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Remind: Lisboa in the Market

A Lisboa do costume, mas mais bem vestida.

Se Setembro cheira a fim de verão e festa, Outubro cheira, não só a castanhas quentes e boas, como a colecção nova nas lojas e, claro, a moda em Lisboa. É inevitável aquele nervoso miudinho que começa logo com os preliminares que a associação vai criando na imprensa – quem vai estar pela primeira vez, quem vai voltar, qual o mote, onde vai ser, etc. Mas na última edição deste fim-de-semana comprido que enche a capital de estilo e bom gosto, houve um cheiro extra que se apoderou dos nossos sentidos: cheirinho a fruta fresca, a legumes suculentos…

E visualmente? Uma injectada de cor que levou milhares do mundo inteiro até ao nosso querido Mercado da Ribeira. Confesso que, para além do excitamento do costume em deleitar os meus olhos naquelas peças que só posso olhar e não tocar, este apontamento do mercado ainda aguçou mais a minha vontade de lá estar.

Infelizmente para mal do meu trabalho, os dois primeiros dias foram acompanhados indirecto, no verdadeiro sentido da palavra, através dos vídeos que o Daily Moda Lisboa vai, e muito bem, disponibilizando. Triste, é claro, porque poder assistir a desfiles entre rosas e margaridas, laranjas e cenouras ou morangos e abóboras, deixa infeliz quem se encontra por trás do matacão cinzento que é o computador. A sério, mesmo sendo um Mac.

Mas e porque a vida é bela, we’ll always have saturday. And sunday. E esses dias, meus caros e meu querido (namorado), estão há muito marcados na agenda. Portanto, não há chuva que me desmanche o penteado, pedra na calçada que me impeça de subir ao alto dos meus saltos ou mal que me impeça de alçar da máquina fotográfica, do moleskine e da caneta, para retratar essa arte que é para mim a moda.

A Maria (a Guedes) estava lá em baixo e apitava desenfreada. Eu, enquanto dava as últimas pinceladas de blush e me despedia do namorado, apertava os botins, e preparava-me para descer uma dezena de vão de escadas mais rápida que a Naomi a desfilar, tudo para conseguir chegar a tempo ao primeiro desfile. Uma realidade sempre possível porque, lá está, a coisa nunca começa à hora marcada. E ainda bem.

Estava um sábado abençoado por um sol radioso e o hall de entrada encontrava-se à pinha. O cenário era mais ou menos o seguinte: gente e mais gente de outfits estudadíssimos, o britânico negligée, o chic pariseiense, o japonês que fashionisticamente falando, dispensa apresentações, o jornalista que trás sempre o seu cão – impossível não o conhecer – os bloggers mais badalados da cena fashion internacional, enfim.

Depois, do lado de cá, as caras do costume, as personalidades cá do sítio unha e carne com os fotógrafos, as modelos que fumam, impecavelmente maquilhadas, enquanto esperam pelo próximo desfile, o pessoal do backstage sempre olhar para o relógio que relaxa de vez em quando desmanchando-se numa gargalhada graças aquela personagem, que, vá, se esticou um bocadinho no outfit. O quadro do costume, mas melhor pintado. A Lisboa do costume, mas mais bem vestida.

Infelizmente já tínhamos perdido Gama e Ricardo Andrez no Lab, mas Aleksandar Protic prometia, e os lugares que conseguimos na front row foram a cereja no topo do bolo. O som electro começou, o meu pé acompanhou o ritmo e a minha boca só voltou a fechar-se segundos depois do final do desfile. E mesmo assim custaram-me as palavras: “que beleza!” dizíamos eu e a Maria em uníssono. Com o sexyness e a simplicidade necessários para uma rapariga se apaixonar.

Cortes impecáveis abriram a passerelle em tons cinzas entre vestidos, macacões e fatos de calção, que terminaram no chic, e completamente necessário, preto. Com uma preocupação sublime pelo corte (sim, fiquei rendida ao corte principalmente de um top cruzado atrás que era simplesmente too die for), os materiais utilizados também não foram esquecidos, conferindo toda a leveza que aquelas peças pediam. Assim, linhos, sedas e pele, cobriam os corpos das manequins que deambulavam de pele imaculada e make-up muito clean, com o cabelo meio puxado para trás que transpirava a frescura do summer time. De fôlego recuperado, lá fomos para a voltinha dos tristes, passe a expressão.

Nada contra, nada a favor, apenas aquele tempo de espera que separa os desfiles, mas que sei absolutamente necessário, desespera-me. Só isso.

Bons minutos mais tarde, é hora de nos irmos misturar com peixeiras, frutas e legumes. Um cenário magnífico para assistir ao passar de uma colecção inspirada nas viagens étnicas de Daniel Dinis. Masculina e muito desportiva, a colecção tinha como base o lazer. O curtir as horas vagas com descontracção e bem-estar. Assim, pudemos ver muitas calças e blusões que, num estilo mais relax se misturavam com tons pretos, brancos e cinzas mais contemporâneos, citadinos. Um desfile que, não tirando o fôlego, deu para descontrair e preparar para o que se lhe seguia: Adidas.

Já sentada, comentava com a Maria um senhor também já ele sentado, mais precisamente na 1ª fila, vestido de amarelo da cabeça aos pés numa espécie de fato treino da marca Adidas. Eu dizia-lhe “de certeza que tem alguma coisa a ver com o desfile”. Dito feito. Foi um daqueles shows que uma pessoa só tem vontade de se levantar, ir até à catwalk e dançar. Dançar muito. O desfile teve personalidades, teve palmas, teve risadas, teve dança e no final, a surpresa que eu já esperava: um show de breakdance, com o dito senhor amarelo e mais uns quantos que, literalmente, fecharam Adidas em beleza.

De passagem rápida por Lidija Kolovrat e Katty Xiomara, ponho sempre alguma fasquia elevada no enfant terrible português: Dino Alves. É sabido que tem sempre alguma na manga e os seus desfiles são sempre uma incógnita. Desta vez o tema foi até sério e bastante actual. O estilista questionou as redes sociais e tudo o que elas implicam: “o facto de nós nos relacionarmos com outras pessoas sem as conhecermos fisicamente e no entanto sabemos imenso sobre a vida delas.

Ou achamos que sabemos, porque a outra pessoa pode estar a dar-nos uma identidade totalmente adulterada, mas na verdade é aquela identidade com que nós lidamos porque é a que conhecemos. Peguei na ideia de nós enquanto logótipo.” E assim foi, com base nos bonequinhos do Messenger, Dino pegou nas formas geométricas puras, sobretudo o círculo – “que também é uma metáfora relacionada com esta questão das redes sociais onde tudo funciona em circulo e em cadeia” – para construir peças que entraram em colisão com cores e formas, tudo de volta e em volta desse logótipo que, basicamente, é o que somos enquanto seres online.

Enfant terrible fora, é tempo de abrir as portas a Miguel Vieira.

A classe do costume, a sofisticação de sempre e desta feita pintada a preto e branco num cenário de casamento perfeito. Chiquíssimas elas, com vestidos e fatos de corte perfeito, de óculos que dão aquele ar de mulher sofisticada que vive bem sozinha e com o cabelo apanhado daquele modo “não tive tempo de lavar o cabelo, mas mesmo assim estou impec”. Miguel Vieira é isto, eleva-nos ao estatuto da mulher que todas desejamos ser e tornando-o possível. A sensação de quando saímos de um desfile de Vieira é de um “yes we really can”. Principalmente se tivermos de saltos altos.

E pronto, terminado o desfile, é nuns pés já um pouco queixosos que deixamos para trás o mercado no final de um sábado que transbordou glamour e sense of fashion. Agora é hora de ir descansar que amanhã há mais – e há que manter a boa cara. Olheiras na moda Lisboa é que nem pensar.

O domingo começou cedo e com uma ligeira dor de cabeça. Mas a promessa era para ser cumprida e, como disse no início, não havia mal maior capaz de me prender em casa (e ainda tinha o namorado doente a quem só me apetecia ficar a tratar e dar beijinhos, pois). Mas Moda Lisboa só há duas e seis meses de espera é muito tempo, portanto, Maria lá em baixo outra vez, escadas a fundo, desta feita com uns oxford shoes nos pés (sem saltos please) e 5 minutos depois: Mercado.

Vítor já ia a meio no Lab, portanto com este ficámos arder. Mas sabíamos que dentro de minutos Ricardo Dourado ia brilhar e só isso é que interessava. Expectativas gigantes, vontade enormérrima, máquina numa mão, bloco e caneta na outra e o coração a trezentos. O fumo branco anunciou início do desfile com uma batida que não podia encaixar melhor com a entrada dos manequins na catwalk. Cliché à parte, foi amor à primeira vista.

Tons crus, ou “falsos brancos”, tons da terra e areias que se alastravam ao mesclado para criar peças de corte perfeito, em formato de vestidos leves e com um toque de étnicos (o primeiro, por exemplo). Calças e calções, camisolas em malha tão leve que apetece passar um Verão com ela, túnicas de linho, parkas, mas tudo tão suave… é-me difícil falar desta colecção porque imediatamente entro numa lalaland e fico completamente nas nuvens. Mas continuando, os botins camel rasos, apontavam para um casal aventureiro, a mochila – um detalhe maravilhoso também – completava o conjunto fazendo lembrar tempos de interrail, e a trança no cabelo atrás – uma espécie de rasta – era o apontamento que faltava, quando já achávamos que melhor era impossível.

Engracei bastante com os óculos, uns round glasses à la John Lenon, porque tinha comprado há bem pouco tempo uns iguais, uma imitação Ray Ban, que amei e ninguém os compreendia. Escusado será dizer que depois do desfile, todos compreenderam.

Enfim, o desfile de Ricardo Dourado deixou-me numa estado de nostalgia, misto de êxtase misto de neura: se por um lado amei tudo, por outro também queria ter tudo. E isso já não era possível. E claro, este delírio é injusto para quem se segue na apresentação da colecção, já que é fácil gostar menos de quem vem a seguir quando se gosta tanto de quem veio antes. Mas, trocadilhos à parte, o que me valeu é que Sara Lamúrias de Aforestdesign é muito a minha praia, portanto a coisa tinha tudo para correr bem. E correu. Quem não se lembra dos jogo de simetrias com os óculos e sapatos?

O estilo desportivo do costume, a predominância do cinzento mesclado tão típica de Lamúrias, brancos e crus em peças bem construídas, daquelas que davam um jeitão ter sempre no armário. Provavelmente os basics menos basics da praça. E, como dizia o americano Alexander Wang, “é muito fácil estar bem vestido quando se vai a uma festa, mas é no dia-a-dia, no estilo mais informal possível, que vemos quem sabe realmente vestir-se.” E com umas peças de Aforest no armário, falando por mim, garanto que safaria bem a coisa.

Mas back to the catwalk que se vai falar de White Tent (com alguma pena minha, fiquei presa numa conversa de cariz profissional na zona chamada Vip, e já não consegui ver Pedro Pedro com olhos de ver).

Tenho um carinho especial por esta dupla. Primeiro, valem o que valem enquanto designers. Foram, na minha opinião, pioneiros em mostras de trabalhos disruptivos, que ultrapassaram a barreira daquilo a que estávamos habituados. Depois, são uns amores de pessoas. Irradiam simpatia, sempre prestáveis e com atenções que é raro ver em talentos deste calibre. Gosto deles e eles estão cansados de saber isso, aren’t you Evgenia e Pedro? Claro que sim.

Mas dizia eu, que vinha de coração cheio graças a Dourado. Verdade, mas também foi verdade que esta dupla veio preencher-me as medidas. Num estilo muito idêntico ao jovem do norte, Evgenia e Pedro, voltaram a transportar-me para uma viagem de cariz individual por esse mundo fora, com a descontracção de quem só quer conhecer mais.

O corte impecável como já nos têm vindo habituar, que se desmonta em peças que vão desde as calças aparentemente mais simples, ao reinventar do trenchcoat, com detalhes que dão vontade de desmembrar, às t-shirts à Alexander Wang, em tecidos leves sempre nos tons neutros da família do bege até chegar ao antracite. O “craft” da estação, dizem eles? As malhas tricotadas, assim como os apontamentos em tons eléctricos do azul e vermelho. Maravilhoso. Maravilhoso e o suficiente para voltar a casa feliz com mais uma edição que vê talentos crescer desta forma.

Sim, com grande pena minha, tive mesmo de voltar a casa. Para trás deixei os desfiles que fecharam uma grande, e arrisco-me a dizer que das mais aplaudidas, edições de moda em Lisboa. Uma edição onde não faltou criatividade, talento e muita vontade de trabalhar ainda mais. O final de uma Lisboa linda como sempre, apenas mais bem vestida.

De uma vez por todas, bora lá dizer: o que é Nacional, é ou não é bom?



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