas que propõem para os seus temas. Assim, abrem com «Ohm», faixa prima do novo registo, numa aproximação que desde logo desfaz as dúvidas: não vieram à Aula Magna para festejar as quase três décadas de existência, apresentam-se antes enquanto três tipos a tocar as músicas que escreveram à média-luz.
Prova disso será o primeiro golpe fora do alinhamento previsto, com Ira a sugerir aos seus companheiros que toquem «Gentle Hour», com o baixista na voz após alguns minutos de afinação na sua guitarra. O alinhamento acústico terminaria em «Tom Courtenay», com Hubley a largar as baquetas e ao microfone, depois da cândida «Cornelia and Jane». Seria, então, momento para um intervalo “de alguns minutos”.
Meia-hora volvida, em que as árvores de cena passaram para o segundo-plano revelando mais uma parafernália de instrumentos que escondiam, a banda volta a subir ao palco, mas agora para outro concerto: a distorção da guitarra de Kaplan invade o auditório e explode largamente a escala de decibéis anteriormente debitados, numa lógica demonstração de intenções. Atirando-se rapidamente a «Nothing to Hide», do disco “Popular Songs”, poucos momentos de silêncio se seguiram.
A certa altura, um admirador pede que toquem «The Story of Yo La Tengo», ao que Kaplan responde que a história estava ali a ser contada. Logicamente, enquanto dona de um repertório desta dimensão, esta foi, claro, uma versão da história dos Yo La Tengo – talvez não a mais eficaz mas, novamente, não vieram em formato retrospectiva para comemorar nenhum aniversário e afastaram desde o início o comprometimento para quem tinha vindo à espera de escutar o best-of.
Se há coisa de que não podemos acusá-los é de que se mantêm na zona de conforto. A viagem distorcida tem paragem num momento em “I Can Hear the Heart Beating as One”, com «Little Honda», ou com mais uma investida em «Ohm» (desta vez electrizada) – não sem antes passar pela fabulosa «Before We Run», última faixa de “Fade”.
Para encerrar o quadro eléctrico, a banda lança-se a «Pass the Hatchet, I Think I’m Goodkind», francamente esticada até Kaplan começar uma onda de violação das suas guitarras que envolve técnicas resgatadas ao sado-masoquismo e espancamento por baquetas. Fica a dúvida se não vimos mais do que queríamos (para assistirmos ao Holocausto de ruído ainda aguardamos o final de Maio), mas, quase vinte minutos depois, a banda volta a recolher-se aos aposentos.
Visivelmente mais sóbrio, Kaplan lidera novamente a banda para um terreno de transição entre as duas partes do concerto – agora que se trata do primeiro encore. Repescadas dos anos 60, duas covers deram lugar a mais uma – pedida pela fila da frente do público, cujo entusiasmo foi louvado por Kaplan a esse ponto em que teve de pedir uns minutos para ensaiar a música escolhida.
E eis que, depois do alarido, os Yo La Tengo apresentam «Griselda», com a voz de Georgia a encerrar a noite. Terá sido um concerto esquizofrénico, sem dúvida, mas um regresso da banda de Hoboken valerá sempre a pena – “vi três concertos deles e foram todos diferentes”, dizia-se à saída.
Fotografia por José Eduardo Real
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