Carlos Nobre
Xô! Isto não é uma revista cor-de-rosa!
Pacman, Carlão, ou Carlos Nobre, como agora assina, veio à RUA mas para nos falar do seu novo projecto a solo: “Algodão – Uma Falaciosa Noção de Intimidade”. Ele bem tentou “trocadalhos” com o título do disco e distrair-nos. Sim, com alguns palavrões, mas aqui não há “noção falaciosa”. Aqui está Carlos Nobre, ex-Da Weasel, autor, compositor, cantor, amante, pai.
“Algodão, uma falaciosa noção de intimidade”, lançado a 3 de Outubro, tem apresentação ao vivo dia 21 de Outubro, no Teatro do Bairro.
Para muitos ainda Pacman dos Da-Weasel, hoje Carlão dos Dias de Raiva e, ao mesmo tempo, aqui e agora, Algodão assinando como Carlos Nobre. Este projecto é mais sério, mais adulto, é mais tu?
Foi tudo acontecendo por acaso mas define as minhas fases na música. No tempo de Da Weasel estava quase imposto ter uma alcunha. Tinha 19 anos, Pacman pegou de estaca. Mas o próprio facto de ser um nome em Inglês hoje em dia já não faz sentido para mim e para as coisas que fui fazendo. Carlão sempre me chamaram desde puto. Carlos Nobre é o meu nome de B.I., a minha identidade. Este projecto é em tudo meu, escrevi as letras, compus as músicas, interpretei todas elas e vivi, de certa forma, todas elas.
Mas o projecto tem o nome de Algodão. É para te protegeres de toda a intimidade que pões aqui, sobretudo nas letras que falam de onze mulheres da tua vida?
Em Algodão temos completamente Carlos Nobre. Mas não queria para já um disco em nome próprio. Aqui abri o coração e ao mesmo tempo quis proteger-me ou talvez apenas baralhar as cartas (risos). O que aqui está é muito íntimo mas é uma visão muito romantizada das coisas.
Só tu a compor, interpretar… o que está em risco?
Com este disco está tudo em risco, não há bandas não há nada, sou eu. Se corre mal é o ca*a*ho (risos)… se corre mal, faço melhor.
Como surge o Algodão?
O primeiro acontece quando ainda estava na estrada com os Da Weasel, mas aí não havia tempo e espaço para muita coisa, a banda era uma máquina gigante. Esse era ainda Algodão Não Engana e nasceu de uma necessidade que eu tinha de deitar cá para fora coisas muito minhas como o imaginário de drogas e outras coisas que vivi intensamente e precisava exorcizar. São uma parte minha mas não são uma parte tão grande como este Algodão de hoje, aquilo não sou eu, é uma parte minha. Daí esse projecto não ter continuado. Deitei cá para fora, virei a página e agora sinto-me completo entre o registo íntimo de Algodão e os Dias de Raiva.
Neste disco há Spoken Word e…?
Em termos de sonoridades traz muitas referências e sobretudo ambientes cinematográficos para servir a palavra essencialmente. Word, Poetry Slam, estão presentes, não fosse todo o disco uma ode à palavra, mas são referências não são moldes até porque eu próprio não me revejo neles. Todos temos referências e eu que tento sair de todos os circuitos. Mesmo assim sou permeável às coisas, mas quando faço à minha maneira acaba por sair outra merda qualquer. Prefiro fazer as coisas de uma forma mais ingénua, mais pura.
Falaciosa ou não, dedicaste-te ao tema da intimidade. Porquê?
A intimidade é o tema que percorre todo o disco, que pode ser uma entrega total, ou uma falaciosa. Mas sem dúvida o que está aqui é muito íntimo e verdadeiro, mas lá está, até que ponto? Eu estou aqui a dar muita coisa, mas há tanta outra que também não dou.
E daí o falaciosa noção?
Sim, mas não só. Há por exemplo uma música, a «Tragédia da Nossa Paixão», que fala de duas pessoas que não precisam de intimidade, alimentam-se apenas do sexo puro e duro, nesse caso a intimidade pode estragar tudo, pode ser falaciosa.
Onze temas que falam de mulheres. Quantas ficaram por musicar?
Algumas… ficou a minha mãe de fora por exemplo.
Mulheres para homenagear, para esquecer, para virar a página e procurar outras?
Aqui há desde relações no passado que correram muito mal, até uma relação no presente, com a mãe da minha filha, que é o mais próximo da estabilidade que eu já tive. É com ela e com a minha filha que tive os momentos mais felizes da minha vida.
Procura… há sempre uma procura de outra coisa, não de um amor de mulher, mas de uma coisa mais minha.
Revelar esta intimidade pode magoar alguma das onze?
Tirando a minha mulher, a minha filha e uma ex minha que já faleceu, as músicas não são descrições fidedignas do que aconteceu, são momentos, divagações, já são outra coisa. Se alguma das mulheres se revirem nalguma, tem sempre de levar em conta que isto não é uma fotografia dela ou ensaio sobre ela, é um pedaço da intimidade que se tornou numa coisa completamente diferente.
A tua música, tua palavra repetida, tua mulher, é a tua filha Alice?
Sim, Alice, Alice, Alice! A Alice fez-me recuperar uma pureza de sentimentos que julgava perdida, ou que nunca tinha sentido mesmo. Fez-me trabalhar com outra dedicação.
Ainda assim e no fim do disco sente-se uma eterna busca do amor…
Dizia eu há uns tempos ao JP Simões, num acaso, num café, que tinha, tal como ele, uma insatisfação, infelicidade e esta visão depressiva das coisas que a tantos criativos caracteriza. Pois tenho-a e é por isso mesmo que faço a música que faço e escrevo as letras que escrevo. Acho que a música, como qualquer expressão criativa, é a procura da felicidade naquele espaço, porque aí as coisas conseguem fazer algum sentido e haver uma beleza que raramente depois é destruída.
A música, então, resolve?
Não sei se resolve, se faz questionar mais. Sei que sou romântico no mau sentido de idealizar a um ponto que não é humano. Na música e na escrita consigo que as coisas não sejam bem assim.
O título intimidade também tem a ver com a intimidade que hoje, por exemplo, nas redes, já não há?
Não pensei nisso, mas talvez tenha. Por muito que eu ache que ando desligado do mundo, também sou influenciado por uma série de coisas que estão a acontecer. O facebook, por exemplo. Eu não tenho página, faz-me muita confusão a falta de privacidade e tenho sérios problemas com a intimidade. Se calhar é precisamente por isso que as minhas músicas andam à volta disso… Lá está, resolvo assim, pode parecer que não faz sentido, mas é a minha maneira e já deixei de a questionar. A música e a escrita conseguem que eu trate de assuntos com os quais não sei lidar.
Esta intimidade vai ter concertos onde?
A apresentação será no Teatro do bairro, em Lisboa, a 21 de Outubro e daí terá outros, mas sinceramente espero que não se tornem em algo de execução e repetição. Este disco presta-se a uma proximidade diferente, sítios pequenos, gosto disso, cansei-me de festivais.
Isso por causa dos Da Weasel. Não há saudade?
Também. Fiz muita queima das fitas! Os Da-weasel surgem tinha eu 19 anos.
Se tivessem surgido cinco anos depois seria diferente mas não me arrependo, como não vejo com saudade. Teve o seu tempo. Os Da Weasel deram-me muito. Fizemos coisas do caralho mesmo! Crescemos ali e parámos numa altura boa. A nossa vitória foi termos conseguido estar quinze anos sempre a acreditar no que estávamos a fazer, a fazer bem e acabámos bem.
Alguma expectativa especial em relação a este disco a que te dedicaste tanto e que é tão teu?
No fundo, o que todos queremos e procuramos é que gostem de nós. Estou expectante sobretudo em termos de música, há muito tempo que não compunha. Mas especialmente quero que gostem das palavras, dos textos.
Fotos: RADAR DOS SONS
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