“Thérèse Desqueyroux”
Thérèse Desqueyroux desenha-se no grande ecrã através de um traço cru, dramático, e a juntar-se a este registo está o facto de este ser o último filme da carreira de Claude Miller, que faleceu em Abril de 2012, a um mês da estreia.
Trata-se da segunda adaptação do romance de François Mauriac, a quem foi atribuído o Prémio Nobel da Literatura em 1952. Thérèse Desqueyroux passa-se numa França dos anos 20 e conta-nos a história de Thérèse (Audrey Tautou), uma mulher que em nada se enquadrada com a sociedade retrógrada de então. O ambiente é rural, e pautam-se os pensamentos das restantes personagens por ideologias extremamente restritivas e limitativas.
A protagonista espelha emoção e vontade de viver apenas enquanto é criança, nos momentos que vemos serem partilhados com a sua melhor amiga, Anne (Anais Demoustier), que é também a irmã do homem com quem Thérèse irá casar. O casamento com Bernard (Gilles Lellouche) não será mais do que a concretização de uma lógica machista na qual a união matrimonial existe para servir interesses económicos, e na qual se reduz o papel da mulher à reprodução de herdeiros.
Se no início desta série de acontecimentos Thérèse aparenta uma certa resignação, depressa lhe começamos a perceber uma crescente intolerância face ao padrão de vida imposto. Sufocada pelos valores familiares, começam a definhar-se-lhe os valores e torna-se difícil compreender a ambiguidade desta sua nova faceta. Não lhe vemos espelhado um desejo puro de liberdade, nem lhe conseguimos roubar a apatia do olhar.
Queimam-se os pinheiros, ferem-se as aparências. Thérèse torna-se numa personagem pesada e inicia-se um processo de degradação física e espiritual que nos confunde e nos faz questionar sobre onde começam e acabam as boas e as más atitudes. Uma teia dramática que tão depressa nos ajuda a compreender o rumo que tomam as personagens, como no momento seguinte desnorteia e nos torna incapazes de discernir o lado bom da história. Ao final de contas, quanto valem os nossos valores, quando confrontados com outros, os dos sistemas instituídos?
Para os apaixonados da eterna Amélie Poulain, este é um registo bastante diferente para a actriz Audrey Tautou. Mas ela é, também, a única personagem efectivamente relevante e arrebatadora em toda a história. Uma personagem densa que convida à reflexão sobre o perigo das opressões, das restrições e da proibição de pensamentos.
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