Cinema de terror
Os filmes de terror são melhores que os outros todos
Não é só a música, o cinema tem vindo a piorar francamente nos últimos anos. Parte da culpa será certamente da nossa sobreexposição constante à imagem, assim como a repetição dos mesmos modelos por parte da maioria dos cineastas, mas nada disso altera o facto da maioria dos filmes deste lado do ano 2000 serem uma merda. Apesar deste facto, “High Fidelity”, um dos melhores filmes de todos os tempos saiu precisamente no ano 2000.
No respeitante aos blockbusters de Hollywood, quando foi a última vez que saiu de Los Angeles um filme com a inteligência desafiadora de Matrix (mais louvado pelos efeitos especiais do que pelo carácter) ou de Fight Club? Talvez a última mostra de Hollywood estar disposta a desafiar os cânones do pensamento conformado e burguês tenha sido “V for Vendetta”, que mesmo assim se demite de qualquer afirmação concreta. É verdade que as distopias agora estão na moda com filmes como “Hunger Games” a fazer as delícias adolescentes, mas este é um caso em que o potencial conteúdo político é afogado na tentativa de tornar o filme numa nova saga “Twilight”, que não é mais do que um branqueamento dum género com também ele bastante potencial para levantar questões existenciais. Mas a verdade é que o cinema de Hollywood é para vender pipocas e refrigerantes, não para fazer pensar.
Claro que houve uma altura em que o cinema independente se anunciava como a salvação do aborrecimento desprezível a que a sétima arte se entregou desde mais ou menos alturas do advento do uso massificado da internet, com películas como “Lost In Translation”, “Hedwig and The Angry Inch” ou “Memento”, mas salvo algumas honrosas excepções como “The Perks of Being a Wallflower”, a generalidade dos filmes indie optou por seguir o mesmo estafado formato de todos os outros com o seu aspecto bonitinho e silencioso.
Se formos esmiuçar o género que mais esgotou as cabeças dos VHS nos anos 80 e 90, o filme de acção, então a desgraça ainda se torna mais iminente, sendo a prata da casa a salvar a honra do convento, com intervenções medíocres mas ainda assim melhores do que a maioria, de Bruce Willis ou Sylvester Stallone. Quem ainda se safa no meio de toda a mediocridade do cinema de acção é Vin Diesel e Jason Statham, e claro Nicholas Cage que desde que lhe seja atribuído o papel certo, nunca erra.
Se o assunto forem as comédias, o problema passa de crítico a terminal com a honrosa excepção a ser “Napoleon Dynamite” com um lugar firme no top 10 das melhores comédias de todos os tempos. Com muita vergonha, sou também obrigado a reconhecer que “Ted” é das melhores comédias dos últimos anos, embora nem sequer chegue aos pés de “Howard the Duck”. A contrariar a tendência geral de desgraça está também “Shaun of the Dead”, embora este tenha um pé bem firmado no reino do terror.
Infelizmente, os filmes de terror tem sido a classe mais massacrada neste século, sobretudo devido à decisão de recuperar o género para as massas, desvirtuando-o assim da sua génese, e tornando os filmes na maioria dos casos nada mais do que telenovelas mexicanas de 90 minutos. Ainda assim, o terror continua a ser o melhor género de cinema porque mesmo nos casos em que o filme é um completo fracasso há pelo menos a chance de ver nudez e sangue, que convenhamos, são as únicas coisas que podem impedir que uma película má seja um falhanço total. Ao menos neste género, existe sempre a esperança de ver o personagem que mais nos irrita (Jar Jar Binks em “Phantom Menace”) ser decapitado ou esventrado com requintes de maldade. Da mesma forma, não são muito remotas as chances de ver espancada até à morte dentro dum saco cama a adolescente em quem projectamos todos os nossos fiascos do liceu. Com alguma sorte, mesmo que não tenha muito gore, conseguimos ver um filme com momentos verdadeiramente assustadores, ou, se tudo o resto falhar podemos sempre tentar assustar a pessoa com quem estamos a ver o filme.
A realidade não é que o espectador deste género seja menos exigente, mas antes que, devido às banhadas que já levou as suas expectativas são certamente mais baixas.
Apesar de tudo, o Sec. XXI serviu para a afirmação da França como grande potência do horror cinematográfico, acto iniciado com “Haute Tension”, e que conhece a apoteose com “Martyrs”. Da mesma forma, desde a comercialização de “Ringu” em 1998, o cinema asiático de terror tem tido bastante oferta, na sua maioria de qualidade superior à ocidental, ainda que o seu modelo se tenha também tornado algo fatigado. Do leste europeu, surgiram também alguns sinais de esperança, com filmes tão sádicos que fariam o Marquês de Sade corar, como é o caso de “A Serbian Film”. Em Espanha também tem sido produzidas propostas interessantes como o franchise de “Rec”, “Buried” ou “El Espinazo del Diablo”. Até Portugal deixou a sua marca com o excelente “Coisa Ruim” de Tiago Guedes.
Outra coisa em que este século tem sido profícuo é na recuperação de nichos para o grande público, como as sagas de vampiros à-lá “Morangos Com Açúcar” ou as de zombies à laia de telenovela como é o caso de “Walking Dead”. Nem mesmo o terror psicológico e as possessões demoníacas se conseguiram salvar.
A vantagem é claramente, que estas domesticações da indústria cinematográfica podem ser uma maneira de iniciar a namorada no género.
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