The_National-6

Primavera Sound Porto 2024 | Dia 3 (08.06.2024)

As histórias de Sternberg, o triunfo dos Pulp e a entrega dos The National.

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Texto por Miguel Barba e fotografia por Graziela Costa.

Foi uma tarde que arrancou com muita, muita chuva e que chegou a assustar, mas depois houve tréguas e o sol até brilhou sobre o Parque da Cidade.

A receita de Joanna Sternberg é muito simples. Joanna, a sua guitarra acústica e muitas canções. Embora o dedilhar até possa deixar transparecer alegria, as canções são tristes, pesadas e também as há passivas agressivas, reflexo do aspecto frágil de Sternberg. Mas no meio deste negrume conseguimos vislumbrar a actual postura positiva de Sternberg perante a vida; há uma necessidade de comunicar e uma genuína simpatia, que procura construir um diálogo e uma ponte momentânea com o público que ali se juntou. Há perguntas constantes sobre a chuva e o nosso bem-estar, que se torna recíproco. O folk tem uma propriedade fantástica de permitir musicar praticamente qualquer coisa, e quando se junta a isso a variante americana do género os resultados são muitas vezes surpreendentes, como na última canção, escrita a imaginar que seria o Shane MacGowan a cantar.

O papel de Paulo Furtado e da sua banda foi no mínimo ingrato. Foram tapa-buracos em dose dupla, depois do impedimento do dia anterior. The Legendary Tigerman subiram finalmente ao palco, o Porto., em virtude do cancelamento da actuação de Ethel Caine, e fizeram-no em modo trio e do pouco que nos foi possível ver do concerto, ofereceram a competência e entrega que é hábito, e pelo meio até poderão ter convertido mais pessoas à sua causa.

A música de Paulo Furtado tem vindo a passar por algumas transformações, como Zeitgeist bem evidencia, com a uma componente a ganhar uma maior preponderância, sem que o rock e os blues desapareçam desta equação. É um reequilibro de forças.

Jarvis Cocker e os seus Pulp preparam-se para subir ao palco Vodafone perante um anfiteatro quase cheio (irá encher) e ávido para os receber. Há mensagens a passar nos ecrãs a introduzir o concerto com um humor bem britânico. Eis o 546° concerto de Pulp, par ao qual Jarvis entra com uma lua cheia gigante como ecrã de fundo a cantar «I Spy». Um verdadeiro showman, um dos poucos que conseguem sacar umas calças à boca de sino com estilo, em pleno 2024.

À segunda canção percebemos que vamos ter festa; «Disco 2000» deixa isso por demais evidente, com o anfiteatro natural do Parque da Cidade a irromper numa monumental celebração. Alegria em estado puro, sob a forma de sorrisos e lágrimas.

Segundo Cocker, “Pessoa Rouba um Carro para Conduzir a Alta Velocidade e Divertir-se” (algo do género), seria o título em português para uma canção que em inglês se resume a uma palavra: «Joyriders». O que aqui salta à vista é a capacidade de olhar para onde se está e incorporar isso no espectáculo que apresenta, e ainda por cima fazê-lo com sentido de humor.

«Something Changed» é uma canção de amor e é dedicada a Steve Albini e a Steve Mackey, baixista dos Pulp que faleceu a 2 de Março deste ano.

«Pink Glove» é uma infusão de brit pop com disco à moda dos Pulp, sobre um imenso fundo e luzes rosa. Perfeito. Já «Weeds» é antecedida por um elogio ao parque e as árvores, e a paleta cromática desloca-se para o centro do espectro. Há boa disposição, ironia e sarcasmo, sempre devidamente equilibrados como só os ingleses o sabe, fazer. É verdade que estamos a meio de Pulp e que está a ser fantástico, mas a vontade de assegurar o lugar apropriado para The National é maior. Escolhas, apenas e só.

Uma das câmaras que os The National costumam usar para filmar de várias perspectivas, começa por estar apontada para uma viatura estacionada provavelmente atrás do palco, onde se pode ver “B. V. Porto”. O palco mui, demasiado alto, parece que coloca a banda distante, como que inatingível. Cabe-nos a nós e a Berninger procurar encurtar distâncias.

São 23h30 em ponto quando a banda sobe ao Palco Porto. e Matt Berninger nos cumprimenta: “Happy Pride month everyone!”. «Sea of Love» oferece uma entrada pujante, seguida pela dicotomia de «Eucaliptus» e pelo desabafo de «Tropic Morning News». As canções de “Two First Pages of Frankenstein” continuam a revelar-se mais pujantes e com mais vida nas suas existências em palco.

«Don’t Swallow the Cap» leva-nos novamente a Trouble Will Find Me e «Bloodbuzz Ohio» é o momento de catarse esperado.«System Will Only Dreams In Total Darkness» surge com uma secção de metais fortíssima. «Mistaken for Strangers» é a primeira investida em Boxer a que se segue «Apartment Story». Aqui a bateria de Brian Devendorf é assombrosa. Segue-se «Conversation 16» e «Abel» a fechar uma sequência intensa e que acelera o ritmo cardíaco. «Alien» serve por isso para todos respirarem um pouco. Já «Smoke Detector» é, sem sombra de dúvidas, uma das melhores canções que os The National compuseram nos últimos tempos. Num registo que roça o spoken word, e a evidenciar a qualidade de todos os elementos da banda; as guitarras dos manos Dessner, o baixo e bateria dos irmãos Devendorf, e por último a poesia única de Matt Berninger.

«Day I Die» tem percussão a dobrar. «Rylan» e de seguida a majestosa «England» and de cairmos do pedestal em «Gracelesss». Segue-se o apelo a Biden para presidente e a firmação de que Trump é um criminoso. Será um mal menor, infelizmente, Há também o apelo ao cessar fogo na Faixa de Gaza. De seguida escutamos «Fake Empire». São tempos sombrios, estes que vivemos. «Space Invader» visita “Laugh Track” e do público chega ao palco um cartaz com ponteiros do relógio a marcar 4h15, tal como a letra; “Quarter after four in the morning / My heart’s software gore”.

«Lightyears» antecede «Mr. November», dedicada a Joe Biden e «Terrible Love» continua a marcar, ano após ano, concerto após concerto, tal como a «About Today» que continua a sacar um nó na garganta, no mínimo… Desta vez não houve «Vanderlyle Crybaby Geeks» sem amplificação mas houve um trecho – apenas instrumental – de «Squalor Victoria».

A actuação de Arca, reveste-se de uma importância adicional, pela missão de inclusão que o Primavera Sound vem assumindo, e refletindo-se nas iniciativas que promove, mas também nos nomes que integram o cartaz. Um furacão em palco, com o IDM, o reggaeton, o avant-pop ou o techno, a marcarem presença. Madre.

 

Leiam aqui a reportagem do primeiro e segundo dia de festival.



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